Não é novidade: a depressão é uma das pragas da sociedade ocidental no séc. XXI. “Embora tenha uma componente genética e biológica, também tem muito de psicossocial e o stresse é um dos maiores fatores desencadeantes”, observa a psicoterapeuta Margarida Casimiro.
E Portugal é um país deprimido. A crise não ajuda a compor o ramalhete, mas mesmo assim o Estudo Nacional de Saúde Mental, feito em 2010, concluiu que 7,9% dos portugueses sofrem ou sofreram de perturbações depressivas, números que estão acima da média europeia. Não admira que o consumo de antidepressivos aumente: 15% dos inquiridos neste estudo tinha tomado um antidepressivo nos 12 meses anteriores. Até maio deste ano, o número de embalagens vendidas aumentou 6,3%, para 2,9 milhões.
“E a juntar aos antidepressivos há a considerar ainda o consumo de ansiolíticos e estabilizadores de humor, também usados para o tratamento desta doença”, lembra Margarida Casimiro. “Este tipo de fármaco é fundamental no tratamento da depressão, mas é importante que, paralelamente, exista um acompanhamento psicoterapêutico. Com o aparecimento do Prozac, nos anos 80, foi possível tratar a depressão com grandes ganhos, mas também grandes exageros. Comercialmente, resultou muito bem vender a pílula da felicidade. Passou a poder tratar-se esta doença sem os efeitos secundários que os antidepressivos anteriores traziam, como o grande aumento de peso, problemas cardiovasculares daí resultantes, letargia, quebra de libido. Mas até que ponto isto é tratar a verdadeira causa da depressão e não é varrer os problemas para baixo do tapete? O comprimido é excelente para esconder o sintoma, mas o sintoma fala e, se o calarmos, ficamos sem saber o que causou a depressão e como a tratar.”
O que deveria ser um período limitado de toma acaba, em muitas situações, por se arrastar no tempo, indefinidamente. Por isso, procurar alternativas ao medicamento, em termos de terapia e estilos de vida, torna-se cada vez mais relevante e urgente. Margarida Casimiro fala-nos de alguns.
DANÇATERAPIA E OUTRAS TERAPIAS EXPRESSIVAS
Se usamos o corpo como veículo dos nossos pensamentos e emoções, o caminho também pode ser feito em sentido inverso: os nossos movimentos podem transformar a nossa mente. “São técnicas muito úteis para pacientes que se identifiquem com a área das artes. A dança é organizada em contexto terapêutico, sem uma intencionalidade estética ou coreográfica, numa proposta de movimento criativo e livre onde projetamos e libertamos emoções, promovemos a interação e a comunicação, aumentamos a autoestima, estimulamos a criatividade, relaxando física e mentalmente. Sendo feita em grupo, é uma terapia individual, já que cada movimento é adequado a cada pessoa. Pode não curar a depressão, mas pode ser uma ajuda valiosa na redução dos níveis de ansiedade, melhoria da autoestima, da vitalidade e predisposição para a ação.”
Outra terapia expressiva com bons resultados é a moldagem. “O facto da pessoa poder moldar em barro, gesso ou outro material, essa relação física é muito útil para pacientes que tiveram más experiências com o toque (vítimas de abusos físicos ou sexuais, por exemplo), ajudando-os a transformá-lo em algo positivo e construtivo.”
PSICODRAMA
Esta técnica de terapia em grupo procura a resolução de conflitos, pessoais e interpessoais, através da sua representação por parte dos membros de um grupo terapêutico. É sempre orientado por um terapeuta. Muito útil para treinar competências como a assertividade ou liderança, é usado em variados casos, desde pessoas que têm dificuldade com a exposição em público até pessoas com depressão, que procuram entender ou resolver conflitos familiares, divórcios, experiências de abuso. “São sessões muito intensas. O fundamental é treinar papéis diferentes e gerir competências dentro desses papéis diferentes. É importante desmistificar a ideia de que não se utiliza esta terapia em psicopatologias. Não é para tratar a patologia, e sim para dar ferramentas ao paciente, treinar a sua inserção na sociedade. A pessoa precisa de perceber onde termina e começa o seu papel na sociedade.”
HIPNOSE CLÍNICA
Esta técnica recorre ao relaxamento para induzir a um estado momentaneamente alterado da consciência. “É uma técnica muito útil no tratamento de alguns sintomas associados a esta doença, sobretudo os mais incapacitantes, como ansiedade e fobias. Quando a pessoa está num estado de consciência momentaneamente alterado, desliga-se das resistências e preocupações normais. Assim, consegue-se chegar aos verdadeiros motivos que estiveram na origem da depressão, tornando possível ‘reprogramar-se’ e alterar os padrões de comportamento que poderão ter levado a essa situação. Na Universidade da Madeira, a professora Carmo Aragão realizou um trabalho muito interessante com estudantes universitários, em que utilizou a hipnose na redução da ansiedade associada aos exames. Teve resultados muito positivos na redução deste sintoma e conseguiu um melhor desempenho entre os alunos.”
TÉCNICA E.M.D.R.
É uma técnica recente, criada nos anos 80, e as iniciais significam Eye Movement Desensitization and Reprocessing (Dessensibilização e Reprocessamento através do Movimento Ocular). Parte do princípio de que todos os transtornos mentais são resultantes de um evento traumático do passado mas que esta memória pode ser transformada de forma rápida. “Esta técnica também promove um estado alterado de consciência momentânea, não estamos num estado de vigilância total. Através da estimulação por movimentos oculares – passar os dedos à frente dos olhos do paciente mas também às variantes, como tocar com os dedos nos joelhos ou ombros – aciona-se o mecanismo fisiológico que vai ativar o sistema de processamento de informação no cérebro. A ideia, aqui, é pegar num apontamento disfuncional do passado e reprocessá-lo, transformando-o em algo que pode ser útil. É uma técnica rápida, que pode ser aplicada em poucas sessões (uma média de seis, mas depende do caso).” É indicada sobretudo para transtornos de ansiedade e stresse pós-traumático e é completamente compatível com outras psicoterapias.
FITOTERAPIA E SUPLEMENTOS NATURAIS
“O hipericão funciona muito bem em casos de depressão. Existe ainda um suplemento natural, conhecido como 5HTP (hidroxitriptofano), que ajuda a normalizar a serotonina.” Tanto um como outro não devem ser tomados se está a ser medicada com antidepressivos. Este último ajuda sobretudo em casos de depressão, ansiedade e insónia, atuando positivamente na regulação do humor. “Existem suplementos de melatonina que ajudam a regular os ciclos de sono. É o que pilotos e pessoal de voo tomam para combater o jet lag. E uma boa higiene do sono é essencial para combater a depressão.” A melatonina, que é naturalmente produzida pelo nosso organismo, tem, entre outras funções, a de equilibrar as horas de sono e de vigília.”
MEDITAÇÃO E EXERCÍCIOS DE RELAXAMENTO
Os benefícios da meditação em casos de depressão estão sobejamente estudados. Em 2010, dois estudos das Universidades Charles Drew, de Los Angeles, e do Havai, mostravam que os praticantes de meditação transcendental reduziam substancialmente sintomas de depressão, quando comparados com os resultados dos grupos de controle. O treino de nos abstrairmos dos pensamentos, sobretudo dos negativos, que é necessário a esta técnica, acaba por induzir os seus seguidores a um estado de maior paz e relaxamento interior e é uma forma eficaz de combater a ansiedade. “Fazer meditação é um bom investimento para a saúde”, diz Margarida Casimiro.
Mas os exercícios de relaxamento também são uma ferramenta importante para reduzir a ansiedade. “Adequamos o guião dos exercícios de relaxamento à vida da pessoa. Se ela gosta de ar livre, pode imaginar que passeia numa praia, numa montanha, num balão de ar quente… É um ‘faz de conta’ em que integramos elementos que fazem parte daquilo que ela gosta, locais ou situações onde se sinta segura, confortável e divertida. A meditação não tem de ser por supressão absoluta de estímulos; pode ser dinâmica – podemos até fazê-la andando numa sala, enquanto ouvimos música.”