Foto: Paulo Miguel Martins

*artigo publicado originalmente na revista ACTIVA nº347 (outubro 2019)

Encontro-me com Anne pela primeira vez em plena Avenida da Liberdade, em Lisboa. Reconheço-lhe aquele ‘je ne sais quois’ que admiro nas francesas e me faz desejar ter pelo menos um décimo do seu estilo de cada vez que passeio a pé pelas ruas de Paris ainda verdadeiramente parisienses (e já são poucas, infelizmente!). Com traços exóticos, um bonito cabelo negro e quase ausência de maquilhagem, Anne exala aquele mundo onde a moda se encontra com a arte.
Admiro-lhe o biker de pele, que adivinho comprado numa qualquer loja vintage do Marrais, e identifico as maravilhosas botas de cowboy que calça. No seu look unem-se mundos diferentes, que vão da nostalgia boémia até ao rock. Anne tem em si uma mistura perfeita da alma lusa com o allure francês. É parisiense desde o berço, mas o código genético português transparece. Aos 34 anos, a luso-descendente é uma mulher cheia de estilo que vive a moda desde o lado de dentro. Um percurso profissional de sonho que começou quando, aos 17 anos, fez um estágio na maison Christian Lacroix e ao qual se juntaram nomes como Thierry Mugler, Antik Batik, Gerard Darel, Stella Cadente, Zadig & Voltaire e, atualmente, IRO. Uma conversa sobre moda, estilo e consumo consciente.

Sente-se uma parisiense a viver em Lisboa?

Sinto. Existem em mim códigos culturais que não posso mudar, nem negar. Aliás, em Portugal dizem-me sempre que se percebe logo que sou francesa. Mas, no fundo, tenho uma mistura de portuguesa e francesa, pois os meus pais sempre me mostraram a vantagem de crescer com duas culturas e ter dupla nacionalidade. Tanto me sinto francesa como portuguesa e isso é uma riqueza.

Quando é que trocou Paris por Lisboa?

Em fevereiro [de 2019]. Vim para cuidar mais de mim, através duma melhor qualidade de vida. Senti que era a altura certa de me lançar, como freelancer, no desafio profissional de ajudar marcas a encontrarem o seu ADN e a criarem uma estratégia de marketing e comunicação. Faço hoje um trabalho de Brand Development/Consultant, um acompanhamento a 360 graus.
Mas vou uma vez por mês a Paris, agora fico em casa dos meus pais porque deixei de ter lá casa. Sinto necessidade de ir; Paris é sempre uma fonte de inspiração e também de equilíbrio.

A moda está a abrir portas a novos valores, produção sustentável, consumo consciente e aceitação da diversidade. Como vê esta visão da moda?

Era necessária porque a maneira de consumir está a mudar e as marcas têm de se adaptar às expectativas dos consumidores. As pessoas começam a preferir comprar menos e melhor, a consumir de um modo consciente e ético. Ninguém consegue apagar da memória a tragédia do colapso do edifício de uma fábrica têxtil no Bangladesh, em 2013, com centenas de mortos. Depois disso a moda mudou e o consumidor já tem mais dificuldade em comprar sem estar atento à origem. Infelizmente, ainda há poucas marcas a cumprirem as suas obrigações, mas há um caminho que começa a ser feito e acredito que vamos conseguir.

Nota-se nas últimas coleções das grandes casas de moda uma certa nostalgia. A bolha das tendências, muito inflacionada pela vertiginosa velocidade
da Internet, está prestes a rebentar?
Acho que acalmou um pouco. Há dois anos havia uma loucura maior, quando surgiu o conceito de comprar imediatamente a seguir ao desfile sem esperar a chegada da estação. Isso estava a acabar com a magia de esperar pelas novas tendências e tem vindo a ser abandonado, dando lugar a coleções mais consistentes.

Foto: Paulo Miguel Martins
Quais as últimas tendências que tornou suas?

Não sigo as tendências, tenho o meu próprio estilo. Yves Saint Laurent dizia que “o estilo é qualquer coisa de muito pessoal. Se a moda é passageira, o estilo é eterno. Se a moda é fútil, o estilo não é”. As tendências inspiram-me e por vezes levam-me a comprar mais por paixão, mas não definem nunca o meu estilo.
Gosto mais de me identificar através de marcas com história: como a Isabel Marant, Saint Laurent ou IRO, que agora represento como brand consultant no mercado português.

É capaz de explicar o seu estilo?

Se calhar, por ser do signo Gémeos, tenho dois estilos que me definem. Sou meio boémio, meio roqueira, e esses dois estilos adaptam-se aos meus humores.

Identifico na Anne aquele ‘je ne sais quoi’ que invejo nas francesas. Acredita que o estilo é inato ou constrói-se?

Ambos, mas acredito que é mais inato. Embora sejamos muito influenciados pela cultura da moda onde vivemos. Não é por acaso que costumam dizer que tenho o estilo parisiense. No caso do estilo francês, acho que é mais inato, mais fluido.

Consegue identificar o que no seu estilo é inato e o que foi construído?

Inato, diria que é o meu estilo masculino/feminino e o effortless. Construído, é claramente o meu lado boho, porque o encontrei nas lojas vintage e durante as viagens que fui fazendo.

Há algum paralelo entre o estilo das lisboetas e das francesas?

Diria que as portuguesas são mais femininas, como se diz em francês, elas têm o ‘souci du détail’ (o imperativo dos pormenores). Já as parisienses são mais simples, casual, minimalistas e efortless. É com este estilo que eu me identifico mais.

Que conselhos daria a uma mulher que anda à procura do seu estilo?

Não procurar o que é supermoda. Não achar que o que a vizinha ou amiga compraram é que é tendência, porque isso é perder a sua natureza. Devemos criar o nosso próprio estilo, a nossa identidade, privilegiando a sobriedade e a simplicidade, para criar uma aparência elegante. A medida certa é não exagerar.

Qual a mulher que identifica como o cúmulo da elegância?

A modelo Anja Rubik. A elegância é uma questão de atitude e maneira de ser e estar, muito mais do que aquilo que se veste. Considero que é elegante quem é natural, não se arranja demasiado, não usa demasiados acessórios e maquilha-se com subtileza. Entre roupa, acessórios e maquilhagem tem que haver um equilíbrio, não podem ser os três intensos ao mesmo tempo.

Foto: Paulo Miguel Martins
Quais são os seus básicos?

Tenho um em particular, as botas de cowboy, tenho uma quinzena. Há 10 anos que uso este estilo de botas.

Qual a peça de roupa que mais repete no seu armário?

Os blazers e as calças em pele, são peças intemporais.

Lembra-se da primeira compra de moda que fez com o seu próprio dinheiro?

Perfeitamente! Estava a estagiar no departamento de vendas das Galeries Lafayette, tinha talvez 17 anos, e foi na altura que Christian Dior criou as carteiras em forma de sela, ainda todas com monograma. Guardei-a até hoje e, apesar das saddle bags terem voltado a ser moda nos últimos dois anos, não consigo usá-la porque sou incapaz de assumir monogramas. Mas está bem guardada e quero conservá-la.

Qual a peça mais fabulosa que tem no seu armário e de que nunca vai desfazer-se?

Um vestido em seda com padrão leopardo, de frente gráfica com uma borboleta psicadélica meio grunge. É da altura do Riccardo Tisci na Givenchy. Adorei os anos do Tisci pela mistura elegante entre o barroco e o gothic rock. Guardo-o preciosamente.

E o que é que nunca vamos encontrar no seu armário?

Duas coisas: Ugg e Crocs!

Qual foi a última peça que adquiriu?

Não foi uma, mas duas: um vestido preto em croché da Ralph Lauren e um blazer da Missoni. Foram grandes descobertas que fiz em Lisboa. Adoro comprar vintage!

Um look que para si nunca falha…

Blazer oversize, T-shirt, saia curta ou calças de pele com botas.

Foto: Paulo Miguel Martins
Quando é que nasceu a sua paixão pela moda?

O primeiro impulso foi através da minha avó paterna, que vivia em Lisboa. Era uma mulher sempre elegante, coquette, atenta à moda. Recordo-me, quando eu tinha sete ou oito anos, de me pedir para lhe pintar as unhas e penteá-la. Depois, como eu vivia na capital da moda, era natural ter um acesso mais fácil a esse mundo. Lembro-me tão bem de folhear as revistas francesas que a minha irmã, mais velha 12 anos, comprava. E há um ritual que ainda me traz boas recordações, o ir às compras todos os sábados com a minha mãe e irmã às Galeries Lafayette, era aí que tinha contato com as tendências.

Mas existiu um momento marcante…

O dia em que vi o videoclipe da música ‘Too Funky’ do George Michael com as top models do momento, Eva Herzigova, Linda Evangelista… Desfilavam com criações de Thierry Mugler. Fiquei espantada e nesse momento percebi que moda não é só roupa ou vestir-se bem, é criatividade e arte.
Anos e anos depois, o destino foi mágico porque tive a oportunidade de estagiar na maison Thierry Mugler, na parte da comunicação/arquivos, e geri as roupas do videoclipe para produções de moda. Um sonho! E no ano passado, quando ainda trabalhava como PR Manager da Zadig & Voltaire, estive no shooting da campanha com a Eva Herzigova.

De tudo o que já aprendeu no mundo da moda, de quem é que recebeu o melhor conselho?

Da Frankie, que foi minha diretora de comunicação quando trabalhei na Gerard Darel. Disse-me que não se aguenta a área da moda sem paixão ou força de vontade e que nada é impossível. Talvez por isso no meu trabalho eu seja um pouco teimosa e perseverante.

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