Um terço das crianças portuguesas entre os seis e os nove anos tem excesso de peso, de acordo com o Childhood Obesity Surveillance Initiative, um estudo da União Europeia. Mas isto quer dizer que andamos a dar-lhes demasiada comida?
“Não, não andamos”, defende Teresa Branco, fisiologista do peso. “A vida que levamos é que nos faz optar pelas piores escolhas, não pela quantidade mas pela qualidade.” Por exemplo: o regresso da lancheira não se está a revelar saudável. “As crianças comem sandes todos os dias”, nota Teresa Branco. “Manda-se uma sandes de panado ou com maionese quando se poderia mandar uma sandes de ovo cozido com tomate e alface, por exemplo. Uma sandes de vez em quando não é grave, mas por recurso sistemático não é aconselhável.”
Ok, então qual é a melhor opção? “Comida de prato, a comida tradicional portuguesa que as nossas avós comiam. O problema é que hoje não temos a vida das nossas avós. Não é só arranjar a lancheira, é o ir às compras, o cozinhar, o ter as coisas sempre disponíveis, tudo isto é complicado…”
A solução ideal não dá trabalho nenhum e nem sempre significa gastar mais, se pensarmos no ensino público: comer na cantina. “Mas os pais querem poupar e as crianças também preferem lancheira porque assim se despacham num instante, enquanto no refeitório perdem mais tempo na fila. Mas almoçar na cantina é, geralmente, uma opção mais saudável. Porque já ninguém tem tempo de ir para a cozinha fazer uma caldeirada…”
Os mais pequenos também têm fome emocional
Ou seja: é a nossa forma de viver que está a fazer aumentar o excesso de peso? “Claro”, explica Teresa Branco. “E também as questões emocionais. A fome emocional é cada vez mais frequente também nas crianças.”
Nós também comíamos porcarias… “Comíamos. Mas eles são muito mais pressionados do que nós éramos. O ensino é cada vez mais exigente, e as crianças hoje mal têm tempo para ser crianças. Passam horas na escola, a fazer os TPCs, a trabalhar ao fim de semana, e quando é que brincam? Não brincam. E isto acaba por se refletir na comida. Mesmo quando os pais têm o trabalho de preparar lancheiras decentes, os miúdos vingam-se abusando da comida de conforto. Portanto, temos hoje um drama muito grande: crianças que encontram na comida consolo para a infância que não os deixam ter.”
Os pais muitas vezes não se apercebem da gravidade que é não ter tempo para brincar… “Muitos acham que as crianças têm de estar ‘bem preparadas’ quando estamos a destruir emocionalmente uma geração”, nota Teresa Branco. Isto está a ser muito duro para as crianças, e também para as mães: “Se as mães querem uma carreira, não lhes facilitam a vida. Se querem ficar em casa com os filhos, são criticadas como ‘dondocas’. Portanto, nós, mulheres ficamos sempre a perder.” Tudo isto, no fim do círculo, está ligado à comida… E a verdade é que não estamos a dar mais comida às crianças. O que lhe estamos a dar a mais é ansiedade.