Dizem que quem corre por gosto não cansa. É o caso de Maria da Penha Pereira Coutinho, sócia fundadora e CEO do grupo Os Suspeitos do Costume, que já se habituou a não ter dias típicos. Numa das configurações possíveis, desdobra-se em reuniões de administração, de gestão e operacionais; e em visitas aos negócios que detém em Lisboa O que nunca falha são alguns rituais de autocuidado, como o exercício físico, e, acima de tudo, jantar com a família.
A importância das reuniões (e do diálogo sobre todo o tipo de assuntos) à mesa prende-se com algumas das memórias mais antigas que a empresária tem: as férias em Lamego, na casa dos avós paternos, com os tios e 29 primos. “Os grandes repastos eram acompanhados de longas conversas, gargalhadas e muito sentido de humor (…) Não faltavam festas, convívios e piqueniques com amigos”, conta-nos.
Curiosamente, nunca lhe passou pela cabeça dedicar-se à hospitalidade. Psicóloga de formação, trabalhou 20 anos em Gestão de Recursos Humanos e sempre pensou que faria carreira nesse campo. Porém, a vida tinha outros planos.
“A restauração foi um acaso, uma oportunidade que surgiu. Primeiro veio o Vilão, em 2013, e depois o Le Chat, em 2017. Um levou ao outro”, explica, acrescentando que as competências adquiridas anteriormente, tanto no ensino superior como no mercado de trabalho, não foram desperdiçadas. “A minha formação em Psicologia e experiência em gestão de pessoas proporcionou-me uma base sólida de competências, conhecimentos e capacidades, que tenho aplicado na área da hospitalidade, mais concretamente ao turismo e à restauração”.
Cinco anos após ter dado o salto para um mundo novo, o balanço é positivo: reinventou-se profissionalmente e tem no currículo três espaços de referência na capital — Catch Me, O Bom O Mau e o Vilão e Eat Pray Love. Em conversa com o site da ACTIVA, Maria da Penha Pereira Coutinho, empreendedora e mãe de três, fala sobre este percurso que surgiu da paixão de fazer os outros felizes.
O grupo Os Suspeitos do Costume nasceu em 2019 com que missão?
Criar experiências urbanas incríveis, em locais extraordinários, que fazem pessoas felizes. Cada espaço dos Suspeitos do Costume propõe-se a transformar para bem receber os seus clientes, surpreender e ser surpreendido. Muito mais do que felicidade individual, somos criadores de alegria partilhada. Queremos ser o melhor espaço em cada um dos segmentos. Queremos, inclusive, ser referenciados como incríveis internacionalmente.
Porquê o nome Os Suspeitos do Costume?
Os nossos espaços têm nomes de filmes. Para o Grupo queríamos um nome forte, original e impactante. Deixamos pegadas por onde andamos e somos distintos naquilo que fazemos. “Logo vi que era dos Suspeitos do Costume” é o que queremos que os nossos clientes digam.
Atualmente, detêm três espaços de referência em Lisboa: O Bom Mau e o Vilão; Catch me e o recém-inaugurado Eat Pray Love. O que distingue cada um deles e as respetivas ementas?
O Bom o Mau e o Vilão é um bar cool — para mim o mais cool — e eclético, que se distingue pela sua agenda musical escolhida a dedo, os cocktails de autor e uma atmosfera vintage e única. Os nossos clientes, muitos portugueses e estrangeiros, sentem-se em casa e não resistem também à animada pista de dança.
O Catch Me é um restaurante-bar-rooftop focado em Lifestyle. É a melhor esplanada de Lisboa e um espaço que muda ao longo do dia, de um almoço até uma festa muito sofisticada à noite. Dono de uma excelente vista, gente gira e boa música, proporciona uma experiência gastronómica única com um menu delicioso que cruza sabores do mundo. Pretende também ser um espaço de referência para grupos e eventos (inter)nacionais.
O Eat Pray Love é um restaurante com o conceito de que ser saudável é comer de forma deliciosa e divertida, conjugando ingredientes orgânicos, naturais, frescos, locais e saborosos. A lógica é: “sei que o que comer no EPL terá boa qualidade”. Para além do simples ato de comer, inspira a uma mudança de mentalidade e de hábitos alimentares nos nossos clientes (Eat); pretende integrar uma componente de bem-estar mental (Pray), incluindo aulas de ioga e palestras; promove as relações positivas entre as pessoas (Love).
Temos um outro espaço, o Meia Nau, que estamos a transformar num social club e também terá o nome de um filme.
Nos tempos que correm, como é que o nosso estilo de vida corrido afeta (ou não) o ramo da restauração?
Por um lado, no dia a dia, muitas pessoas procuram refeições rápidas fora de casa, porque têm menos tempo para comer e cozinhar. Por outro, para compensar a correria do dia a dia, há quem procure locais para relaxar, onde se sinta bem, para divertir-se e estar com os amigos. Os restaurantes têm de identificar o segmento de clientes que querem atrair e devem procurar ser a melhor opção para eles. A pergunta que nos fazemos sempre é: “os nossos espaços seriam a nossa escolha se não fossemos os donos?” Se sim, estamos bem.
Ainda temos tempo para jantares de três ou quatro horas?
Ainda há espaço para jantares prolongados, embora sejam menos comuns do que no passado. Existem ocasiões especiais em que os clientes estão dispostos a investir mais tempo e dinheiro numa experiência gastronómica completa como, por exemplo, aniversários, encontros românticos e eventos empresariais. Ou, simplesmente, quando desejam ter uma experiência gastronómica memorável e mais relaxante.
Esse ritmo corrido é algo que devemos combater ou a que devemos adaptar-nos?
O ritmo corrido dos clientes pode ser encarado como um desafio, mas também como uma oportunidade. É importante ouvirmos e sentirmos os clientes, adaptando-nos continuamente às suas necessidades e expectativas. Nos nossos espaços, procuramos um bom equilíbrio entre a agilidade e a qualidade. Oferecemos um ambiente acolhedor e confortável para relaxar, incentivamos a atenção ao detalhe, mas também procuramos agilizar o serviço com refeições rápidas e leves.
Qual é o papel da autenticidade no vossa área?
Visamos ser únicos e partilhamos a nossa maneira de viver o mundo. Somos espontâneos e genuínos. Tentamos transmitir uma energia positiva, contagiando aqueles que estão à nossa volta e mostrando o que há de melhor para vivenciar. Os nossos espaços são 100% a nossa cara.
Onde é que isso reflete nos vossos restaurantes?
Criando um bom ambiente e atmosfera, mostrando interesse pelos nossos clientes, sendo autênticos no atendimento e criando uma identidade culinária, ou seja, como são preparados os pratos e de onde vêm os ingredientes.
A Maria da Penha é CEO das três marcas. Que cunho pessoal dá a cada uma delas?
Partilhar com os outros a história que está por detrás de cada marca é uma forma de dar o meu cunho pessoal. Coloco um pouco do meu gosto pessoal na decoração, atento a detalhes, como se da minha casa se tratasse; valorizo as opiniões e feedback dos clientes e dos meus colaboradores; escolho alguns pratos com base nas minhas preferências ou em viagens que fiz; crio eventos temáticos, dando um toque pessoal.
Como foi a jornada para chegar onde está?
Com muitos contratempos, desafios e imprevistos, uma vez que a minha formação e experiência não vêm da restauração, mas também com vontade, determinação, criatividade e muita resiliência.
Há muitas foodpreneurs do sexo feminino ou esta é uma área maioritariamente dominada por homens?
A presença de foodpreneurs tem crescido significativamente nos últimos anos. As mulheres têm desempenhado papéis importantes na indústria alimentar, seja como chefs, proprietárias de restaurantes, empreendedoras de alimentos artesanais, criadoras de startups de alimentos ou consultoras/influencers de cozinha. Aliás, trazem uma perspetiva única, criatividade e inovação neste setor. Embora ainda existam desafios e desigualdades de género, o cenário está a mudar.
Alguma vez se sentiu desmerecida de alguma forma, em algum momento da sua carreira, por ser mulher?
Sim, senti, mais nos primeiros anos de trabalho, por ser mulher e nova. A minha formação em Psicologia, os meus conhecimentos e experiência nas áreas de comunicação e liderança ajudaram-me a vencer esse preconceito. Hoje em dia, não é um problema.
Quais são os seus feitos de que mais se orgulha?
Fazer renascer das cinzas O Bom O Mau e o Vilão após um incêndio que aconteceu em agosto de 2019. Tive de superar a tristeza e os desafios de ver um negócio com uma história destruído, além de lidar com as pessoas que trabalhavam lá na altura. Orgulho-me de ter conseguido reinaugurar o bar sete meses depois, com persistência, capacidade de superação, resiliência e vontade de preservar a história e identidade do Vilão.
Um momento que mudou a sua vida profissional?
A decisão de largar um emprego “fixo” e estável em 2013 para criar um negócio meu, em áreas totalmente distintas daquelas a que estava habituada.
A sua realidade atualmente é muito diferente daquela que imaginava aos 20 anos?
Muitíssimo. Quando eu tinha 20 anos, sabia muito pouco da realidade profissional e, nessa altura, sonhava ser Diretora de Recursos de uma grande empresa.
Quais são os ingredientes para uma boa vida?
Ter um propósito e significado; saúde física e mental; bem-estar emocional, equilíbrio entre a vida pessoal e profissional; manter boas relações com a família e os amigos; ser grata e apreciar as coisas boas; e procurar lidar com as adversidades de forma saudável.