
Às 12 semanas de gestação fiz a primeira ecografia e descobri um descolamento ovular. Era pequeno e não tinha causado sangramento, mas já foi suficiente para a médica pedir uma pausa nas atividades físicas e esperar pelo menos duas semanas. As ansiosas vão saber o que eu fiz ao sair do consultório. O Dr. Google informou-me que eu poderia estar a sofrer um princípio de aborto e claro que entrei em pânico. E quando fui às redes sociais, todas as influencers famosas estavam a anunciar as suas gravidezes às 12 semanas na maior alegria. Enquanto eu, deitadinha no meu sofá, vi-me obrigada a contar à minha chefe e a alguns colegas de trabalho o porquê de ter de evitar alguns compromissos naquela semana.
Quando o descolamento foi detectado lembrei logo de um episódio pelo qual a Inês Aires Pereira passou e o qual partilhou no seu Instagram. O que eu estava passando não chega nem perto do que ela viveu, eu sei – a Inês conta num vídeo que foi às pressas às urgências a sangrar – mas foi o mais próximo que eu lembrei de alguém que teve de ficar em repouso. E apeguei-me na recuperação da Inês, em como dali a algumas semanas ela já tinha regressado ao trabalho e no final da gestação estava a pular e correr no Taskmaster.
É que nem toda gravidez é instagrámavel. E diante de um dos primeiros obstáculos que eu tive de ultrapassar na minha primeira gestação, deparei-me com a crueldade que é para tantas outras grávidas ter que ver o quanto algumas mulheres passam ou parecem passar por este período 100% ativas, bem dispostas, bonitas e a trabalhar full-time. Faz parecer que “estas coisas” só acontecem comigo, que eu não sou capaz, que eu sou diferente.
Nem toda grávida fica imediatamente feliz ao descobrir que está grávida. Nem toda grávida quer ou é capaz de guardar o segredo até às 12 semanas. Nem toda grávida consegue beber smoothies cremosos porque enjoa logo e coloca tudo para fora. Nem toda grávida aguenta um dia inteiro de trabalho sem uma sesta no meio do dia. Nem toda grávida tem fôlego para uma caminhada de 5km. Nem toda grávida fica com a pele e o cabelo luminosos.
Sem falar nas tantas grávidas que já tinham condições de saúde antes da gestação e não podem fazer todos os treinos da mamã sarada, ou comer todas as delícias que desejam na madrugada. Ou ainda que, por tratamentos prévios, já começam a gestação mais inchadas e simplesmente não encontram tamanhos dos “lookinhos” de grávida do momento. Ou que descobrem diabetes gestacional, hipotiroidismo, descolamento de placenta, colo curto, ou outra condição e por isso precisam de medicação especial, dieta restrita, exercícios específicos.
E sim, tem muitas mulheres que não podem comprar os 3 tipos de óleos de amêndoas especiais para evitar estrias, ou o kit de pijamas ajustável à barriga ou o complexo vitamínico perfeito anti enjoos. Que não têm condições de fazer uma babymoon para as Maldivas ou para a Madeira. Que não têm acesso aos vários profissionais multidisciplinares para fazer fisioterapia pélvica, contratar uma doula, ir a uma nutricionista, iniciar psicoterapia, fazer o parto com a obstetra de confiança. Aliás, muitas mulheres nem têm acesso a uma consulta de pré-natal a cada quatro semanas, considerando as dificuldades dos centros de saúde em atender todas as utentes.
Às vezes pego-me a criticar internamente o feed do Instagram. Então penso se estou a ser invejosa – o que pode ser uma teoria, afinal quem não queria ter uma gravidez perfeita sem intercorrências, parir naturalmente e seguir super bem disposta para casa já praticamente sem barriga? Atenção, não há nada de mal em viver uma gestação tranquila, um parto maravilhoso e um pós-parto mágico, que bom se fosse assim sempre! Mas também é preciso saber gerir algumas expectativas para não se frustrar. Na verdade ficar grávida no mundo da informação imediata é uma luta contra os nossos monstros internos. Ter que resistir à tentação do Dr. Google e às comparações com outras grávidas é um teste. Passar ilesa pode ser difícil, mas alguns relatos de grávidas a falar dos seus problemas reais pelo meio do caminho facilitam a jornada. E por isso termino com publicações de algumas figuras públicas que aquecem o coração da grávida e fazem pensar: “Ufa, afinal sou normal”.
Inês Aires Pereira a fazer um relato de um descolamento de placenta no início da gestação.
Maria Sampaio a falar sobre engravidar depois de perdas gestacionais e tratamentos de fertilidade.
Sandra Silva a falar do quão avassalador é o primeiro trimestre.
Anna Eremin a falar sobre como “odeia” estar grávida.
Blaya a falar sobre o cansaço no terceiro trimestre.
Inês Gutierrez a falar sobre a espera nas últimas semanas de gestação.
Bumba na Fofinha a falar das dificuldades em amamentar.
Andreia Rodrigues a falar sobre como a maternidade “também dói”.