
9 em cada 10 já votaram
Temos a ideia de que os mais novos não se interessam por política, e se calhar é verdade: mas que votam, votam. Mais do que muitos adultos. Num estudo sobre participação política juvenil, desenvolvido por investigadores da Universidade Católica do Porto para o Conselho Nacional de Juventude, no ano passado, 89,6% dos jovens entre 18 e 30 anos declararam já ter votado “em algum momento da sua vida”. Destes, apenas 17% são filiados em algum partido.
Porque é que não participam mais na vida política? A maioria afirma que é por falta de conhecimento, e gostariam que houvesse mais iniciativas para aproximar os mais novos da política.
Tudo isto é confirmado pelos ‘novatos’ que entrevistámos. Têm todos 18 anos e vão votar pela primeira vez no dia 10. Gostavam de estar mais informados mas mesmo assim têm noção da importância das eleições num sistema democrático.
“Acho que os jovens veem a política como algo importante, sim, pelo menos aqueles que eu conheço. O que acontece é que muitas vezes o desconhecimento é grande, não pelo desinteresse mas pela falta de transmissão de conhecimento. São poucos os incentivos para que os jovens se interessem pela política, e claro que isto leva a cada vez mais desinteresse.” É o que defende Jeremias Carreira. A melhorar a nota de matemática, que ficou para trás, antes de se atirar ao curso de economia ou gestão, defende a ideia de que o voto é importante. “É uma forma de expressar as minhas preferências e contribuir para mudar o futuro do país”.
A política não é um assunto comum em família, mas com amigos sim, ao contrário do que se também se costuma afirmar. Os mais novos discutem política uns com os outros, sim. Jeremias em particular não apenas discute como se preocupa em ler o programa de cada partido e assistir aos debates. Digam lá quantos adultos mais velhos é que fazem isso? “Entre os meus amigos a política é um assunto de interesse comum, e bastante discutido. Eu gosto disso, acho que a troca de ideias faz-nos perceber melhor cada assunto. Mas para além das discussões com amigos e colegas, acho que cada eleitor tem o dever de se informar sobre o programa de cada partido. Ainda acho que só o programa é pouco, mas pelo menos é um princípio para se ter uma breve opinião. Esta opinião pode depois se fundamentada, por exemplo, assistindo aos debates.”
Então e se mandasse no país, o que é que mudava primeiro? “Um dos principais problemas é que o mercado de trabalho é bastante mal pago, o que leva a bastante emigração jovem. Este seria o meu ponto de partida.” E já agora, com quem vai votar? “Vou com a família, e se acordar tarde vou sozinho”…
É importante não criar uma bolha
Há quem não apenas vá votar como esteja muitíssimo feliz por ser finalmente autorizada a fazê-lo. Isabel Fonseca, estudante de engenharia química do Instituto Superior Técnico, esperou muitos anos (pronto, 18) por este momento e defende a sua importância. “Para além de ser um dever civil é um direito pessoal que devemos exercer. Dar voz à nossa opinião e proteger os nossos direitos só se torna possível com o dever e o direito de voto.”
No seu caso, família e amigos partilham este entusiasmo pela política. “É frequente especialmente em épocas de eleições conversar sobre política com os meus amigos e familiares. É muito comum no dia a seguir a cada debate acabarmos por mencionar coisas que foram ditas, e se concordamos ou não.”
Mas tem noção de que este criar de opiniões não é inocente. E também tem consciência de como é importante ouvir outras vozes que não aquelas que lhe estão próximas. “É interessante saber os pontos de vista daqueles que me rodeiam, mas também é importante não criar uma ‘bolha’ em que absolutamente toda a gente que fala comigo tem exatamente os mesmos ideais. Gosto de ouvir todos os lados e formar uma opinião própria sobre cada tema.”
Segundo o estudo da Católica que começámos por citar, as redes sociais já se tornaram o meio de comunicação mais utilizado pelos jovens para ter contacto com a política (embora isso não aumente a sua participação). Isabel confirma. “Vejo normalmente o que passa na televisão sobre as eleições mas não vi todos os debates. Pelo que vi, percebi que não esclarecem muito sobre as medidas de cada partido. O mais comum é ler o que dizem nas redes sociais, maioritariamente no X (ex-Twitter) em que neste momento praticamente todas as publicações que me aparecem são sobre política.”
Mais uma vez, mostra uma consciência pouco comum das armadilhas que a espreitam: “É sempre importante ter em conta que nem tudo o que aparece no feed é verdadeiro e o algoritmo acaba por me apresentar publicações relacionadas com os partidos que são mais concordantes com os meus ideais. Tenho noção disso.”
Tal como o Jeremias, até acha que as as pessoas da sua idade veem as eleições como uma coisa importante. “Penso que uma grande parte da nossa geração tem noção do poder do voto. Mas também acho que as redes sociais têm uma grande responsabilidade devido ao enorme impacto, em fazer com que os jovens se interessem porque nestas alturas obviamente que a política é dos tópicos mais comentados.”
As mãos cheias de nada
Nem todos se sentem tão acompanhados como Isabel, e mesmo assim não deixam de se tentar informar. Tomás Veludo, estudante da Universidade Autónoma, não tem muito quem partilhe o seu gosto pela investigação política. Nem família nem amigos são muito adeptos de discussões sobre o futuro do país. Mesmo assim, Tomás tem-se esforçado por se informar: com alguma dificuldade, afirma. “A maioria dos meus amigos da minha idade vai votar mas nem sabem sequer o que os partidos propõem nem o que está em causa. Não estão minimamente informados. Claro que nessas alturas eu defendo as minhas ideias e tento passar a minha opinião, sim. Já que não sabem, é uma forma de começarem a interessar-se.”
O seu gosto pela informação começou pelos debates. “Comecei a ver, e para os perceber melhor comecei a informar-me mais. Mas confesso que continuo a achar difícil memorizar o que cada um defende. E até tentei ler os programas dos partidos sim, pelo menos os que saíram antes dos debates. Li pelo menos os da AD e do PS. Mas acho pouco claros.”
Acha o discurso dos políticos demasiado obscuro. “Acho que em geral não falam para as pessoas, e os debates transformam-se num apontar de dedo e numa luta de egos que na verdade não esclarece ninguém. Se calhar deviam pensar noutro formato para passar as suas ideias, se calhar é por isto que as pessoas também não se interessam. Quem quer na verdade saber o que cada um defende, não fica esclarecido, só fica mais confuso ainda.” Tal como a Isabel, onde encontrou mais informação foi no Twitter.
Se pudesse mudar alguma coisa no país, começava pela habitação e pela educação, “porque são as que afetam mais as pessoas mais novas. “
Então e depois de tudo isto, está otimista ou pessimista? “Estou pessimista. Parece que todos têm as mãos cheias de nada. Sinto um grande vazio em quem nos governa. Nunca nos é explicado com clareza como é que vão chegar a esta ou aquela medida, portanto nós nunca sabemos se aquelas propostas são realistas ou se na verdade não têm hipótese de serem postas em prática. Sinto sempre que há muita coisa que nos estão a esconder.”