“Vai fazer a cama do teu irmão!”
É uma frase que todas as raparigas recordam, embora se fale muito de lutar contra os estereótipos. Parece deter o recorde de frase mais resistente ao tempo: dos 50 aos 12, é raríssima a mulher que não a ouviu, e ainda mais rara a que não se ressentiu disso. Era – e é – ouvida em todos os lares, mesmo os habitados por pais e mães feministas. Seria aparentemente inócua se também existisse em sentido inverso, mas nunca se ouviu falar de um rapaz a quem foi dito ‘vai fazer a cama da tua irmã’. Quando se protestava, a resposta era: a) ‘Não sejas assim!’, seguido de franzir de sobrolho que indicava que se continuássemos assim o futuro seria negro, ou b)‘Hás de ir longe com esse mau feitio!”, ou, ainda pior, c) “Pronto, deixa estar, faço eu!”, com cara de mártir furiosa. Resultado: acabávamos sempre a fazer o raio da cama, porque era mais prático que ter de aturar uma mãe amuada.
“Não ligues, que ele é rapaz”
Outro clássico. As meninas têm de ser pacientes e sofredoras, os rapazes podem fazer o que quiserem… Curiosamente, a opção do ‘não ligues’ também é aquela que dá menos trabalho às mães… E quando se trata de educar raramente os pais estão presentes.
“Esse não é o teu corredor”
Voltamos à ideia do azul e cor-de-rosa, e dos ‘corredores’ cheios de brinquedos de guerra para rapazes e futilidades de moda para meninas. Os rapazes constroem naves espaciais, as meninas vão às compras. “Uma tarde, fui buscar o meu filho ao infantário”, conta a irlandesa Kathlyn, mãe de Noah, no blog parentingonthefrontline.blogspot.com. “E ouço a educadora dizer, observando as roupas dos alunos: ‘Um mar de azul, um mar de rosa, e o Noah no meio’. Nesse momento, percebi que a sociedade está a transformar os nossos filhos em clones uns dos outros. Por muito que eu tente evitar as expectativas que a sociedade lhe impõe enquanto rapaz, sei que esta é uma batalha que não posso travar sozinha, nem posso querer transformá-lo num indivíduo à custa de o isolar dos amigos.” Conta como o filho já recusa certas atividades só porque é suposto serem ‘para meninas’. “Nos anos, oferecem-lhe coisas do Bob o Construtor ou locomotivas. Nunca passaria pela cabeça de ninguém oferecer-lhe um serviço de chá, mesmo que ele adore piqueniques.” Solução? “Continuar a expô-lo a tanta diversidade quanto possível, tentando que viva a vida consoante o seu entusiasmo, sem estar preocupado a pensar se aquilo é ou não ‘coisa de rapaz’…”
“Podias ir adiantanto o jantar…”
Ou ‘tomas conta dos teus irmãos?’ Tudo o que seja tarefa doméstica continua a cargo das raparigas. Também é raro que se diga a um rapaz qualquer coisa do estilo ‘podes ir ver a avó ao lar?’ Quem é suposto cuidar da família são as mulheres, e os filhos seguem os estereótipos familiares. Quem trata dos mais velhos são as mulheres, quem vai buscar as crianças à escola são as mulheres, e quem sai mais cedo do trabalho se a criança parte uma perna na escola nunca é o pai… Queremos que a nova geração seja diferente, que as meninas cheguem a presidentes ou a diretoras de empresa se quiserem, que os rapazes sejam estilistas ou cabeleireiros se quiserem (bem, aqui não é assim tão simples, mas lá chegaremos), mas no dia a dia longe destes lugares comuns aspiracionais continuamos pouco diferentes dos nossos avós. Segundo um estudo da Universidade de Calgary, no Canadá, hoje as famílias continuam organizadas quase nos mesmos moldes que no passado, com as mulheres no papel de organizadoras e os homens como ajudantes.
“Cor-de-rosa é para as meninas”
Algumas meninas (não todas) passam por uma fase, à volta dos 4 anos, em que tomam súbita consciência do género a que pertencem, e querem demonstrá-lo ativamente adotando os sinais exteriores que entendem como símbolos culturais desse género. Daí a ‘febre’ do cor–de-rosa que se apodera de tanta menina. Isto pode ser um processo natural e saudável, ou imposto de fora. O que os pais devem fazer não é negar-lhe mais vestidos cor-de-rosa, mas deixá-las chegar naturalmente a esta decisão depois de vestirem muitos azuis, vermelhos e verdes. Ou seja, não lhes impor o cor-de-rosa, mas não o negar. E perceber que não é para sempre…
“As meninas é que brincam com bonecas…”
Não são só as raparigas as ‘vítimas’ da diferença de educação. Como nota a ativista Gloria Steinem: “Já começámos a educar as raparigas mais como rapazes, mas ainda muito pouca gente tem coragem para educar os rapazes mais como raparigas.” Hoje, se vemos um rapaz brincar com bonecas, a tendência ainda é para o desviar em direção aos Action Men (principalmente os pais, e os rapazes são muito sensíveis à opinião dos pais). O mito ‘se ele brincar com bonecas vai ficar gay’ é isso mesmo: um mito. Ninguém ‘fica’ nada (a não ser preconceituoso e infeliz). Ou seja, explica a americana Arwin, mãe a tempo inteiro e autora do site www.raisingmyboychick.com: “Não podemos controlar, adivinhar ou mudar a sexualidade dos nossos filhos. Podemos educar filhos ‘gay’ que sejam confiantes e filhos ‘hetero’ que sejam aliados, sem assumir o que quer que seja sobre a sua sexualidade até que nos digam.” Ah, já agora, um estudo publicado no site www.huffingtonpost.fr provou que os bebés até aos 6 meses preferiam os mesmos brinquedos sem qualquer diferença de género ou cor (curiosamente, todos os bebés preferiam brincar com bonecas…)
“Os rapazes são melhores a matemática”
“Embora o campo da matemática e das ciências ainda seja dominado por homens”, nota o site www.education.com, “as raparigas já se sentem iguais aos seus colegas rapazes em matemática e ciências.” Problema: ao contrário do que se pensa, é exatamente o oposto: os rapazes continuam a sentir-se inferiores em línguas e humanidades. Ou seja, preocupámo-nos em dar confiança às raparigas no campo científico, mas com as falhas dos rapazes ninguém se preocupou… “Tudo indica”, nota o site, “que deixámos os rapazes para trás quando os educámos para acreditar que eram inferiores em línguas
e artes, e que o teatro, a poesia, a dança e a música eram coisas de mulher…”