Adoramos estrangeiros, mas o que acontece quando esses estrangeiros nos conhecem melhor do que nós nos conhecemos a nós próprios? É o caso de Thomas Fischer, um alemão que se apaixonou pelo nosso país desde que primeiro cá pôs os pés, no verão quente de 75, e que cá vive desde 1983.
Não sei o que vocês pensam, mas eu adoro saber como os outros nos veem. Isto também é muito português, esta obsessão com o olhar exterior. E aqui temos muito com que nos entretermos e refletirmos.
Neste livro, vemos o encontro de um país com uma pessoa; Thomas Fischer, jornalista, conta-nos como foi a sua infância passada em Inglaterra (onde era ‘o alemão’) e depois na Alemanha (onde era ‘o inglês’), a sua chegada a Portugal nos anos 70, quando a nossa revolução foi uma esperança para os jovens idealistas de todo o mundo, o seu estabelecimento num país que nem sempre foi – é – fácil de amar. Mas chego ao fim do livro a achar que aprendi mais sobre Portugal que sobre Thomas.
Se querem um tratado sobre Portugal e os portugueses, aqui está: uma mistura explosiva do olhar alemão, analítico e distante, com aquilo a que por falta de melhor palavra chamaremos a alma portuguesa, apaixonada, irritada e sonhadora, que resulta numa mistura muitíssimo interessante para o leitor português.
Estamos todos aqui, nós, os Tugas, e este maravilhoso e terrível país que é o nosso, pelo olhar interior e exterior do alemão mais lusitano do mundo.
Estamos todos aqui, nós e a nossa língua, a burocracia, o simplex, o futebol, o brilho e a batota, os santos e Sebastiões, os homens e as mulheres, a Via Verde e o Multibanco, o amor e a amizade, o preconceito e a solidariedade, o fado e a felicidade.
No fundo, como ele próprio diz, isto é uma história de amor. Mas também há desencanto à mistura. Como o próprio afirma, “Portugal é um país que julgo conhecer bastante bem e onde costumo ser bem tratado, mas onde nunca deixei de me sentir um estranho”.
O amor pelo nosso (nosso e dele) país é tanto como a incontida raiva pelo que o país podia ser. Portanto atenção: isto não é um encómio aos pastéis de nata ou à beleza das praias. Portugal, para Thomas, é um país maravilhoso que podia ser paradisíaco se apostasse mais no melhor que tem, que são as pessoas.
O que falta para sermos melhores? “Num país com uma tão forte tendência para o derrotismo parece faltar um pouco mais do espírito ‘yes we can’”, de solidariedade e de confiança na ação coletiva, em vez de se esperar por milagreiros que ‘resolvam’”.
Podia estar aqui a tarde toda a espetar-vos com citações do livro, mas acontece que o livro é todo ele citável, por isso desisto já aqui e não vos vou citar mais nada. Vão lá ler e tenham a inteligência de se reconhecerem no espelho que Fischer nos apresenta.
‘Entre cravos e cardos’ – Thomas Fischer, Ed. 70, E22,90