Bio, eco, sustentável, clean, vegan, natural, cruelty free, ético… isto é o que procuramos cada vez mais em tudo o que consumimos, incluindo os produtos cosméticos: porque sabemos que as nossas escolhas, sobretudo quando se trata de coisas que fazemos, usamos e aplicamos diariamente, afetam a nossa saúde e a saúde do planeta. A maioria das marcas tenta responder a todos estes níveis, mas se isso é relativamente fácil para as mais recentes e as mais pequenas, para as marcas de maior dimensão é impossível mudar tudo ao mesmo tempo: os ingredientes, as fórmulas, os processos de fabrico, as embalagens… Mas toda a indústria está a fazer um esforço no sentido da sustentabilidade, e isso é bom. Cada passo conta. Mas para saber o que escolher é importante informar-se e comparar o que existe.
Sabe o que contêm os seus produtos?
Como na alimentação, também na cosmética é importante ler, não só as ‘letras gordas’ da frente da embalagem, mas também a lista de ingredientes que vem atrás ou em baixo, em letras miudinhas: é ela que lhe vai dizer se um produto é, não só natural, mas ecológico. Até porque naturalidade e ecologia nem sempre andam de mãos dadas: o óleo de palma, a não ser que seja obtido de forma sustentável, é natural, mas é um verdadeiro desastre ecológico; o petróleo é uma substância mineral e natural (jorra das profundezas da terra) mas os seus derivados não são a coisa mais desejável para se ter num cosmético; e um extrato botânico, se a planta for colhida explorando quem a recolhe e esgotando o meio ambiente onde cresce, é pior do que um ingrediente sintético obtido por química verde de baixo impacto ambiental. Atualmente há mais de 20 mil ingredientes usados em cosmética, até para os profissionais é praticamente impossível conhecê-los todos de cor, e os nomes estranhos são o suficiente para fazer desistir quem tenta percebê-los. Mas não é impossível. Os ingredientes de um cosmético têm de estar obrigatoriamente listados na embalagem ou, caso esta seja demasiado pequena, no site da marca: é a chamada lista INCI (International Nomenclature for Cosmetic Ingredients – Nomenclatura Internacional para Ingredientes Cosméticos) com regras que são seguidas pelas marcas de todo o mundo. Embora os fabricantes não sejam obrigados a escrever a fórmula e as percentagens exatas de cada ingrediente que usam (o segredo é, afinal, a alma do negócio), têm de listar os ingredientes de acordo com determinadas regras que nos dão boas pistas para saber se um produto é natural ou não, e até que ponto:
- Os ingredientes estão indicados por ordem decrescente, por isso os primeiros 5 ingredientes da lista constituem 70% da fórmula. O primeiro ingrediente é geralmente Aqua, ou seja, água, que pode constituir mais de metade do produto: isso em si não é uma coisa má, mas se o primeiro ingrediente for uma água de flores ou de frutos, ou água termal, é melhor porque significa que também essa parte da fórmula é ativa em termos cosméticos e não apenas neutra. Os últimos ingredientes da lista são os que estão presentes em menor quantidade, podendo constituir apenas 1% da fórmula (portanto, se o produto diz que tem extrato de camélia, por exemplo, mas a camélia está no fim da lista, isso significa que de camélia terá pouco ou quase nada). A coisa complica-se um pouco em relação aos ingredientes com uma concentração inferior a 1% porque a lei permite que estejam em qualquer lugar da lista, mas geralmente são postos no fim.
- Os ingredientes naturais estão escritos em latim, com o nome em latim da planta: por exemplo, aloé vera aparece como Aloe Barbadensis; alfazema aparece como Lavandula seguida do nome em inglês da parte da planta utilizada, por exemplo Lavandula Angustifolia Flower Extract se for um extrato da flor.
- Os ingredientes de origem petroquímica têm nomes em inglês: por exemplo o sulfato aparece como Sodium Laureth Sulfate. Quanto menos forem na lista, mais natural é a fórmula.
Há várias apps que ajudam a decifrar os ingredientes cosméticos, explicam o que fazem e se são seguros ou potencialmente nocivos, para a saúde ou para o planeta. A Clean Beauty e a INCI Beauty permitem scanar os produtos para analisar a sua composição ou pesquisar por ingredientes. São úteis para ter uma ideia do que faz cada ingrediente (e perceber que nem sempre os ingredientes químicos com nomes estranhos são nocivos para nós ou para o planeta), mas não as tome como uma bíblia, porque não deixam de ser geridas por algoritmos que não têm em conta as doses e interações entre os vários ingredientes. É importante notar que, em relação aos ingredientes classificados como alergizantes, isso não significa que vão efetivamente provocar uma alergia. Muitos óleos essenciais, que são um dos ingredientes frequentemente usados na cosmética natural e bio, são, de facto, potencialmente alergizantes, mas isso não significa que todas as pessoas que os usam vão ter reações alérgicas: os amendoins são um dos alimentos mais alergizantes, mas há milhares de pessoas que os comem sem qualquer problema. No entanto, se tem tendência a quadros alérgicos e quer usar um produto com óleos essenciais, talvez seja melhor testá-lo antes.
Ingredientes controversos
A União Europeia está muito em cima dos ingredientes cosméticos, muitas vezes pressionada pelos próprios consumidores e, nos últimos anos, já baniu ou restringiu mais de 1300 químicos considerados nocivos, para as pessoas e/ou para o ambiente (os Estados Unidos proibiram apenas 11). Ainda assim, continuam a existir alguns ingredientes controversos, que são considerados seguros nas doses em que são usados na cosmética convencional, mas que as marcas de cosmética natural, biológica e ecológica evitam:
Parabenos
Os cosméticos precisam de conservantes porque a simples manipulação na sua utilização pode contaminá-los com bactérias. Os parabenos são os mais comuns e usados há quase um século, mas recentemente surgiram indícios de que poderiam ser desreguladores endócrinos e 5 deles deixaram de ser permitidos na Europa (Isopropylparaben, Isobutylparaben, Phenylparaben, Benzylparaben, Pentylparaben). Na lista INCI são os ingredientes com nomes terminados em ‘paraben’ ou ‘zoate’ (por exemplo Butylparaben ou Parahydroxybenzoate).
Silicones
São petroquímicos usados em cosmética para disfarçar a aparência dos poros, dar um aspeto mate acetinado à superfície da pele ou dar um toque macio ao cabelo, mas podem asfixiar a pele e o couro cabeludo e acumular-se no cabelo, não são biodegradáveis e têm um impacto negativo no ambiente. Na lista de ingredientes dos produtos são os terminados em ‘one’ ou ‘ane’ (por exemplo Dimethicone ou Cyclopentasiloxane).
PEG e PPG
Derivados da petroquímica, são fabricados a partir de óxido de etileno e não são permitidos nos cosméticos bio. Reconhecem-se na lista INCI pelos nomes começados por ‘PEG’, ‘PPG’ ou ‘Propylene’ (por exemplo PEG-5, Polyethylene glycol, Propylene Carbonate).
Ceras e óleos minerais
Também derivados da petroquímica, estes compostos sintéticos têm um efeito oclusivo, o que pode ser problemático para algumas peles porque podem entupir os poros, e podem causar irritações. Estão identificados na lista de ingredientes como Soparaffin, Paraffinum e Mineral Oils.
SLS ou sulfatos
Podem causar alergias ou irritações, embora continuem a ser muito utilizados em champôs e geles de duche como agente lavante e de espuma. São os ingredientes que aparecem como Lauryl sulfato de sódio ou ALS.
FTALATOS
Estão no banco dos réus como desreguladores endócrinos, acusados de perturbações hormonais nas mulheres e de provocar esterilidade nos homens. Estão presentes em vernizes, perfumes e produtos de styling. Na Europa só está autorizado o Diethyl phtalate.
Sais e cloratos de alumínio
Usados em desodorizantes, são suspeitos de aumentar a incidência de cancro da mama e de Alzheimer. Se os quiser evitar, procure desodorizantes sem Aluminium chlorohydrate, Aluminium Sesquichlorohydrate ou Aluminium zirconium pentachlorohydrate.
Formaldeídos
Este polímero sintético usado na produção de resinas está presente em vernizes de unhas, pode causar irritações e alergias, e a Agência Internacional para Pesquisa do Cancro (IARC) classifica-o como cancerígeno. É proibido na Europa, mas há países onde ainda é usado e surge na lista de ingredientes como Formaldehyde.
Vegan, cruelty free e testes em animais
Esta é uma área onde ainda há muita confusão.
Um cosmético vegan não contém qualquer ingrediente de origem animal, quer seja obtido com o animal vivo ou obrigue à sua morte. Falamos de cera de abelha e outros produtos da colmeia; do corante carmim que é obtido através de cochonilhas (um pequeno inseto) esmagadas, que surge na lista INCI como CI 75470, E120, vermelho natural ou Ácido Carminico e é aceite na cosmética bio por ser de origem natural; do colagénio animal proveniente de estruturas cartilaginosas da vaca, do porco ou da pele do peixe, e aparece nos ingredientes como ‘elastin’, ‘gelatin’, ‘connective tissue extract’, ‘scillii pellis extract’ ou ‘sus skin extract’; da alantoína, derivada da baba de caracol; da queratina animal, extraída de pele, pelos e chifres; da lanolina, uma gordura natural que se encontra na base dos pelos dos carneiros; do leite, quer seja de burra ou de vaca; dos ovos (a lecitina pode ser extraída da soja ou dos ovos); e da seda, cuja proteína é obtida através da fervura dos casulos e que surge na lista de ingredientes como ‘silk’, ‘bombyx’, ‘fibroin’, ´serica’ ou ‘sericin’.
Em relação aos testes em animais vivos das fórmulas terminadas, a União Europeia proibiu-os em 2013. Mas as fórmulas anteriores a essa data podem ter sido testadas em animais e o mesmo acontece com os produtos fabricados fora da Europa. Aliás, na China os produtos têm obrigatoriamente de ser testados em animais para poderem ser vendidos no país, por isso há marcas que optam por não vender lá os seus produtos. E como a lei europeia se refere apenas ao cosmético final e não aos ingredientes, estes podem eventualmente ter sido testados em animais, sobretudo se já existem há vários anos ou se são também usados noutras indústrias. Surgem então as certificações internacionais: Cruelty Free, Cruelty Free and Vegan, Cruelty Free International, Not Tested on Animals… mas estas certificações não garantem que o produto seja bio, sustentável, vegan ou ecológico. Para isso há outras certificações específicas.
As marcas estão cada vez mais conscientes em termos de ecologia e sustentabilidade, mas cabe-lhe a si escolher de acordo com o que valoriza mais, sem se deixar confundir com os ‘rótulos’ e designações dos produtos, já que ser uma coisa não significa ser outra também. Na hora de optar por esta ou aquela marca, este ou aquele produto, informação é poder.