Qualquer mulher negra que tenha crescido em Portugal em meados dos anos 1990/início dos anos 2000 sabe que comprar produtos para cabelos afro nesses tempos era uma experiência curiosa, para dizer o mínimo.
No meu caso, confesso que me fazia confusão ter de ir a uma loja na cave de um centro comercial duvidoso para encontrar aquilo de que precisava. Não é que eu não adorasse o dono e os funcionários – e agora tenho consciência de que estava a apoiar um pequeno negócio – mas, na minha cabeça, aqueles produtos também deviam estar disponíveis em todos os espaços dedicados à cosmética capilar. Afinal de contas, cabelo é cabelo, independentemente da raça ou etnia.
Saltando para o presente, o cenário é outro. O movimento do cabelo natural tornou-nos mais atentas e exigentes em relação aos produtos que compramos (adeus álcool, sulfatos, petrolatos, silicones e químicos) e, por conseguinte, a indústria foi obrigada a adaptar-se. Resultado: passámos a ver produtos para cabelos étnicos nas prateleiras de supermercados – isto ainda me parece surreal – e em grandes lojas físicas e online. Se a variedade nos supermercados, por exemplo, é a desejada? Ainda não, mas o facto de não sermos completamente ignoradas já é um começo.
Esta mudança na abordagem também inspirou muitos empresários não só a trazerem produtos e marcas que, noutros tempos, estavam fora do nosso alcance, como também a atualizar o conceito de lojas especializadas. Continue a ler para conhecer três bons exemplos:
A Diamantino Viegas é pioneira na distribuição de produtos de cosmética e de higiene em estabelecimentos especializados. Lembro-me perfeitamente que, durante muito tempo, esta foi a única alternativa às tais lojas duvidosas de que falei no início do texto.
Nascida de uma empresa familiar, em 1961, a marca tem produtos importados dos Estados Unidos da América, Brasil, França e Inglaterra, entre outros países. Uma filosofia de internacionalização que lhe permitiu chegar aos quatro cantos do mundo e representar diferentes multinacionais (Cantu Shea Butter, Origem e L’Erbolario, entre ouras) no País. Só na área da Grande Lisboa existem oito lojas físicas da Diamantino Viegas – eu costumava passar a vida na do Saldanha – e, mais recentemente, nasceu uma loja online que conta com a mesma diversidade.
Em 2009, quando decidi fazer a minha transição capilar, não havia muita informação em sites portugueses. Por isso, acabei por registar-me em dois fóruns americanos – meu Deus, lembram-se de quando os fóruns eram populares? – que ensinavam mulheres negras a cuidar dos próprios cabelos, quer fossem naturais ou desfrizados.
Passado algum tempo, comecei a ver mais portuguesas por lá, incluindo a Sandra Raquel, que usou todos os conhecimentos que adquiriu para criar um blogue pioneiro em Portugal sobre cabelos afro. E não só. Também conseguiu transformar esta paixão num negócio chamado Assim do Meu Jeito que, para além da loja online, tem um espaço físico na estação de metro do Jardim Zoológico.
A página não só vende marcas como, por exemplo, Mielle Organics, Shea Moisture e Taliah Waajid, como também agrega informações super úteis sobre todos os tipos de cabelo.
O Meu Cabelo Natural, que também tem um espaço físico no Centro Comercial do Lumiar, é fruto do trabalho de Mónica Santos, cofundadora do grupo ‘Crespas e Cacheadas de Portugal’. Enquanto membro fundador do grupo no Facebook, que ultrapassou rapidamente os 10 mil membros, a empresária teve a ideia de criar um espaço que facilitasse o acesso a cosméticos naturais muito populares nos Estados Unidos, por exemplo, cujos portes e taxas alfandegárias chegavam a ficar bem mais caros do que as encomendas em si.
As I Am, Alikay Naturals e Camille Rose Naturals são apenas algumas das marcas incríveis que podem encontrar nesta loja online.
Esta é uma espécie de menção honrosa. Embora a Look Fantastic não seja especializada no tipo de cosméticos em questão, perceber que a plataforma já tem marcas como a Bouclème e a Flora & Curl foi uma agradável surpresa. Aliás, foi lá que comprei o meu champô e amaciador (da Shea Moisture) na última reposição de stock. Claramente há um esforço por parte da empresa no sentido de ser mais inclusiva e ele é muito bem-vindo.