A Decidida
Atrai o Instável, aqueles homens que nunca sabem muito bem o que querem e ora aparecem ora desaparecem como a lua. Assim que o conhece, ela dá-lhe dois palmadões nas costas e ele vai parar ao fim da sala com um ar embevecido a pensar: “Que mulherão!”. Ela faz imensos discursos inflamados contra a guerra e ele fica sentado muito caladinho a pensar que precisa mesmo de uma mulher assim para discutir com o canalizador, lhe preencher o IRS e lhe pagar as contas da água e da electricidade. O Instável acha sempre que uma voz grossa é sinónimo de segurança, e têm imensas discussões com os amigos que acham que a Luisinha, enfim, poderia talvez falar um bocadinho mais baixo. Mas o poder é afrodisíaco, e para este homem ainda mais. O pior é que depois vai para casa e passa o resto da vida com imensos complexos e indecisões, a pesar todos os prós e contras de se declarar e de se comprometer, coisa que o apavora. Se ela conseguir arrastá-lo ao altar, passa o resto da vida a mandar nele. Coisa que, diga-se de passagem, ele adora.
A Anjinha
Atrai o Abutre, que vem a correr com imensas fantasias de desviá-la para o mau caminho e lhe cortar as asinhas e de lhe entortar a aura. Mas sabe apanhar a mosca, não faz aquela cena do: “A menina desculpe, conhecemo-nos de algum lado?” Aparece sempre com boas roupas e ar perfumado, a fazer imensa conversa de elevador e a tentar visualizar o que há por baixo da roupa dela, enquanto a Anjinho se encolhe ao canto a pensar se há-de fugir pela garagem ou pela porta das traseiras. O cerco tem duas hipóteses: ou aparece outra santinha mais apetecível e o Abutre bate as asas para outras paragens e deixa o anjinho desasado, ou a coisa dá no caso mais tórrido do ano. Não dura, porque é um lugar-comum de todos os romances de cordel, e porque um Abutre não se fica no mesmo poiso muito tempo e em breve abrirá as asas para outro santuário.
A Tímida
Atrai o Protector. Ela cora e ele fica arrasado de paixão, porque neste mundo são raras as mulheres que coram. Ela desperta-lhe fantasmas do tempo em que os homens nos salvavam de dragões e se batiam em duelo pelo prazer da nossa companhia. Acha que o facto de ela corar quer dizer imensa coisa (que ela é virgem, vive em casa dos pais, tem jeito para o ponto-cruz, quer ter seis filhos todos com o nome do pai e adora-o em segredo) quando geralmente quer dizer apenas que se cora com facilidade, sem nenhuma razão demasiado específica. Oferece-se para lhe ir lá a casa fazer furos para os quadros de golfinhos, ou levar o carro dela à revisão, ou ajudá-la a carregar com os pesos no ginásio, ou transportar qualquer coisa muito pesada para qualquer sítio muito longe. Ao fim de uns tempos o Protector tende a dar em ditador, a ler-lhe as mensagens de telemóvel e a fazer-lhe cenas se encontra um número desconhecido.
A Conservadora
Atrai o Conservador, aliás porque não conhece mais ninguém. Encontraram-se no grupo de jovens do patriarcado quando o Papa foi a Espanha, ou então num acampamento de escuteiros quando ela foi picada por uma melga em vez de Cupido e ele lhe ofereceu um anti-mosquitos, tarde demais para a melga mas não para o amor. São os únicos jovens que vão a excursões e em vez de passarem as noites a trocarem de quarto no hotel passam os serões à volta da fogueira a cantar o Kumbaiá ou o ‘Menina estás à janela’. Na escola são muito poupadinhos e afiam os dois lados do lápis. Cada um deles sabe muito bem o que espera do outro, e por isso raramente se desentendem. Querem formar uma família e antes de se casarem já decidiram que nome dar aos filhos e em que universidade é que os vão pôr. A Conservadora não procura num homem o frissom da paixão, procura um bom pai que não apanhe bebedeiras ao sábado à noite, que se possa apresentar à avó e que não fume no quarto. O Conservador não procura uma mulher-fatal, procura uma pessoa com quem partilhar um Compromisso. Compromisso, para um Conservador, escreve-se sempre com maiúscula.
A Extrovertida
Atrai o Intelectual, que fica encandeado com tanta energia, tanta luz, tanta gargalhada, tanta faísca. Ele vai para casa e passa a noite ao computador a escrever-lhe imensos poemas a rimar ‘dor’ com ‘amor’ e ‘paixão’ com (tenta lembrar-se de outra rima que não seja ‘tesão’ e é por isso que fica ali a noite toda) e depois persegue-a com e-mails e flores e CDs de rock alternativo e romances do José Saramago com dedicatórias de três páginas. Persegue-a por todas as esquinas. Leva-a ao Guincho numa quarta-feira à noite (a maioria dos mortais iria a um Domingo à tarde, mas o pesadelo do Intelectual é fazer qualquer coisa como o povo) e tem uma longa conversa com ela dentro do carro, depois da qual lhe oferece um anel de noivado sem reparar que está a fazer exactamente o que o povo faz. Se ela aceita, casam-se nos Jerónimos e ficam um casal como toda a gente. Se ela não aceita, ele ameaça deitar-se ali mesmo das rochas para o mar e escavacar o carro lá em baixo na Boca do Inferno, mas em vez disso vai para casa beber dois copos e no dia seguinte vê outra musa ao virar da esquina, ou então volta para a antiga namorada como se nada se tivesse passado, que é mais prático e cai sempre bem.
A Mulher Fatal
Normalmente atrai toda a gente, mas estranhamente acaba com o Certinho, a ouvir imensas bocas sobre ‘mas que raio é que ela viu nele’. O que ele viu nela é óbvio. Ainda por cima ele anda com um ar muito contente e tem escrito na testa: “Saquei a mais gira. Eh eh eh.” Esperou por esta vingança desde os tempos de escola em que era sempre o último da turma porque tudo lhe parecia uma interminável seca. Depois arranjou um emprego melhor do que o colega de carteira que tirou um doutoramento em paleontologia, e quando conheceu a loira do metro e oitenta e dois, em vez de se deixar intimidar e de ficar em casa a babar-se para cima da fotografia dela, convidou-a para ir ao cinema. Dá-lhe pelo ombro (dá-lhe pela cintura quando ela usa saltos altos) mas orgulha-se disso. A loira consegue percebê-lo porque ele é caseiro e ela, ao contrário do que se pensa, não quer um homem que a leve a fazer parapente, quer ficar com ele ao fim de semana a ver o Eurosport sentada no sofá com as pantufas calçadas e o jornal do domingo passado, a pintar as unhas e a discutir quem é que vai levar o cão lá fora.
A Maternal
Atrai dois tipos de homem: ou o Instável que conhecemos acima, ou o Tímido, que sempre procurou mais uma mãezinha que lhe lavasse as cuecas e lhe fizesse o jantar e ficasse com ele a gritar alto as respostas aos concursos na televisão do que uma mulher fatal que lhe exigisse feitos de malabarismo. Pode demorar a dar o primeiro passo, prefere espiá-la de longe e mandar-lhe bilhetinhos anónimos e encontrar-se com ela ‘por acaso’ imensas vezes no mesmo dia até que a pobre quase tem uma apoplexia de tanta emoção e tem de ser ela a convidá-lo para um cafezinho na pastelaria da esquina, onde se enchem os dois de mil-folhas e duchesses para disfarçar os nervos. Ao fim de três dias, já ele está a viver em casa dela e a comer grandes pratadas de esparguete à Bolonhesa e com a taxa de colesterol a rebentar da escala. Se não der com nenhuma mulher fatal no caminho para a igreja, é bem capaz de casar com ela, mas só para aí 45 anos depois do primeiro dia de vida em comum e de ela lhe apontar uma caçadeira e ameaçar que vai fugir com o homem do gás, porque é um moço que demora a tomar uma decisão.
A Certinha
Atrai o Homem de Carreira. Seja qual for a carreira: atirador de facas ou repórter de guerra, cirurgião ou padeiro, realizador de filmes eróticos ou professor catedrático. O homem de carreira não quer uma mulher igualmente de carreira porque depois ela terá imensos congressos de biologia molecular na Eslovénia e ele não está para fazer o papel de marido a andar a fazer compras na Zara da Eslovénia, e também não está para ficar em casa a dar ordens à mulher a dias e a ir de cestinho ao supermercado porque acha que todas as velhas do bairro vão comentar: ‘Coitado, a mulher não lhe liga’, e também não está para chegar a casa e encontrar o frigorífico magnificamente recheado com meio-limão e as crianças ranhosas, esfomeadas e com a fralda suja, coitadinhas. Portanto foge a sete pés daquelas que sacam as melhores notas da turma ou daquelas que no primeiro encontro recebem um telefonema de um aluno a perguntar se ela lhe vai orientar o doutoramento. Procura antes a vizinha do lado, de preferência uma que ele tenha conhecido antes dos 3 anos na bicha para o escorrega no parque do bairro, com um bibe cor de rosa com patinhos e tranças loiras. Acha que ela o seguirá até ao fim do mundo se for preciso, e o facto é que segue mesmo, com os três filhos às costas e a casa inteira dentro da mala. Tem o céu à espera.
A Simpática
Atrai os que ninguém quer ou que têm encantos muito muito escondidos: o tarado da Cinemateca, os que têm 3 dentes à frente e nenhum atrás, o militante de uma causa incompreendida, o oleoso que passa a vida a dar graxa aos professores. Faz-se um sorriso para eles no elevador, e nunca mais despegam, porque não estão habituados a receber sorrisos. Geralmente tiraram as lições erradas da sua triste sina e fecharam-se na concha, que por acaso costuma ser desarrumada e oleosa como eles. Geralmente adquiriram vícios de solitários, vivem com 19 gatos que fazem o que querem, montaram um viveiro de pombos no quarto dos fundos, depois deixaram morrer os pombos mas nunca mais se lembraram de limpar o quarto, só mudam os lençóis de dois em dois anos, têm um irmão gerente de banco que não lhes liga nenhuma, e acham que são Shakespeare/Bruce Springsteen/Manoel de Oliveira/Picasso incompreendidos pelo resto da Humanidade. Tristemente, o mais provável é que não sejam.
A Inteligente
Como a inteligência não se percebe automaticamente (o que se percebe automaticamente é que ela usa óculos e não faz nuances) geralmente não atrai assim ninguém a não ser os camionistas quando vai a descer a rua a pensar no Lobo Antunes e se esqueceu de vestir o soutien. A inteligente pode disfarçar-se de loira burra e fazer nuances e usar meias de rede, mas se começar a falar de Kierkegaard no primeiro encontro, está tudo acabado, porque nenhum homem quer passar o resto da sua vida a ouvir falar de coisas que não entende. As inteligentes do 3.º milénio já não são como as intelectuais dos anos 60 em que 10 minutos a pintar as unhas eram 10 minutos roubados à alfabetização dos pobres, mas ou se é inteligente arraçada de mulher fatal e aí sempre se tem alguma hipótese com os falsos-tímidos que têm um fetiche com as dominadoras que falam russo, ou então pode-se começar a treinar para tia. No entanto, se se for uma Inteligente com sorte, pode-se dar de caras com outro Inteligente da mesma espécie. Pormenor: o Inteligente, como se viu atrás, tende a fugir com a Certinha, que usa as cuecas a dizer Terça-feira à Terça-feira mesmo, ao contrário da Inteligente, que as usa ao Domingo ou quando calha, que nunca é na Terça-feira.