
Bem-vindos ao sítio mais confiante do mundo: tudo aqui é em grande. Em muito grande. Em mesmo muitíssimo enorme (ou alto, ou caro, ou lindo, ou original). Os Dubaienses gabam-se de ter coisas como ‘o edifício mais alto do mundo’, ‘o bar mais caro do mundo’, ‘o maior parque aquático do mundo’. Aqui não há números 2, dizem-me repetidamente. Só números. Faz parte do orgulho nacional. Afinal, esta foi a gente que fez nascer uma cidade onde só havia deserto. Aliás, que a arrancou a ferros (e vidro) da areia. Pelo menos, essa é a sensação com que se fica. E que cidade!
Pronto, toda a gente já viu fotografias, ah e tal os arranha-céus. Mas nada nos prepara para o que nos espera, nem os amigos que já lá foram e que dizem todos ‘só vais acreditar quando lá chegares’. É verdade. Não só é tudo enorme como cada arranha-céus é diferente, e são todos belíssimos. Quando chegamos, parece que desembarcámos não de um avião mas de uma máquina do tempo calibrada para o futuro. Não há ninguém com um pingo de sensibilidade artística que não admire esta paisagem, mesmo que se saiba que na prática não foram os Dubaienses que a construíram mas uma imensa mão de obra imigrante, sobretudo indianos e paquistaneses.
Claro que a cidade nem sempre foi assim, aliás tudo isto não parece apenas recente: é mesmo recente, e muito ainda está em construção. Aprendemos isso e muito mais na nossa primeira paragem, precisamente na ‘parte velha’ da cidade (ou seja, antes da descoberta de petróleo em 1966), a área dos souks e o ‘Gold District’ onde as Mil e Uma Noites se desdobram em tesouros de ouro estendido à nossa frente. O Museu Al Shindgah é uma boa primeira paragem, porque nos conta muito do que é o Dubai: de agora e de antes.
A maior das 7 cidades dos Emirados Árabes Unidos (um conjunto de monarquias absolutas e hereditárias), o Dubai era dantes uma pequena povoação à beira de um riacho (The Creek), e a sua maior riqueza eram as pérolas, caçadas e vendidas com muito esforço (ainda hoje muitas pessoas põem às filhas nomes que significam ‘pérola’, como Hessa ou Dana). Depois o Japão entrou no mercado das perolas sintéticas e rebentou a Primeira Guerra, e a cidade passou por um mau bocado.
Mais tarde, o Dubai tornou-se um porto importante e a descoberta do petróleo veio mudar o seu destino. Mas o responsável pela ‘visão’ da cidade moderna foi o Sheik Rashid (pai do atual Sheik Mohammed), que transformou o Dubai na cidade do futuro que é hoje, e que foi um dos fundadores dos Emirados Árabes, em 1971, quando se tornaram independentes de Inglaterra. Hoje, o petróleo, o turismo e o comércio são os três pilares da sua riqueza.

Das Tinder Moms às chávenas de café
Nem todas as mulheres que andam na rua vestem a Abaya (túnica usada pelas mulheres) assim como nem todos os homens vestem a Kandora (túnica usada por homens) porque 80% da população é estrangeira. Mas a maioria das mulheres dubaienses usam-na, por tradição. Assim nos explica Shaíma, que nos recebe no CMCUU – Sheikh Mohammed bin Rashid Al Maktoum Centre for Cultural Understanding – nos serve um almoço de príncipes árabes e pede para lhe fazerem todas as perguntas que quisermos.
Ficamos a saber que as mulheres têm liberdade para estudar o que quiserem, como Shaíma, que se formou em engenharia. Aliás a educação é de graça para homens e mulheres (dubaienses) até ao mestrado. As mulheres trabalham (até existe uma astronauta) em todo o lado. Mas muitas ficam em casa (a casa também é dada pelo Sheik, ou então terra onde a construir). Há casamentos arranjados mas não é a coisa dramática que pensamos. “Funciona como uma espécie de Tinder Mom”, ri Shaíma. Ela própria se casou assim. O homem encarrega a mãe de lhe procurar uma noiva compatível, e os dois encontram-se: mas podem recusar-se mutuamente. Claro que também há casamentos por amor, as pessoas conhecem-se na escola e nas redes, mas mesmo assim o noivo tem sempre de ir a casa da família da noiva pedir permissão. Além disso, tem de pagar um dote, o casamento e os anéis. Não se namora publicamente: o amor é puro e vem de Deus, mas ter sexo fora do casamento não é permitido. Divórcio existe cada vez mais, mas continua complicado.
Quanto à abaya, podem ou não usá-la. Mesmo quando a usam, por baixo podem vestir a roupa que quiserem, inclusive calças de ganga. Até se dizia que havia quem andasse por aí de pijama…
Já agora que nos serviram café, uma curiosidade: o café é servido no Dubai a meio da chávena. Explicação: como as chávenas não têm pega, isso faz com que ninguém queime os dedos. Tradicionalmente, quem servia o café era surdo (para não ouvir os segredos das reuniões) daí que ainda hoje os dubaienses comuniquem por gestos a quem lhes está a servir o café (já não uma pessoa surda mas, hoje em dia, a pessoa mais nova da família). Serve-se geralmente o próprio género: um homem serve os homens, uma mulher as mulheres. Uma mulher só pode servir um homem na família mais próxima.

O país do luxo
Ok, vamos lá então a um dos maiores ex-libris: o Burj (Torre) Khalifa, o maior edifício do mundo, com os seus espampanantes 828 metros e 163 andares. Entramos por outro ex-libris, o enorme Dubai Mall, o maior centro comercial do mundo (se calhar achavam que era o Colombo, não) com as suas 1200 lojas.
Lá nos enfiamos no elevador (que é – como podem imaginar – o elevador mais rápido do mundo) e nos leva ao andar 124 (não se pode subir mais). Daqui se tem uma vista de cortar a respiração, mas curiosamente, mesmo para uma pessoa com vertigens como eu, não é uma experiência angustiante.
Outra experiência inesquecível é o pôr-do-sol no The View, um observatório de vidro com uma vista estonteante para a cidade, a baía e Palm Jumeirah.
Ok, Palm Jumeirah o que é: como podemos ver daqui de cima, é uma ilha em forma de palmeira, com casas de luxo, hotéis, praias, clubes, spas, e piscinas infinitas, contruídos em cada um dos seus ramos e acabando em grande no luxuosíssimo Hotel Atlantis The Palm. Como também adivinharíamos sem que nos dissessem, a ilha é absolutamente artificial. Com 11 quilómetros de comprimento, ali vivem milionários de 70 países diferentes. Estranhamente, levou apenas 6 anos a construir, entre 2001 e 2007.
Ao lado do Atlantis The Palm fica outro Atlantis, The Royal, igualmente luxuoso. Entrar lá dentro é como entrar num aeroporto: é enorme e há pessoas de todo o mundo por todo o lado. Famoso, entre outras coisas, pela enormes fontes que também cospem fogo, pelos 17 restaurantes, e pelas suítes com piscinas infinitas (aquela onde ficou Beyoncé, por exemplo, custa 100.000 dólares por noite e é – nem vale a pena dizê-lo – a suíte mais cara do mundo).
Mas se nem todos somos a Beyoncé, todos podemos ir a uma das muitas praias públicas. E valem mesmo a pena. O mar é azul e sossegado como uma piscina, o sol brilha constantemente e a areia é branca e fina. O paraíso. Se o paraíso é verdadeiro ou artificial, no Dubai aprendemos depressa que não vale a pena fazer essa pergunta.

Ainda vamos a sacudir a areia quando entramos num dos sítios mais representativos do Dubai atual: a escola de moda FAD, no Design District. O Dubai é atualmente conhecido como a capital da moda no mundo árabe, e faz sentido. Afinal, é aqui que estão algumas das principais marcas mundiais. Mas percebemos depressa o segredo do sucesso desta escola: a sua ligação à indústria. Muitas marcas, industriais e CEOs falam aos alunos sobre o que é a insdústria da moda, o que os clientes querem, aquilo de que as marcas precisam. Quem sai da FAD tem de certeza emprego garantido.

Um hospital para camelos
Mas para quem gosta de natureza mesmo natureza, nada mais natural do que o deserto. E ele está mesmo aqui. Afinal, era assim o Dubai dantes: nada mais que areia. Para quem nunca esteve no deserto, a areia é muito fina, e torna-se quase uma segunda pele. ‘Tirem os sapatos’, aconselha o nosso guia, Abdul. ‘Sintam a energia’.

Viemos de jipe, é uma viagem curta desde a cidade. Aliás, durante o inverno um dos passatempos preferidos de quem vive no Dubai é vir para o deserto (como nós vamos para a praia. Só que sem mar). Aqui fazem barbecues, convivem, passam a noite.
Por que é que não vêm no verão. Pois. Esqueci-me de vos falar nisso. Aqui está calor. Muito calor. Muito mas muito mas muito calor. Incrivelmente, não é o país mais quente do mundo (isto foi uma graça) mas deve estar lá perto. Ou pelo menos, parece. Conselho: levem um casaquinho. Não, não é porque à noite esfria. À noite esfria aí para 28 graus. O casaquinho vai ser-vos muito útil em todos os espaços fechados, que estão gelados com ar condicionado.
A caminho do deserto, Abdul vai contado mais coisas que não sabíamos. Então, olhem para as matrículas dos carros. Olhamos. Quantos números têm? Cinco. De vez em quando passa um com quatro e houve quem tivesse visto um com dois. Explicação: quanto menos números tiver uma matrícula, mais status. Então há quem pague 13 milhões de dólares por uma matrícula personalizada. Só pelo status. Isto é verídico. Não só se paga por um Ferrari ou Lamborghini mas também pela matrícula desejada, como o caso de um local que pagou 15 milhões de dólares pela matrícula P7 (homenagem a Cristiano Ronaldo?). Foi (adivinhem lá) a matrícula mais cara do mundo. O dinheiro arrecadado vai, dizem-nos, para instituições de caridade.
O ónix – que vemos por estas dunas da reserva – é o animal nacional, mas há dois animais verdadeiramente venerados no Dubai: o falcão e o camelo. Atualmente servem quase como decoração já lá vamos) mas noutros tempos eram essenciais aos homens: o falcão não era um animal doméstico como um piriquito, era um valiosíssimo ajudante de caça. Hoje em dia, são criados como desporto e até têm passaporte. Quando viajam vão em primeira classe, para proteger as penas. Nos tempos em que não se andava de Bentleys com matrículas personalizadas, o camelo era meio de transporte, de carga e de alimentação (comia-se muita carne e leite de camelo). Hoje, o desporto nacional não é o futebol nem o râguebi, mas as corridas de camelos, e não é de admirar que sejam tratados como reis. Aliás, passamos por uma tabuleta que indica ‘Camels Hospital’. É isso mesmo. Um hospital só para camelos (também há um hospital de falcões).

Chegamos a uma espécie de oásis onde se recria a tradicional hospitalidade do Dubai, com tendas, muita comida (acho que estou viciada em sumo natural de melancia, não sei como é que vou sobreviver em Lisboa, haverá no Corte Inglés?), danças tradicionais, tatuagens de henna, shisha e pequenos passeios de camelo. Fun facts sobre camelos: têm pestanas que eu matava para ter. São na verdade dromedários, porque só têm uma bossa, mas toda a gente lhes chama camelos. Podem resistir durante 21 dias sem água nem comida. Têm muito boa memória: se bater a uma mãe em frente da cria, anos depois a cria vai lembrar-se da sua cara e do seu cheiro. Pense nisto da próxima vez que estiver em frente de um camelo bebé.
Ver o mundo lá de cima
Pronto, não vos disse nada mas andava a temer este dia desde que cheguei. Alguma vez arriscaram a vida pelo vosso posto de trabalho? Pois esta vossa amiga foi o que fez. Enfim: na verdade não arrisquei nada, toda a gente vai presa até aos cabelos, mas deixem-me pensar desta maneira heróica.
Cá estamos nós no Adress Sky View, com os seus 61 andares. Viemos ver outra vista? Não. Enfim, sim. Sim mas – como se costuma dizer – para ver o Dubai como nunca o vimos: pendurados por cima do abismo.
A experiência chama-se Sky Edge Walk, e é isso mesmo: vamos presos por cabos e roldanas, mas mesmo assim saímos para o parapeito a 220 metros do chão. É muito metro. Se me passou pela cabeça desistir? Não passou outra coisa. Mas depois lembro-me que isto vai se escrito na primeira pessoa. Que é que vou dizer depois? Olhem cheguei lá acima e acobardei-me? (e porque não, na verdade, não é?)
Bem, lá saio para o parapeito, agarrada ao cabo como à vida. Que é que é para fazer agora? Ah, ver a vista. Ai que giro. Estamos mesmo alto.
Nivel 1: agora caminhar pelo parapeito. Ok, feito.
Nível 2, diz o instrutor. Vire-se de costas. De costas para onde? Para o precipício, of course. Ó raios. Viro-me de costas, rezando a todos os santinhos. Agora incline-se para trás… mais para trás… e largue a corda. Estenda os braços. Ó raios. Leitoras (e leitores, que somos uma cena inclusiva) queridas, fiz isto por vocês, ok. Espero que fique registado. Adoro-vos e gostava de um funeral bonito. ‘Smile, madame!’ grita o fotógrafo. Isto já me parece demais.
Bem, nível 3: agora balance-se por cima do precipício. Ahhhhhhhhhhh! Vou morrer aqui, longe da família e dos amigos. Agarro-me à corda, atiro-me muuuuuuuito devagariiiiiinho. Ufa! Pronto, já balancei. ‘Again madame. For the photo’.
Bolas. Ah, e ainda têm o escorrega de vidro. Mas para quem sobreviveu a um precipício, atirar-se por um escorrega transparente é um passeio no parque. Bem, um passeio nas nuvens.

Depois de ter sobrevivido, só quero é qualquer coisa relaxante. Levem-me a passear ao jardim. E levam mesmo. Claro que não é um jardim como os outros. Chama-se Miracle Garden e é – todos em coro – o maior jardim de flores naturais do mundo (e era para ser ainda maior, não fosse terem reparado a tempo que uma pessoa não aguenta tanto tempo ao sol).
É impressionantemente bonito embora haja quem ache kitsch. Sinceramente, eu estou do lado dos que acham impressionantemente bonito. E quem tiver crianças elas vão adorar encontrar, no meio dos milhões de cores, flores e arbustos, personagens conhecidas como os Smurfes, o génio do Aladino, animais variados, e até um avião da Emirates em tamnho natural e todo feito de flores. Lembre-se que isto é um jardim de flores naturais no meio do deserto, e já percebe porque é que lhe chamam o Jardim Milagroso…

O que é que me falta? Ahhhhhhh, o Museu do Futuro! Claro que para mim toda esta experiência já foi um Museu do Futuro, mas há mesmo um verdadeiro, e não deixem de ir. O espanto começa no edifício. Lá dentro entramos num simulador de nave espacial que nos deixa num planeta longínguo daqui a 50 anos, onde vamos saber tudo sobre o que nos espera. Guarde uma tarde ou mesmo um dia para aqui vir, porque há muito a aprender, desde o futuro das viagens e do espaço até às mudanças climáticas, bem-estar e espiritualidade. Especialmente impressionante é a sala onde está exposto o genoma de todas as espécies. E nós humanos somos só uma delas…
Conclusão: foi das viagens mais interessantes (e mais inesperadas) que fiz na vida. Se estava à espera de gostar tanto? Não estava. Encontrei um país cheio de contrastes (como se costuma dizer) mas que sabe receber os convidados como poucos. O seu entusiasmo e adrenalina são contagiantes. Talvez nos possamos inspirar nos seus falcões para tornar a nossa vida mais certeira e mais sonhadora. Se calhar não podemos todos ser números 1, como eles gostam, mas podemos sempre chegar cada vez mais alto.

Onde ficar
Grand Plaza Mövenpick Media City
Com 5 restaurantes, bar, ginásio e piscina exterior, tem um serviço impecável, as camas mais confortáveis do mundo e um pequeno-almoço gigantesco. Também se pode comer na esplanada exterior, mas a maioria dos hóspedes prefere começar o dia com ar condicionado…
Desde 129E por noite.
Onde comer
Sítio para comer é o que não falta no Dubai, onde a noção de receber bem, como eles próprios afirmam, é encher o hóspede de comida até ele rebentar. Alguns sítios que valem a pena:
– Avatara – 1 estrela Michelin até é pouco para uma experiência que junta beleza, originalidade e sabor. São 16 pratos vegetarianos um a seguir ao outro e cada um mais bonito que o anterior. Nunca mais se vai esquecer desta refeição. Preço: 128 E
– 11 Woodfire – Outro com 1 estrela, é um restaurante onde todos os pratos são cozinhados em forno de lenha. Vá com fome. Entre os 22 e os 170E.
– Ikigai – No Dubai existem restaurantes de todas as etnias, e tal como os portugueses, são grandesa preciadores de gastronomia japonesa. Este é um dos restaurantes orientais mais famosos, pela gastronomia japonesa variada com produtos de alta qualidade, preços acessíveis, staff simpático e até truques de magia à mesa. Preços: De 26 a 77E.