Nas margens de um dos canais do rio Amstel, em Amesterdão, fica este loft de 250m², recuperado pelo designer George Anthony Gottl e pelo arquiteto Oliver Palmer Michell, do ateliê de arquitetura de interiores UXUS (que significa “you times us”). Os clientes – um casal de designers que adquiriu a casa para expor a sua extensa e curiosa coleção de arte – tinham como objetivo preservar ao máximo a traça original deste antigo armazém de açúcar, construído em 1763, pelo que foram conservadas as colunas e traves de madeira, bem como o pavimento em castanheiro francês, este já colocado nos anos 70. Outro dos requisitos era criar divisões sem perder a noção de open space. O ateliê UXUS deu a volta à questão recorrendo a cortinados de linho italiano. Ao dividir as áreas com estes ‘panos de cena’, consegue-se proteger os espaços privados dos sociais, abrir ou fechar a cozinha à sala ou desvendar roupeiros ocultos, sem divisórias fixas. Por outro lado, introduzem teatralidade ao loft, sobretudo à noite: iluminando os cortinados a partir de diferentes ângulos, obtém-se jogos de luz e sombra, transparência e opacidade.
A decoração tem uma grande componente cenográfica, influenciada pela personalidade dos clientes e pelo efeito impactante das muitas peças, adquiridas em viagens, arrematadas em leilões, descobertas em galerias… Todas elas têm uma história para contar, ou muitas histórias, agora reunidas num espaço de exposição adequado.
Nesta casa, é protagonista a coleção de arte. Quem esperaria encontrar, suspenso numa cadeira da sala, um casaco feito com teclas de piano ou uma escultura de um burro, em couro, envolta num véu junto à mesa de jantar? E que dizer de um modelo médico dentário? Ou de um pássaro empalado dentro de uma gaiola de vidro? Sarcasmo, ironia e um sentido de humor muito particular são predicados comuns ao casal e à sua extravagante e inusitada coleção de arte. A maioria do mobiliário, como a grande cama de dossel ou o candeeiro e a mesa de sala de jantar, são peças de antiquário, de várias épocas, que demonstram o gosto eclético dos proprietários da casa. As outras peças, escolhidas pelo ateliê UXUS, têm o poder da camuflagem (intervenção num móvel de feira com armações de gamo nas molduras das portas), ou da reinvenção (bancos de design de autor em madeira recuperada). Perante as obras de arte, são ‘personagens secundárias’, porém relevantes para o guião e resultado final desta decoração. Se por um lado estão em consonância com as peças mais importantes, por outro impedem-nas de entrar em ‘over acting’, ou seja, que a sua teatralidade absorva o quotidiano de quem aqui vive, todos os dias, num claro exemplo do manifesto de Brand Poetry defendido pelo ateliê UXUS: “Design é função, arte é significado. A poesia expressa a essência.”