matemática.jpg

Getty Images/iStockphoto

A cena pode ouvir-se em qualquer escada de qualquer prédio com crianças: por todo o país há pais enervados, filhos cansados e trabalhos de casa que precisam de ser feitos. Mas, afinal, os TPC não são necessariamente um drama. Já que eles existem, qual a melhor maneira de os fazer? Pedimos ideias a professores, explicadores e pais de família, e ouvimos ainda a experiência de quem decidiu pôr-se no lugar dos filhos.

Perceba para que servem – Os trabalhos de casa existem acima de tudo para criar hábitos de trabalho e ensinar o aluno a estudar sozinho, coisa que não se aprende na escola. “O trabalho de casa deve ser pouco e resumir aquilo que foi dado na aula”, defende Flávia Freire, professora de Matemática e Ciências da Natureza ao 5.º e 6.º ano. “Se os alunos trabalharam bem numa aula, eu não lhes passo trabalhos. Mas se vejo que não estiveram com atenção, obrigo-os a esforçarem-se mais um pouco.”

Adeque o método a cada criança – “O que funciona com uma criança pode não funcionar com outra”, nota Flávia. “Eu tenho 3 filhos e a mais velha precisou de mais acompanhamento. Às vezes, basta a mãe estar perto para tirar uma dúvida pontual.” 

‘Despache’ os trabalhos assim que possível – Os trabalhos devem ser a primeira coisa a ser feita assim que se chega da escola, para eles terem tempo de fazer outras coisas. 

Ajude a concentração – “O estudo deve ser feito numa zona sem distrações”, aconselha Anabela Sousa, do Centro de Explicações Contra-Negas. “As crianças aprendem por repetição, treinando a concentração e a memória, e precisam de sossego para o fazer. Nós também tínhamos dificuldades. Mas eles têm muito mais distrações e estímulos. Por isso insisto em retirar telemóveis, fechar computador, apagar televisão.”

Ensine-os a estudar, torne o estudo efetivo, em vez de estarem a bezerrar para cima das páginas sem fixarem nada. “É fácil”, ensina Flávia Freire: “Peça-lhe para resumir em voz alta ou por escrito o que aprendeu, para se habituar a fixar a matéria.” 

 

Conseguimos ser pais-professores?

O maior conselho: seja um facilitador em vez de um opositor. “Um dos maiores problemas é o grau de exigência que impomos aos filhos”, nota Anabela Sousa. “Pais que foram bons alunos têm imensa dificuldade em ensinar os filhos, e os TPC passam a ser o terror que não são. Muitas vezes, os pais queixam-se de falta de tempo, mas não se trata disso: começam a enervar-se, passam para os trabalhos uma energia negativa, a criança começa a rejeitar aquela situação e bloqueia a capacidade de aprender.” Ou seja, se os TPC forem vistos como uma ameaça à sua autoestima, ele não vai aprender nada…

“Muitas vezes, o acompanhamento dos pais até era melhor que não existisse”, concorda Flávia Freire. Até porque a forma como o pai aprendeu já não se aplica. “Se o professor ensina de uma maneira e o pai de outra, o aluno fica bloqueado.” Então, o que é que eu posso fazer se aprendi de outra maneira, se me enervo ou não percebo nada de matemática? “Pode estar simplesmente ao pé dele, verificando se está a estudar”, aconselha Flávia. “Ou pedir-lhe a ele que o ensine… Não calcula a quantidade de filhos que ensinam os pais, e isso também é uma forma de aprenderem.” Pedir o apoio de um explicador pode ajudar muito. Mas numa coisa todos estão de acordo: fazer os trabalhos pelo filho é que não ajuda nada. “Mais vale o aluno levar a dúvida e expô-la ao professor no dia seguinte”, adianta Anabela. “E não apressem: estar um pai com uma criança já cansada ainda a dizer-lhe ‘anda lá que daqui a 10 minutos temos de ir jantar’ é contraproducente. Mais vale fazer só o que conseguir.” Até porque a ajuda contraria o objetivo do TPC: desenvolver a autonomia. 

“Tenho alunos a apresentarem-me trabalhos com letra de outra pessoa”, ri Flávia. Não fazer os trabalhos de vez em quando é um drama? “Para mim, não é mesmo. Quando eles são interessados, os TPC são apenas um reforço do trabalho feito na aula.” 

 

Defenda-se dos mini-manipuladores

Os pais devem orientar mas não devem ser uma ‘muleta’: “Podem estar ali apenas para ajudar pontualmente”, nota a professora Flávia. “O ideal dos TPC é criar uma rotina e hábitos de estudo que tornem os filhos cada vez mais independentes.” O que pode exigir algum esforço da parte dos… pais. “Comecei a enervar-me com o tempo que a minha filha demorava a fazer os trabalhos”, conta Ana Rita Matos, mãe da Luísa, 7 anos. “Eu sentava-me ao lado dela enquanto fazia os trabalhos e stressava porque ela só escrevia uma linha quando era suposto escrever 4 ou 5. Fui falar com a professora e disse-lhe que estava preocupada, porque a Luísa não conseguia estruturar mais que uma ideia. A professora estranhou e mostrou-me um texto de 10 linhas escrito por ela.” 

Ana Rita percebeu que tinha de tomar uma decisão. “Quando cheguei a casa, falei com ela, disse-lhe que a partir desse dia iria fazer os trabalhos sozinha, que eu ficaria na sala e estaria sempre pronta a ajudá-la, mas seria ela a fazer os TPC sozinha e com tempo limitado.” Porque é que tomou esta decisão? “Percebi que aquilo que a Luísa fazia comigo era manipulação pura e dura. Ela ‘encostava-se’ a mim para eu trabalhar com ela. O único problema é o tempo que ela tem para completar as tarefas. Mas paciência. Se não conseguir escrever 10 linhas, escreve 5. Outra coisa que comecei a fazer, quando vejo que ela está apática ou cansada, foi dar um passeio. Vai arejar, volta mais fresca e trabalha muito melhor.”

 

Quando os professores exageram

Afastar-se nem sempre funciona. ‘Os Trabalhos de Casa da Minha Filha Estão a Matar-me”, anunciou o jornalista americano Karl Greenfeld, na newsmagazine ‘The Atlantic’. 

Indignado com a quantidade de trabalhos que a filha de 13 anos trazia, Karl decidiu passar uma semana a fazer ele próprio os trabalhos dela. Concluiu que levava todos os dias mais de três horas de trabalho extra para casa. O método é original, a conclusão não tanto. Em Portugal, já o pediatra Mário Cordeiro e o psicólogo Eduardo Sá consideraram os TPC em excesso “uma agressão às crianças e aos seus direitos”.

O artigo de Greenfeld foi uma bomba nos EUA, e também fez pensar alguns pais portugueses. Foi o caso de Júlia B., tradutora, mãe da Beatriz, 12 anos, e do Miguel, 7, que se reviu no artigo americano. “Isto é um problema mundial: pensa-se que é preciso melhorar os resultados da escola com mais trabalho, mas vai haver um ponto em que vão reparar que isso não é a resposta, e já estamos nesse ponto. Se eu tenho um burro e lhe dou uma chibatada, ele anda mais depressa. Dou-lhe duas, e ele apressa-se. Mas se lhe der 100, mato o burro! Não é pondo crianças a trabalhar 12 horas por dia, coisa que aos adultos é proibida pelo Código de Trabalho, que vamos conseguir alguma coisa!”

O artigo da ‘Atlantic’ foi um espelho da experiência que a própria Júlia fizera há uns tempos com Beatriz. “Por um dia, resolvi fazer eu os TPC da minha filha. Demorei uma hora. Ora, se eu tenho mais 30 anos que a minha filha, uma licenciatura e um mestrado, demoro uma hora, quanto é que uma criança de 7 anos não demora?”

O dia a dia estava a tornar-se um drama: “O Miguel era pequenino e toda a família estava refém dos trabalhos da Beatriz! Percebo o enorme stresse a que os professores estão sujeitos: têm turmas sem fim e uma pressão brutal para cumprir programas incomportáveis. E não sou de maneira nenhuma contra os TPC. Tem é de haver limites.” 

O drama da Beatriz repetiu-se com o Miguel: “Um dia, enchi a paciência. Ele trazia mais de quatro páginas de exercícios e mais duas folhas para escrever. Então eu disse ‘Fazes as quatro páginas, e mais não fazes’. Escrevi na caderneta que achava uma quantidade de trabalhos excessiva, e sempre que se voltasse a repetir o excesso, eu voltaria a repetir a medida.” A cena passou-se depois de muitos encontros com a professora, em que ambas expunham civilizadamente os seus pontos de vista e nada mudava. “Tive o cuidado de pôr o Miguel fora daquilo: não lhe disse que ela era má professora, só disse que tínhamos um entendimento diferente da situação. E a professora diminuiu a quantidade de trabalhos, pela primeira vez em muitos anos.”

 

Ideias S.O.S.

– Ajude-o a organizar-se com um calendário de parede.

– Pode ‘estudar’ com ele: trabalhe nas suas coisas ao pé dele enquanto faz os TPC.

– É possível recrutar a ajuda de um avô? Estão mais disponíveis e enervam-se menos. – Evite os gritos: tente perceber onde ele tem mais dificuldades e encontrar ajuda efetiva: um irmão, um explicador… – Visite alguns sites úteis, como quadroegiz.com; fichasprimeirociclo.no.sapo.pt, omeuprofessor.com. 

– Habitue-o a fazer as tarefas mais difíceis primeiro. Ensine-o a não ter medo de errar. Faz parte do processo de aprender.

– Elogie e recompense: uma piza, uma ida ao cinema…

 

Quanto tempo os TPC devem demorar?

5-7 anos: 1 hora por semana

7-9 anos: 1,5 hora por semana

9-11: 30 minutos por dia

11-13: 45/90 minutos por dia

13-14: 1,5 hora por dia

14-16: 1,5 a 2,5 horas por dia

Relacionados

Mais no portal

Mais Notícias

Os gadgets que vão marcar este ano

Os gadgets que vão marcar este ano

Maria Teresa Horta (1937 - 2025) - Corpo a corpo com a linguagem

Maria Teresa Horta (1937 - 2025) - Corpo a corpo com a linguagem

Vencedores e vencidos do 25 de Abril na VISÃO História

Vencedores e vencidos do 25 de Abril na VISÃO História

O que muda a partir de hoje nas regras do IVA

O que muda a partir de hoje nas regras do IVA

Citroën C3 conquista o título de Carro do Ano 2025 em edição marcada pela eletrificação

Citroën C3 conquista o título de Carro do Ano 2025 em edição marcada pela eletrificação

'Bora dançar hip hop?

'Bora dançar hip hop?

Princesa Eugenie celebra 35.º aniversário na companhia dos filhos

Princesa Eugenie celebra 35.º aniversário na companhia dos filhos

Cláudia Vieira de volta ao trabalho:  “Belisco a vida social e o tempo para mim”

Cláudia Vieira de volta ao trabalho: “Belisco a vida social e o tempo para mim”

CARAS Decoração: novidades de exterior que convidam à vida ao ar livre

CARAS Decoração: novidades de exterior que convidam à vida ao ar livre

Teatro: 'A Família Addams - o musical'

Teatro: 'A Família Addams - o musical'

CARAS Decoração: bar de vinhos com nova morada

CARAS Decoração: bar de vinhos com nova morada

VOLT Live: Ionity vai abrir hubs em Albufeira e nas grandes cidades

VOLT Live: Ionity vai abrir hubs em Albufeira e nas grandes cidades

Casos de sarampo a aumentar nos Estados Unidos (e também na Europa), no maior surto da doença em quase 30 anos

Casos de sarampo a aumentar nos Estados Unidos (e também na Europa), no maior surto da doença em quase 30 anos

Sangue novo e diálogos intergeracionais nas galerias Francisco Fino e Kubickgallery

Sangue novo e diálogos intergeracionais nas galerias Francisco Fino e Kubickgallery

25 peças para receber a primavera em casa

25 peças para receber a primavera em casa

Pimpinha Jardim anuncia separação de Francisco Spínola após 20 anos juntos

Pimpinha Jardim anuncia separação de Francisco Spínola após 20 anos juntos

Caras conhecidas à procura de um verão com estilo

Caras conhecidas à procura de um verão com estilo

Sede da PIDE, o último bastião do Estado Novo

Sede da PIDE, o último bastião do Estado Novo

Descoberta revolucionária sobre a doença de Parkinson pode abrir caminho a novos tratamentos

Descoberta revolucionária sobre a doença de Parkinson pode abrir caminho a novos tratamentos

Um novo estúdio em Lisboa para jantares, showcookings, apresentações de marcas, todo decorado em português

Um novo estúdio em Lisboa para jantares, showcookings, apresentações de marcas, todo decorado em português

Monstra: Sete sugestões no Festival de Animação de Lisboa

Monstra: Sete sugestões no Festival de Animação de Lisboa

Desfile de elegância e ousadia na semi-final dos “International Emmy Awards” em Portugal

Desfile de elegância e ousadia na semi-final dos “International Emmy Awards” em Portugal

Xiaomi Watch S4 em teste: Tem estilo e é confortável

Xiaomi Watch S4 em teste: Tem estilo e é confortável

Os paradoxos do mercado de trabalho português

Os paradoxos do mercado de trabalho português

Carregar 2 km de autonomia por segundo: conheça a tecnologia da BYD

Carregar 2 km de autonomia por segundo: conheça a tecnologia da BYD

Filha transgénero de Naomi Watts e Liev Schreiber desfila pela primeira vez em Paris

Filha transgénero de Naomi Watts e Liev Schreiber desfila pela primeira vez em Paris

Em

Em "A Promessa": Laura e Tomás ficam presos na câmara frigorífica

CARAS Decoração: a nova 'provocação' assinada pelo artista chinês Ai Weiwei

CARAS Decoração: a nova 'provocação' assinada pelo artista chinês Ai Weiwei

A Natureza Como Arquiteta do Futuro: Construindo Cidades Resilientes

A Natureza Como Arquiteta do Futuro: Construindo Cidades Resilientes

Hyundai Santa Fe PHEV: Num outro patamar

Hyundai Santa Fe PHEV: Num outro patamar

Relatório: Empresas podem perder até 25% das receitas devido às alterações climáticas - mas também há dinheiro a ganhar

Relatório: Empresas podem perder até 25% das receitas devido às alterações climáticas - mas também há dinheiro a ganhar

Sonhar ilhas entre a ficção e a investigação científica

Sonhar ilhas entre a ficção e a investigação científica

A doce febre da tarte de queijo basca

A doce febre da tarte de queijo basca

Guia de essenciais de viagem para a sua pele

Guia de essenciais de viagem para a sua pele

Soluções do teste 'Conheces o teu planeta?'

Soluções do teste 'Conheces o teu planeta?'

Quantos mortos até ao final século devido a temperaturas extremas? Dados oferecem resposta avassaladora: 2,3 milhões só nas cidades europeias

Quantos mortos até ao final século devido a temperaturas extremas? Dados oferecem resposta avassaladora: 2,3 milhões só nas cidades europeias

Bigscreen Beyond 2: Estes óculos VR pesam apenas 107 gramas e têm lentes micro-OLED

Bigscreen Beyond 2: Estes óculos VR pesam apenas 107 gramas e têm lentes micro-OLED

Volkswagen Autoeuropa vai mesmo produzir o carro elétrico mais acessível da marca

Volkswagen Autoeuropa vai mesmo produzir o carro elétrico mais acessível da marca

O perigo por detrás do consumo de granizados pelos mais pequenos

O perigo por detrás do consumo de granizados pelos mais pequenos

Bárbara Branco e José Condessa em cenas eróticas em

Bárbara Branco e José Condessa em cenas eróticas em "O Crime do Padre Amaro"

Salgueiro Maia, o herói a contragosto

Salgueiro Maia, o herói a contragosto

8 ideias grátis para celebrar o Dia Mundial da Poesia

8 ideias grátis para celebrar o Dia Mundial da Poesia

Luís Buchinho celebra 35 anos de carreira com coleção inovadora

Luís Buchinho celebra 35 anos de carreira com coleção inovadora

As datas das matrículas para o próximo ano letivo

As datas das matrículas para o próximo ano letivo

MACAM abre portas com três dias de festa

MACAM abre portas com três dias de festa