No passado dia 8 de setembro, quando começaram a surgir as primeiras notícias que davam conta de que o estado de saúde de Isabel II tinha piorado drasticamente, as palavras fortes de Uju Anya abalaram a Internet.
“Ouvi dizer que a monarca chefe de um império genocida de ladrões está, finalmente, a morrer. Que a dor dela seja excruciante”, começa por dizer no Twitter. “Se alguém espera que eu expresse algo a não ser desdém pela monarca que supervisionou um governo que patrocinou o genocídio que massacrou e deslocou metade da minha família, cujas consequências ainda estão a ser superadas pelos sobreviventes, podem continuar a desejar”, acrescenta. “Aquela mulher miserável e o seu trono sanguinário destruíram gerações dos meus antepassados em ambos os lados da família, e ela supervisionou um governo que patrocinou o genocídio ao qual os meus pais e irmãos sobreviveram. Que ela morra em agonia”.
O tweet tornou-se viral, reunindo tantas palavras de apoio como de repúdio, depois de Jeff Bezos ter citado o comentário da professora catedrática. “Esta é uma pessoa que, supostamente, trabalha para tornar o mundo num lugar melhor? Não me parece. Uau”, escreveu o fundador da Amazon na mesma rede social.
Anya respondeu a Bezos, escrevendo: “Que todos que tu e a tua ganância impiedosa prejudicaram neste mundo se lembrem de ti com tanto carinho como eu me lembro dos meus colonizadores”. O post inicial da investigadora em linguística aplicada foi eliminado pelo Twitter, por violar as políticas da plataforma contra desejar mal a outros utilizadores, enquanto a Universidade de Carnegie Mellon divulgou um comunicado em que se distancia das declarações feitas pela docente.
“A liberdade de expressão é fundamental para a missão do ensino superior. No entanto, as opiniões que [Anya] compartilhou não representam, de todo, os valores da instituição, nem os padrões de discurso que procuramos promover”, fez saber a universidade que, no passado, recebeu uma doação de dois milhões de dólares da Amazon para a sua Academia de Ciências da Computação.
Um passado de violência
Anya nasceu na Nigéria, depois de uma guerra civil brutal no país, que incluiu um genocídio auxiliado e incentivado pelo Reino Unido, devido a interesses de exploração e produção de petróleo. É uma das muitas pessoas que criticam abertamente o papel de Isabel II em esconder as realidades do colonialismo, que a soberana reconheceu ocasionalmente durante as sete décadas que passou no trono, mas pelas quais nunca pediu desculpa de forma explícita.
Em declarações à NBC News, a professora universitária explica que a perceção que tem da realeza vem de um lugar de mágoa pessoal e oposição política à história imperial e ao legado da monarquia britânica. “Fico profundamente ofendida com a noção de que os oprimidos e os sobreviventes da violência precisam de ser, de alguma forma, respeitosos quando os seus opressores morrem”.
Já numa conversa com o The Cut, afirma que a rainha representava o culto da mulher branca. “Há esta noção de que ela era uma avó velhinha, com os seus chapéuzinhos, malinhas, cãezinhos e tudo mais — como se ela habitasse esse lugar ou espaço no imaginário, esta imagem pública de alguém que não teve um dedo no derramamento de sangue da sua Coroa”, esclarece. “Até as coroas que ela usava são saqueadas; pilhadas das terras que eles exploravam (…) Todo o tesouro é um legado de roubo, que foi conquistado pelo assassinato, pela escravização, e não parou após a independência”.