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Dizem os especialistas criminais e psiquiatras que uma em cada 100 pessoas tem traços de psicopatia. Falta de empatia, incapacidade de sentir remorsos e um apetite compulsivo pelo crime são só algumas das características que estamos cansadas de ver nas nossas séries criminais preferidas. Há quem defenda que nascem assim, não tiveram necessariamente pais que os espancaram ou que abusaram deles. E não há cura – já houve quem tentasse e falhasse catastroficamente.

Mas há mais, como descobriu o jornalista de investigação inglês Jon Ronson. No livro ‘O Teste do Psicopata’ (Lua de Papel) entra no mundo dos criminosos mais sangrentos e maquiavélicos e dos curiosos homens que os estudaram. Explica o que faz de alguém um psicopata, fala da indústria da loucura e de quem tem a lucrar com ela e ainda nos assusta quando diz que há psicopatas a comandar em empresas e até em cargos políticos. Falámos com o simpático Jon aquando da sua passagem por Lisboa.

Um dos aspetos mais perturbadores do seu livro é perceber que 4% dos cargos de gestão das grandes empresas, segundo o psiquiatra Bob Hare, são ocupados por psicopatas…

Devo acrescentar que o estudo feito pelo Bob Hare (se acreditarmos nos números dele, e eu não tenho razão alguma para não acreditar) não diz que 4% dos CEO têm traços de psicopatia. O que ele diz é que esses 4% têm resultados tão elevados na lista de avaliação de psicopatia que poderiam ser fechados em instituições. Este teste tem 20 perguntas, às quais se atribui a pontuação de zero, 1 ou 2. A pontuação máxima é 40. Uma pessoa normal atinge a pontuação de 4 ou 5. Uma pontuação realmente alta será à volta de 22 ou 23, mas estes 4% de CEO atingem uma média de 30 ou 31. É horrivelmente alto.

Se eu for um head hunter à procura de um alto cargo para uma empresa, quais as características potencialmente psicopáticas que devo valorizar mais?

Ser manipulador – vão querer essa característica para os negócios –, a falta de empatia e de remorso. Olhe para o Al Dunlap [conhecido como ‘Motosserra’, CEO de empresas como a Scott Paper, de onde despediu 35% dos trabalhadores]. Deve ser muito bom ter alguém na nossa empresa que gosta de despedir pessoas e que não se sente minimamente culpado por isso. É possível que essas companhias, das quais o Dunlap se tornou CEO, precisassem mesmo de despedir gente mas o gozo que ele sentia ao fazê-lo, a forma implacável e sem remorso algum como o fazia, era espantoso. Percebemos logo por que os conselhos de direção o queriam nesse lugar: ele gostava mesmo daquilo.

Assusta-o pensar que, hoje em dia, isso é valorizado?

Sem dúvida! O capitalismo não tem de ser assim… mas é. Penso que pode existir compaixão e empatia no capitalismo. Num universo paralelo teríamos uma estrutura capitalista de natureza mais doce. O Al Dunlap nem seria uma das pessoas com a pontuação mais alta. Basta pensar no Newt Gingrich, que está na corrida para se tornar o candidato republicano às próximas presidenciais nos EUA. A mulher teve um cancro e ele deixou-a por causa disso, depois arranjou outra companheira e também a deixou assim que soube que ela tinha esclerose múltipla. É incrível pensar que há alguém assim tão horrível e manipulador.

No início do livro, confessa-se uma pessoa ansiosa, o extremo oposto de um psicopata. Como estava o seu nível de ansiedade quando falou, cara a cara, com psicopatas como o Tony?

Muito alto. Mas até gostei dele. Só não sei se isso foi natural ou porque é um psicopata, pois são muito hábeis a manipular-nos para gostarmos deles. Demorei muito tempo a perceber se o Tony era mesmo uma psicopata ou um caso de justiça mal aplicada. E a resposta a que cheguei é que ele é ambos. Era fácil simpatizar com ele porque, apesar do seu crime ser grave [espancou uma pessoa, fingiu-se louco para escapar a uma pena de prisão de 5 anos e acabou fechado numa mistura de hospital psiquiátrico com prisão de alta segurança], não era tão mau como os crimes das outras pessoas com quem ele tinha de conviver: assassinos em série, violadores, pedófilos… Nunca me fez mal, ou a qualquer outra pessoa, depois de ser libertado. Perdeu 12 anos lá dentro, é uma história muito triste. Quanto à minha ansiedade, acho que isto é verdade para qualquer pessoa que sofra do mesmo: só ficamos ansiosos por coisas que não fazem sentido. Quando ia a caminho da casa do Al Dunlap, estava tão ansioso que até tomei um Valium, coisa que nunca faço. Acho que a minha ansiedade não era tanto a de ir falar com ele, mas mais pelo facto de estar a tentar ligar à minha mulher e ela não atender. Quando me deparo com o perigo real, sou até bastante corajoso. Penso sempre que por cinco minutos de angústia real tenho dois anos de pessoas que leem e gostam dos meus livros.

Diz que quando descobriu a lista que avalia a escala de psicopatia se sentiu poderoso. Começou a usá-la no dia-a-dia? E isso não o confundiu?

Completamente! Comecei a usá-la com toda a gente que tinha sido má para mim, críticos que tinham falado mal dos meus livros, pessoas que me faziam comentários maldosos no Twitter e estava mesmo convencido de que eram. (risos) Havia uma mulher que estava a tratar-me um bocado mal no Twitter e isso acabou por passar para o ‘mundo real’. Há dois anos, contei o caso a um dos assistentes do Bob Hare [psiquiatra que criou o teste de avaliação de psicopatia] e ele disse: “Sem dúvida, ela é psicopata.” Continuo em contacto com ela e posso dizer que não é. É amorosa, mas na altura a vida não estava a correr-lhe bem. Ora aí tem como eu e um profissional nos precipitámos a avaliá-la. Quase todos os dias recebo cartas de leitores que me dizem que agora têm a certeza de que o seu chefe, irmã ou alguém que conhecem é psicopata. A maior parte das vezes penso que estão apenas a fazer o que eu fiz, colar um rótulo. Mas em alguns casos, aquilo que leio faz-me pensar: ‘Meu Deus, a tua irmã é mesmo psicopata!’

Então, o que há a fazer se chegarmos à conclusão que há um psicopata nas nossas vidas?

O melhor que posso dizer é que é bom sermos cautelosos. Se alguém estiver a manipular-nos com jogos mentais, se soubermos que o fazem porque são psicopatas, provavelmente é mais fácil não nos deixarmos afetar, ofender ou magoar. Se um leão estiver a perseguir um gnu, este não vai parar para tentar perceber o que fez para chatear o leão! Um psicopata a sério comporta-se assim porque esse é o tipo de pessoa que ele é, não há que tentar perceber porque o faz. Para mim, isso é um conselho mais realista do que dizer a alguém para deixar o marido se perceber que ele é psicopata – é uma coisa muito séria para dizer. Definitivamente, tive um ou dois psicopatas a sério na minha vida, no campo profissional. Uma vez fiz um filme sobre um tipo que hoje tenho a certeza que é psicopata. Ele adorava manipular-me, tomou conta da minha vida durante seis meses. Gostava de saber nessa altura o que sei hoje.

O que acha que atrai mais as mulheres neste livro? A preocupação de que algum psicopata entre na nossa vida?

Sim, acho que é algo de que as mulheres têm mais medo do que os homens. E com razão. Imagine se começa a sair com um psicopata. Terrível! Consigo perceber porque é bom ser cauteloso. Mas, ao mesmo tempo, não quero que as pessoas leiam este livro e desatem à procura de psicopatas nas suas vidas, como aconteceu comigo. É bom conseguirmos ver o outro lado desta história e perceber que temos que ser justos e humanos com toda a gente. Os assuntos dos meus outros livros – ‘Homens que matam cabras com o olhar’ falava sobre táticas de guerra, e o ‘Them’ sobre teorias da conspiração – interessam mais aos homens. O ‘Them’ tem dois capítulos passados em Portugal, muito engraçados. Fui perseguido pelos serviços secretos portugueses, de Sintra ao Estoril, há uns 15 anos. Mas neste livro consegui escrever sobre ansiedade masculina e ainda bem. Era como se eu precisasse de uma espécie de ‘licença’ para o fazer e ela estava relacionada com o facto de os psicopatas não sentirem ansiedade. Então era apropriado falar da minha própria ansiedade, porque era relevante para esta história.

Os cientologistas, que lhe apresentaram o caso do Tony, acusam psicólogos e psiquiatras de inventarem doenças e sobremedicarem as pessoas.

No seu livro também fala desta ‘indústria da loucura’. Acha que eles têm razão?

Acho que eles têm razão em algumas coisas, mas levam os argumentos demasiado longe, como acontece com os fundamentalistas. Não se contentam em dizer o que está mal, acham que tudo está mal. Não sinto o mesmo que eles sobre o mundo psiquiátrico, mas sem dúvida que a psiquiatria e a indústria farmacêutica têm cometido abusos. A indústria farmacêutica adora doenças novas, o seu interesse é fazer dinheiro. E por alguma razão estranha acho que alguns psiquiatras sentem-se egocentricamente compelidos a afirmar, por exemplo, que aquela criança sofre de distúrbio bipolar. Nos EUA, há crianças de quatro anos a serem diagnosticadas com isso, algo que não acontece na Europa. Não há qualquer evidência de que uma criança tão nova possa ter um distúrbio desses.

Porque acha que o Mal e os psicopatas exercem um fascínio tão grande sobre nós?

Fiquei muito surpreendido quando percebi que, realmente, as pessoas estavam mesmo interessadas no tema. Talvez isso se deva ao facto dos psicopatas serem a resposta para alguns dos maiores mistérios do mundo: porquê a guerra, a injustiça, porque é que o capitalismo tem um lado tão negro, e isso é fascinante. Se formos na rua e olharmos para as pessoas à nossa volta, gostamos de assumir que somos todos iguais. Mas… e se não formos? E se um de nós for uma espécie totalmente diferente de humano? É surpreendente pensar que há pessoas incapazes de sentir empatia. A maioria dos psicopatas são homens; também há mulheres psicopatas, mas são muito menos. Estaremos perante uma versão extrema de ‘Os Homens são de Marte, as Mulheres de Vénus’?

Eis a lista de 20 pontos que classifica um psicopata, elaborada por Robert Hare, um dos maiores especialistas no tema.

   1.  Loquacidade (são bons conversadores)/ charme superficial

  2.  Sentido grandioso de superioridade

  3.  Necessidade constante de estimulação/ propensão para o tédio

  4.  Mentira patológica

  5. Astúcia/manipulação

  6.  Ausência de remorso ou sentimento de culpa

  7. Afeto superficial

  8.  Insensibilidade/ausência de empatia

  9. Estilo de vida parasita

10.  Fraco controlo sobre o seu comportamento

11.  Comportamento sexual promíscuo

12.  Problemas comportamentais precoces

13.   Ausência de objetivos realistas a longo prazo

14. Impulsividade

15. Irresponsabilidade

16.  Incapacidade de assumir a responsabilidade pelos próprios atos

17.  Muitos relacionamentos maritais de curto prazo

18. Delinquência juvenil

19.  Infringir a liberdade condicional

20. Versatilidade criminal

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