Jennie tem 16 anos e está num consultório a fazer um despiste a doenças venéreas. Só veio por brincadeira e para acompanhar uma amiga angustiada. Ela não está preocupada. A última vez que teve sexo foi há um ano, com o rapaz que lhe tirou a virgindade. Mas, mais tarde, vai descobrir que está infectada com VIH/sida.
Esta história faz parte de ‘Kids’ (‘Miúdos’), um filme de Larry Clark sobre um grupo de jovens nova-iorquinos. Quando estreou, em 1995, alguns críticos diziam: é o filme que todos os pais deviam ver.
Alerte-o para comportamentos de risco
Yasmina Gonçalves é psicóloga e técnica de informação e aconselhamento a jovens da Associação de Planeamento Familiar. Para ela, ‘Kids’ até pode servir de material de reflexão no que respeita ao VIH/sida, ‘mas nunca sem ser explicado e debatido com os jovens – utilizamos pequenos filmes nas acções que fazemos e, depois, há sempre um debate sobre comportamentos saudáveis’.
Este alarme em relação aos adolescentes é justificado pelos números da ONUSIDA. A faixa etária entre os 15 e os 24 anos é aquela em que o número de infectados com o VIH/sida mais cresceu em todo o mundo: seis mil novos casos por dia, desde 2003. Em 2004, 30% dos 12 mil novos casos de VIH em Portugal pertenciam a jovens dos 20 aos 29 anos. Apesar desta ser a geração da Internet e do acesso fácil à informação, ainda não está completamente esclarecida sobre o VIH. ‘O modo como as pessoas lidam com essa informação nem sempre é o mais correcto’, diz Yasmina. ‘Estão informados sobre as vias de transmissão do VIH, já se preocupam mais com as infecções sexualmente transmissíveis (IST), especialmente com o VIH. Mas, em situações em que podem existir comportamentos de risco, muitas vezes não adoptam o uso do preservativo.’ Com a entrada na adolescência vêm as primeiras saídas, os primeiros contactos com o álcool e outras substâncias que podem levar ao sexo desprotegido. ‘Os jovens são mais propensos a novas descobertas e ao contacto com diversas experiências. O álcool pode fomentá-los’, diz a psicóloga.
Desfaça os mitos em que ele acredita
Yasmina Gonçalves fala-nos das ideias erradas que os adolescentes ainda têm sobre a transmissão do vírus da sida.
‘Colocar o preservativo não tem nada que saber!’
O seu filho sabe colocar o preservativo? ‘É preciso ver a data de validade, ter cuidado a abrir a embalagem para não o rasgar, desenrolá-lo completamente e evitar a exposição prolongada a fontes de calor. Se o jovem não entrar em contacto com o preservativo antes de o usar, tem mais hipóteses de o colocar mal. Quando fazemos acções de sensibilização, tentamos fazer a demonstração da colocação do preservativo e que sejam eles a fazê-la.’
‘Ponho-o apenas um pouco antes da ejaculação’
O preservativo coloca-se assim que o pénis está erecto e sempre antes da penetração. ‘Os jovens podem até utilizá-lo para o sexo vaginal, mas muitos colocam-no apenas um pouco antes da ejaculação.’ Mas, na verdade, pode existir libertação de pequenas quantidades de sémen antes da ejaculação.
‘Não preciso dele para o sexo oral’
‘A probabilidade de transmissão do vírus com esta prática sexual é menor, mas existe.’ Basta existir uma ferida aberta na boca ou nos órgãos sexuais para a transmissão ocorrer.
‘Todos os contraceptivos protegem das IST’
Só o uso correcto e sistemático do preservativo protege contra a sida. ‘Muitos jovens ainda acham que a pílula, o adesivo ou o anel contraceptivo também protegem das IST. A partir deste pensamento, abre-se a porta a possíveis infecções.’
‘Não preciso de o usar numa relação estável’
O amor é eterno enquanto dura. E para um adolescente, o conceito de ‘relação estável’ não é necessariamente o mesmo que para um adulto. ‘A temporalidade das relações é vivida de maneira diferente. Podem até começar a usar o preservativo no início da relação, mas, a partir do momento que consideram que têm uma relação estável, põem-no de lado.’
‘A sida só acontece aos outros’
‘Ainda existe muito a ideia de que uma pessoa de aspecto saudável, que faz parte do grupo de amigos ou pratica desporto, não tem o mesmo risco de estar infectado’, afirma Yasmina.
Sonde-o antes de abordar o tema
Yasmina Gonçalves dá acções de formação a jovens a partir dos 12 anos. A entrada na adolescência é a altura para lhes começar a falar de sida, antes das primeiras experiências sexuais. A psicóloga aconselha os pais: ‘Podem usar programas de televisão e revistas para focar o assunto.’ Não vale a pena forçar o tema mais cedo, quando a sexualidade ainda pouco interessa ao seu filho. ‘Podem primeiro sondá-lo, fazendo perguntas, o que é que ele já sabe sobre o VIH e, a partir daí, esclarecer e aprofundar o tema’, observa Yasmina Gonçalves.
Explique ao seu filho…
… que o preservativo não é um ‘mal necessário’.
‘O preservativo tem um estigma grande sobre si que não foi criado pelos jovens’, diz Yasmina Gonçalves. É preciso vê-lo como algo positivo na relação, uma prova de amor e não apenas como algo que se utiliza quando há relações de uma noite ou casos extraconjugais, alerta ainda a psicóloga.
… as vantagens em relação a outros contraceptivos.
Só o uso continuado do preservativo protege o risco de contágio do VIH e de outras doenças venéreas e evita a gravidez. ‘Mas muitos jovens ainda vêem uma gravidez indesejada como o único risco imediato de uma relação desprotegida, não o VIH’, observa Yasmina.
… que há outras medidas de prevenção a seguir.
Objectos de higiene pessoal, como escovas de dentes, kits de manicura ou tesouras, não devem ser partilhados. Atenção: tatuagens e piercings são procedimentos equivalentes a minicirurgias! ‘Seria bom informarem-se, primeiro, como se fazem e exigirem sempre material de perfuração descartável’, aconselha a psicóloga.