Filha única de pais divorciados, ela própria se divorciou quando tinha três filhos pequenos. Decidiu depois que a experiência podia ser útil a outras mulheres. Assistente social há mais de vinte anos, formadora na área da comunicação, especializada em mediação familiar e parentalidade, Marta Moncacha trabalha atualmente como divorce coach, apoiando mulheres em processo de divórcio. Falámos com ela para perceber como é que um processo de sofimento e muitas vezes abandono pode ser transformado numa experiência positiva.
Quando é que percebeu que podia partir do seu próprio divórcio para ajudar outras pessoas?
Casei-me aos 26 anos e divorciei-me aos 37. Quando decidi escrever este livro, numa primeira fase só tinha a minha história para contar, mas pensei que era muito pouco. Foi quando comecei a estudar mais que decidi partir da minha história para ajudar outras pessoas. Portanto, esta história não é só minha.
Mas em Portugal ainda vemos um divórcio como um fracasso, não é?
Sim, é como se aqueles anos não tivessem valido a pena, como se fosse tudo para o lixo. Mas isso não tem de ser assim. Até porque só conseguimos olhar para uma experiência de forma positiva se percebermos o que é que aquilo nos trouxe de aprendizagem. Pode trazer muito. E esse também foi o exercício que tive de fazer. No meu caso, fui eu que tomei a decisão de me separar, por isso mais senti que era culpada, que ia traumatizar os miúdos para a vida toda, etc. Eu não era a vítima, a abandonada, estava do lado da ‘vilã’ (risos). E depois, percebi que tinha o direito de ser feliz.
Como é que o divórcio dos seus pais a marcou?
Aprendi muito com eles. Quando se separaram eu já tinha 20 anos, mas foi muito marcante. E acho que o casamento deles, que não foi de todo feliz, acabou por ser mais difícil do que o divórcio. É verdade que o divórcio dos pais pode ser um alívio para os filhos, que assistem de camarote a todas as discussões. Portanto, entre um mau casamento e um bom divórcio, eu prefiro claramente um bom divórcio.
Mas um divórcio não pode significar o fim de uma família?
Uma família não significa necessariamente mãe e pai juntos. Essa família continua, mas passa de relação romântica a relação parental. Tem de ser reinventada, e nós estamos todos muito pouco preparados para reinventar, para voltar a comunicar de maneira diferente, para dar uma série de passos que não são fáceis. Depois, as mães nem sempre estão dispostas a abrir mão do protagonismo na vida dos filhos. Passamos a vida a queixar-nos, mas quando chega a hora de delegar, é duro. Temos muito medo de perder o amor dos filhos. Eu só atendo mulheres, e grande parte delas dizem: ‘E agora que eu tenho tantas horas sem os meus filhos, quem é que eu sou?’ Porque as mulheres ainda se focam muito no casamento, nos filhos e na casa, e depois quando há mais tempo para pensarem nelas, para cuidarem delas, para perceberem o que querem fazer da vida, percebem que se perderam pelo caminho. Claro que ao princípio é sempre um luto, e há um caminho de pedra a fazer. Mas depois, com o tempo livre que ganham, invistam em vocês!
Foi assim consigo?
Sim. Posso dizer que ganhei uma vida nova com o divórcio. E ganhei uma nova relação com os meus filhos: muitas vezes, as crianças desenvolvem depois do divórcio uma relação com o pai ou mãe que não tinham quando eles estavam casados. Isso é um aspeto muito positivo que pode resultar de um divórcio e a que raramente damos valor.
Mas é preciso coragem para sair de um casamento, não é?
Sim, ainda é preciso coragem para sair de um casamento. Porque é duro, interna e externamente. E ainda há muito preconceito. Quando me separei, ouvi muita coisa. Coisas terríveis. Culpabilizaram-me muito. As mulheres são sempre muito culpabilizadas, por tudo. E, portanto, há pessoas que não tomam esta decisão para não passarem por isso. Também há famílias muito vulneráveis economicamente, cada vez mais vemos isso, e isso é trágico. Mas nas famílias com mais bem-estar económico, muitas vezes também não se dá este passo para não se perder estatuto. Hoje em dia, estar casada ainda dá ‘posição’ a uma mulher, principalmente em certos meios. Isso não devia ser assim, mas ainda acontece.
Depois de se divorciar, tornou-se ‘coach’, reencontrou o amor, teve mais um filho. Portanto, divorciar-se foi mesmo uma boa opção?
Claro que foi. Ter tomado esta decisão contribuiu muito para a minha autoestima. Ter encontrado o Rui veio ajudar, mas tive de fazer todo um caminho prévio por mim própria, uma busca de aceitação, de trbalho interior, de conhecimento, de paz. Se acho que é também possível ser-se feliz sozinha? Claro que acho. E às vezes sozinha consegues estar profundamente acompanhada, se estiveres a viver a tua verdade.
Para ler: ‘Divórcio Positivo’, Marta Moncacha, Manuscrito, €14,90