O mundo mudou. E nós mudámos com ele. De um dia para o outro, muito do que nos parecia indispensável passou a ser supérfluo. Obrigadas a parar, tivemos tempo para pensar no que é realmente essencial para nos sentirmos bem e bonitas. E percebemos que, na verdade, não precisamos de muito: bom, sim; eficaz e agradável de usar, também; mas não muito.
As rotinas de beleza de inspiração coreana, que invadiram o mundo da cosmética nos últimos anos, com a sua dupla limpeza da pele e um cortejo de loções, séruns, óleos, leites, cremes e máscaras, sobrepostos segundo uma ordem sacramental (o famoso ‘layering’), e a demanda quase desenfreada do último ingrediente miraculoso capaz de nos devolver a juventude perdida a qualquer preço, estão a dar lugar a uma nova forma de encarar a beleza. Mais calma, mais simples (mas não simplória), mais respeitadora da pele e do ambiente, sofisticada no seu minimalismo, e tendo como mote ‘menos é mais’.
No guarda-roupa estamos a (re)descobrir as virtudes de ter, em vez de milhentas coisas compradas sem pensar e que na verdade nem nos ficam assim tão bem, meia-dúzia de peças de grande qualidade, para as quais tivemos de poupar durante meses, mas que nos fazem sentir fantásticas sempre que as usamos. E na beleza, com as devidas adaptações, está a acontecer o mesmo. Os princípios do movimento slow não andam longe…
Regresso ao essencial
A tendência para simplificar começa a fazer-se sentir na cosmética a vários níveis: nas gamas, nas fórmulas, nos rituais de cuidado da pele. Depois do frenesim da experimentação e da acumulação de produtos (de que a pele tantas vezes reclama), apetece regressar à rotina básica de limpar, equilibrar e proteger do sol, com produtos adequados e que nos dão prazer. É nessa frugalidade consciente e escolhida que está o verdadeiro luxo. E quando quisermos acrescentar-lhe mais um passo, como um sérum ou uma máscara, iremos fazê-lo de forma mais pensada e esse gesto será ainda mais eficaz. Com a valorização da singularidade e da beleza interior, a cosmética passa a ser não um artifício, mas um apoio, um ato de cuidado pessoal e um gesto de autoestima.
Onde antes se procurava estimular a pele ao máximo, correndo muitas vezes o risco de a agredir e sensibilizar, agora há cada vez mais marcas a usar ativos cujo objetivo é ajudar a pele a desempenhar ela própria as suas funções naturais. Os novos ingredientes estrela são substâncias que existem naturalmente na pele, que têm uma grande afinidade com ela e com as quais ela convive pacificamente: é o caso do ácido hialurónico que, apesar do nome um pouco assustador, é um doce de criatura e um verdadeiro super-herói da hidratação e redensificação. A procura de harmonia com a natureza, de que somos parte integrante, tem levado à descoberta de ativos vegetais ou marinhos, recolhidos de forma sustentável e tratados (o mínimo possível, que é outra tendência) por processos não poluentes.
Ter o máximo com o mínimo
Outra grande tendência deste movimento de simplificação são as fórmulas curtas, com poucos ingredientes, para aumentar a sua tolerância e inocuidade. As fórmulas minimalistas são especialmente importantes quando falamos de cuidados para peles reativas e sensíveis, que infelizmente são cada vez mais comuns devido ao stresse em que vivemos, às agressões ambientais e até ao uso inadequado de cosméticos. Estas fórmulas contêm entre meia e uma dúzia de ingredientes, às vezes mesmo um único ingrediente (é o caso dos óleos vegetais, como o de argão, o de rosa mosqueta, o de grainha de uva ou o de amêndoas doces, que está a ter um novo momento de glória). Mas isso não as impede de serem eficazes.
Um dos segredos para conseguir essa eficácia é usar ingredientes multifacetados, que consigam desempenhar mais de uma função na pele. Um bom exemplo é a vitamina C, que além de antioxidante, tem uma ação ligeiramente aclaradora (interessante para diminuir a intensidade das manchas e dar luminosidade à tez) e estimula a produção de colagénio. E mesmo nas fórmulas tradicionais, a tendência é a redução dos ingredientes: enquanto um sérum clássico pode ter entre 27 a 39, e um creme pode chegar aos 60, a demanda atual dos formuladores de cosmética é conseguir uma eficácia igual ou superior reduzindo o número de ingredientes utilizados.
Acrescentar ingredientes a uma fórmula não a torna necessariamente mais eficaz, pelo contrário: se a fórmula estiver apinhada, dificilmente se conseguirá garantir uma concentração de cada ativo suficientemente alta para ser eficaz.
As leis da transparência
Tal como queremos saber o que ingerimos, também queremos saber o que estamos a colocar na nossa pele. E quanto menos produtos usamos, mais importante é saber o que contêm para poder escolhê-los bem, com os ativos certos para o que a pele precisa no momento. Tradicionalmente, os ingredientes de um cosmético apareciam numa zona obscura da embalagem e num corpo de letra tão minúsculo que só se lia com lupa. E quando finalmente conseguíamos ler a lista… o que eram exatamente aqueles ingredientes? Agora há cada vez mais marcas a colocá-los nas embalagens de forma visível e legível, explicando a função de cada um. As marcas ‘clean’ costumam também indicar os ingredientes que não contêm, como silicones ou óleos minerais. E apps como a ‘Clean beauty’ permitem scannar a lista de ingredientes e perceber o que cada um faz na fórmula.
Usar menos, mas melhor
Esta é a ideia. Melhor, não necessariamente no sentido de mais caro, mas bem adaptado à pele e às suas necessidades. Uma rotina de beleza simplificada e minimalista evoluirá naturalmente ao longo do ano e ao longo da vida, porque ainda que os gestos continuem a ser os mesmos três ou quatro básicos, os produtos podem (e devem) ir mudando de acordo com a evolução da pele. E a simplicidade deixa até espaço para se acrescentar mais um gesto, e mais um produto, de vez em quando, se se justificar… ou simplesmente apetecer.