*artigo publicado originalmente na revista ACTIVA de outubro de 2017
Das tardes quentes em Aquiraz, município brasileiro no litoral do Ceará, Valentina Sampaio lembra-se da infância passada na praia e no jardim da sua casa, onde ficava com os seus pensamentos, sonhos e ideias. Sentada debaixo das árvores, fazia das flores de jasmim que caíam as suas bonecas. Nesses momentos, estava em harmonia com a sua feminilidade, apesar de não ser isso que o espelho ou a sociedade refletiam. É que a manequim, que hoje está nas bocas do mundo, nasceu menino mas nunca se identificou com o nome (que até hoje não revela) ou com o género que constava na sua certidão de nascimento. “Sempre me senti uma menina e, para mim, a minha essência sempre falou mais alto”, conta-nos.
Da Praia às Passerelles
Logo no início da carreira, já longe da sua vila acolhedora onde “todos se conheciam e se respeitavam”, a jovem de 20 anos admite que lidou com preconceito. “Isso só me deu mais força e impulsionou as coisas maravilhosas que me têm acontecido.”
Entre essas coisas está, por exemplo, a participação na 42ª edição da São Paulo Fashion Week, em outubro de 2016. O assunto do momento era Valentina, que foi contratada para oito desfiles, o dobro do normal para uma novata. “Adoro a energia da passerelle. Dá sempre aquele friozinho na barriga mas é uma experiência muito boa.” Para a modelo, a sua fama instantânea é sinal da evolução dos tempos. “Acho que estamos a caminhar para um mundo melhor e mais livre, mesmo que a passos bem pequenos”, confessa. “Quero ser reconhecida pelo meu trabalho, e poder trabalhar pela profissional que sou, e não por um título ou rótulo”, diz sobre a associação de adjetivos como ‘transexual’ ao seu nome nos meios de comunicação social.
Em março passado, a manequim teve uma das maiores prendas da carreira até à data: a capa histórica da ‘Vogue Paris’. A história teve projeção no mundo inteiro. “Foi uma felicidade enorme, muito gratificante e especial.”
Altos Voos
Conquista a conquista, Valentina Sampaio dá um novo fôlego à revolução iniciada por Lea T., a primeira transexual brasileira a tornar-se um nome de peso na indústria. “Este é um momento importante em que falamos sobre diversidade e geramos visibilidade para vários assuntos. É importante levar informação às pessoas. Ninguém nasce preconceituoso. O preconceito não é algo natural do ser humano, então precisa ser combatido.”