Quando terminava de ver o documentário ‘I Am: Celine Dion’, em streaming no Prime Video, alguém me perguntava porque se sujeitaria a cantora canadiana a tamanha exposição. Ainda entorpecida pelo embate emocional, a primeira palavra que me veio à cabeça foi “CORAJOSA”. Celine mostra-se, sem filtros (nem mesmo maquilhagem!), uma mulher fragilizada, envelhecida, limitada e revoltada com a sua doença – Síndrome de Pessoa Rígida, diagnosticado em 2022, que provoca uma rigidez muscular incapacitante, que afeta também o seu instrumento, a voz. As imagens da ‘nova vida’ de Celine têm ainda mais impacto porque intercalam com cenas do seu glamouroso percurso artístico. Eu sabia que ela era uma estrela, apesar de nunca ter acompanhado de muito perto a sua carreira (talvez só na altura do Titanic, em que dá voz ao tema principal), mas não tinha ideia da sua verdadeira dimensão.
A decisão foi da cantora de 57 anos, a de mostrar a realidade nua e crua. Aliás, quando as filmagens começaram, ainda não havia um diagnóstico, segundo contou a realizadora Irene Taylor ao New York Times. “Conversei longamente com ela e não sabia que estava doente. Estávamos em plena pandemia e não pensei duas vezes sobre o facto de ela estar em casa. (…) Chegámos a um ponto onde concordámos em fazer o filme. Várias semanas depois dessa decisão mútua, o seu agente pediu-me uma call. Pensei que devia ser algo sério porque tínhamos falado naquele dia e ele tinha-me dito que Celine estava doente e que eles não sabiam o que era. Filmámos durante vários meses antes de termos um diagnóstico definitivo.”
Irene Taylor conta que Celine nunca impôs limites às gravações e que coube a ela gerir essa carta branca com bom senso.
Irene Taylor continua:”Senti que deveria abordar essa acessibilidade com ternura, dignidade e classe. Há muita coisa que a câmara não vê. Se houvesse um pouco de tensão ou desconforto, eu recuava. Em parte, foi isso que construiu a confiança ao longo do tempo: ela deu-me tudo, mas eu não aceitei.”
A cena mais marcante do documentário – e a que está a dar mais que falar – é a de Celine Dion a ter uma crise – a cantora agoniza enquanto os seus músculos contraem impiedosamente. Durante alguns minutos sustemos a respiração e sofremos com ela, as câmaras continuam a filmar. Há uma altura em que o fisioterapeuta e o segurança que a acodem perguntam mesmo se ela quer desligar as câmaras e ela recusa.
A realizadora esperava que quando Celine visse o documentário finalizado, pedisse para retirar a cena mas isso não aconteceu. Disse que ela ajudaria as pessoas a compreender o que está a acontecer ao seu corpo.
Voltando ao início, o que faz uma pessoa expor-se dessa forma? A resposta está no próprio documentário. Durante muito tempo, Celine era obrigada a mentir quando cancelava os seus concertos. E a verdade é algo que diz dever aos seus milhares de fãs, que tanto lhe deram ao logo de uma carreira – e uma vida – conduzida pela sua voz. A voz que agora lhe falha, ao contrário da coragem.
Veja aqui o trailer de ‘I Am: Celine Dion’:
Fotos. divulgação