Decidi dar uma oportunidade ao LinkedIn, apesar de trabalhar numa área de prosperidade desmedida. Portanto, dei uma voltinha só para ver as vistas, como alguém que veste alta costura e vai ver as montras do pronto a vestir para não perder o pé à realidade do povo. Dei logo de caras com ‘alguém’ a pedir dinheiro para eu poder cuscar perfis à vontade sem ser apanhada. Ser um bisbilhoteiro premium, o sonho! A primeira pessoa que desfilou no feed foi alguém que estava a começar um novo emprego. “O Silva está a começar um novo cargo como CEO da Projetos Silva”. Portanto o Silva não só fala de si na terceira pessoa como é CEO de uma empresa onde é o único colaborador.
Como diz aqui a minha colega do lado, agora já não há trabalhadores. Porque já ninguém trabalha, as pessoas empreendem. Somos todos managers ou partners. Se os homens do lixo estivessem no LinkedIn seriam certamente Garbage Directors e com toda a legitimidade contextual. Até Philip Kotler, o pai do marketing, ficaria chocado com a nossa capacidade de enaltecer atributos pessoais, tão à frente que já deu a volta para recair no conceito de banha da cobra. Acaba por não ser muito diferente das selfies das influencers, só que em vez de ‘olha eu com esta roupa que me ofereceram e que não tarda está na Vinted’ é ‘olha eu, Master of the Universe, com todos estes skills e connections a citar o New York Times’.
No outro dia vi um anúncio de emprego para qualquer coisa que não percebi mas com que o algoritmo do LinkedIn me fez questão de emparelhar – é isso, somos uma espécie de coluna wifi em andamento e estão
sempre a tentar emparelhar-nos com dispositivos nas proximidades. Os atributos requisitados para preencher a vaga vinham encriptados com siglas indecifráveis, como se eu tivesse estado em Marte nos últimos 20 anos. Enviei a lista para uma amiga que me garantiu que eu sabia fazer aquilo tudo e muito mais. O quê? Eu sei trabalhar em AVCDM e dominar a linguagem KPBNT? OMG! Tudo isto me faz lembrar o sketch ‘Língua Portuguesing’, da série Fonseca dos Gato Fedorento, só que em versão atualizada.
Em terras de CEOs, CFOs e COO’s confesso que, na minha incursão pelo LinkedIn, me senti mais um UFO. Uma espécie de objeto não identificado. Não sou velha nem sou nova, não sou especialista em nada sonante – gosto de contar histórias mas não tenho pinta de storyteller – e não sou co-founder de coisa nenhuma, apenas de dois filhos que tão cedo não vão atingir o break-even (também sei falar inglês, pensam o quê?)
A minha sorte, no meio disto tudo, é que realmente não preciso de frequentar os corredores desta virtuosa rede social, pois continuo a ser a mulher do papel.