Aos 53 anos, Jennifer Aniston partilhou a sua luta contra a infertilidade e como foi duro o julgamento público. Perceba o que é, as causas, e o impacto que provoca na vida de uma pessoa.
Como se define a infertilidade? E quais os dados da infertilidade em Portugal?
A infertilidade é, nos dias de hoje, definida como uma doença que se caracteriza pela falha em se conseguir uma gravidez clínica, após um ano de relações sexuais regulares e desprotegidas, ou por incapacidade de uma pessoa se reproduzir como indivíduo ou com seu/sua parceiro/a. O conceito foi assim alargado e reflete o abandono da exclusividade de pensar a infertilidade como um problema de um casal, passando também a considerar-se a dificuldade ou a impossibilidade reprodutiva individual.
A prevalência da infertilidade em Portugal ronda os 10%, o que vai de encontro às estimativas internacionais, que apontam uma prevalência mundial de 5 a 15% nas mulheres em idade reprodutiva.
Quais as causas?
A dificuldade do casal em engravidar decorre de vários fatores quer da mulher, quer do homem: cerca de 40 por cento cada. As alterações anatómicas, quadros que influenciam a ovulação nas mulheres e a qualidade do esperma nos homens, estão entre os principais fatores que se associam a perturbação da fertilidade.
No caso da mulher está estabelecido que cerca de 1/3 são causas ovulatórias, o outro terço são alterações anatómicas/ pélvicas que afetam a função tubária e a relação das trompas com os ovários, e nesse grupo entra a doença endometriose. As restantes são de causa chamada inexplicada ou idiopática e alterações que incluem as malformações uterinas. A idade da mulher tem também um grande impacto na capacidade em engravidar e ter um bebé e, nos dias de hoje, o atrasar dos projetos reprodutivos por questões sociais ou laborais, reflete-se neste campo.
No homem, ocorre em 90 % por alterações do processo no qual ocorre a formação dos espermatozoides e em cerca de 10% causas obstrutivas e ejaculatórias. Se estiver em causa um varicocele ou uma causa anatómica, pode haver necessidade e ser recomendado tratamento urológico cirúrgico.
Quando é que este tema se torna um problema e quando se deve procurar um médico?
Em função da idade da mulher a procura de ajuda médica deve ser realizada nos 6 a 12 meses de tentativas de engravidar sem sucesso. A idade é um fator determinante para a mulher ser mãe. A partir dos 37 anos a capacidade reprodutiva cai de forma marcada e o sucesso dos tratamentos também é menor.
Cerca de 60% dos casais ou mulheres procuram ajuda médica e na maioria das situações o tratamento recomendado tem de passar por uma técnica de procriação medicamente assistida (PMA) como a fertilização in vitro (FIV) ou a microinjecção intracitoplasmática (ICSI). O acesso a tratamentos de PMA tem vindo a ser alargado no nosso país e podem fazer estes tratamentos casais heterossexuais, casais de mulheres e mulheres sozinhas.
Qual o cenário e qual a importância da prevenção e preservação da fertilidade?
Na promoção da saúde reprodutiva e da fertilidade futura, é cada vez mais abordada e demonstrada a importância da adoção desde cedo na vida, dos chamados estilos de vida saudáveis. Uma alimentação ao “modo da dieta mediterrânica”, praticar exercício físico, evitar hábitos tóxicos como o tabaco, prevenir as doenças de transmissão sexual, fazer rastreio ginecológico e vacinação, são hábitos de prevenção promotoras de uma vida reprodutiva saudável.
É também imperativa e atual a necessidade de se informar os doentes em idade reprodutiva e com diagnóstico de cancro, da possibilidade de avaliação e preservação do potencial reprodutivo. Há campanhas de informação em curso para alertar quer os profissionais, quer os doentes e é o caminho para a mensagem passar e evitar que muitos homens e mulheres com doenças oncológicas graves não deixem de se informados para o facto do seu potencial reprodutivo poder vir a ser afetado de forma irreversível em consequência de tratamentos do cancro. Nestes casos há a possibilidade de se criopreservar as células reprodutivas, os chamados ovócitos na mulher e os espermatozoide no homem. Na mulher até aos 40 anos e no homem até aos 50 anos e de não ser comprometido o seu desejo e o seu acesso à parentalidade. Também no contexto de transsexualidade e contexto social é possível a preservação dos gâmetas.
Como descreve o impacto emocional da doença.
Estamos a falar de um projeto de vida, um sonho, constantemente adiado. Condiciona um sofrimento existencial individual e de casal, com auto culpabilização, sentimento de incapacidade e de frustração, o lidar com a incerteza do resultado e com interferência negativa na sexualidade do casal. O reconhecimento da infertilidade como uma doença é mais do que justificado, pois é geradora de grande sofrimento emocional, depressão, baixa autoestima e, frequentemente, de estigma social.
E a pandemia teve impacto nos tratamentos de fertilidade?
A pandemia teve efeitos transitórios pela diminuição dos tratamentos realizados nos centros de medicina da reprodução em 2020 e pela maior dificuldade de acesso a consultas, mas entretanto esse aspeto foi compensado. A infeção Covid 19 em si, não parece ter repercussões importantes na função reprodutiva, nem nos resultados dos tratamentos de infertilidade.
Dra. Ana Aguiar
Diretora da Unidade de Medicina Reprodução Hospital de Santa Maria – CHULN
Especialista em Medicina da Reprodução IERA Lisboa Quironsalud
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