Foto Pexels/Andrea Piacquadio

Quem passa tempo com os pais? Ou com os avós depois dos 15 anos? Chegámos a uma triste conclusão: pouca gente. Aliás, houve quem assumisse mesmo “passo mais tempo com o meu gato do que com a minha mãe…” Muitas vezes, o tempo que se passa com os pais é… o possível. Aquele bocadinho ao fim-de-semana pode parecer pouco, mas é uma dádiva tanto mais preciosa quanto arrancada a tempo que muitos gostariam e precisariam de aproveitar para si próprios. “Os casais vivem ensanduichados entre os pais e os filhos, e se não têm cuidado, deixam de ter vida própria”, alerta Isabel Porto, 47 anos, filha de pais muito carentes, nora de sogros igualmente carentes, e mãe de um rapaz com 15 anos. “Na nossa família, costumávamos ir almoçar com os meus sogros aos sábados, com os meus pais ao domingo. Era extenuante! Ficaram só os almoços de sábado, mas por vontade dos meus sogros passávamos os fins-de-semana atrelados uns aos outros, em almoços, passeios e lanches. Se permitíssemos, não teríamos tempo para reunir com amigos, ir ao cinema, dar os nossos próprios passeios.”

Com a mãe recentemente operada a um cancro da mama, Isabel deu-lhe apoio a tempo inteiro, mas afirma que ela não perdeu o seu espírito independente, e ri-se da ‘ginástica’ que é preciso fazer com as ‘manias’ maternas: “Ela queixa-se que não lhe damos atenção, mas nem sempre aceita um convite para jantar, ‘porque depois deita-se tarde’. Raramente telefona, mas se nós não lhe telefonamos, amua, ‘que não lhe ligamos nenhuma’!” E o filho? Será que lhe vai dar o mesmo apoio quando ela própria chegar a velha? Isabel duvida: “Por enquanto, acha um frete sair com pais e avós. Faz parte de um crescimento saudável, suponho. Não creio que me deixasse abandonada, mas parece-me óbvio que não terá a mesma disponibilidade para andar connosco ao colo todos os fins-de-semana.”

Reinvente as tertúlias

“Sei que às vezes pareço mãe da minha mãe”, afirma Ana Marta Lima, de 36 anos. “Ela é uma mulher independente, divorciou-se e tornou a casar-se, mas não resisto: se calhar por ser stressada, ligo-lhe constantemente para saber se comeu, se dormiu, se chegou bem a casa. Sou ainda mais chata com a minha mãe do que com a minha filha, por não a ter constantemente debaixo de olho.” Tempo com a mãe? Conta que, com alguma ginástica, consegue juntar as três ao sábado mãe, avó e neta e vão passear para o paredão da praia ou tomar chá a qualquer sítio.

Afirma rindo que, ao contrário da maioria das pessoas, ela é que insiste com a mãe para saírem juntas. “Acho que é por isso que, ao contrário das mães das minhas amigas, nunca a ouço ‘melgar-me’, nunca a ouço queixar-se de que não lhe ligo nenhuma.” Ri e deixa um conselho para quem tem mães queixosas: “Melguem-nas vocês. Em quatro dias, vão vê-las arranjar uma vida independente!” Estar com a mãe continua a ser um prazer, mas afirma que a grande maioria das suas amigas não a compreende. “Todos os Verões, vou passar uns dias de férias com a minha mãe. Pois todas as minhas amigas acham estranhíssimo! Mas a maioria delas tem mães com as quais eu não gostaria de passar nem dois minutos, quanto mais umas férias…”

Segundo Ana, as pessoas não passam mais tempo com os pais simplesmente porque se desabituaram de ter vida social seja com quem for. “As pessoas não passam tempo com os pais assim como não passam tempo com os amigos. A vida social delas resume-se aos filhos e ao marido. Não pode ser, é uma pobreza mental!” E conclui: “Temos de começar a investir mais nos outros. No tempo dos meus pais havia tertúlias, as pessoas juntavam-se em casa umas das outras. Por que não voltar a fazer isso?”

Use as novas tecnologias

‘Tempo com os pais’ assume, hoje em dia, diferentes formas de se pôr em prática. As relações modernas entre pais e filhos passam sobretudo pelo telefone ou mesmo, pós-pandemia, pelo zoom.

“Adoro o meu pai”, conta Susana Neves, 44 anos, uma filha-modelo desde que a mãe morreu, tinha ela 15 anos. “Mas ele vive em Trás-os-Montes e eu em Lisboa. Solução: telefono-lhe todos os dias. Muitas vezes basta esse tipo de pequenos cuidados para que as pessoas se sintam acompanhadas.” E por que não ir além do telefone? Afinal, nesta era tecnológica, já não há desculpa para ninguém se sentir separado de quem ama. “A minha mãe tem os três netos nos Estados Unidos”, conta Leonor, 35 anos. “E fala com eles todos os dias por Skype. Dei-lhe um computador, ofereci-lhe uma webcam e, claro, ensinei-a a funcionar na internet, mas ela aprendeu surpreendentemente depressa.”

Esqueça a crítica

Experimente fazer o seguinte exercício: feche os olhos e imagine-se (mais) velha. Conseguiu? Parabéns! É que este é dos exercícios psicológicos mais difíceis de realizar. “As pessoas têm imensa dificuldade em imaginar-se a elas próprias velhas, e é por isso que acham tão deprimente estar com os mais idosos”, afirma Alexandra Pinheiro, 45 anos.
“Quando eu estudava, uma professora costumava colocar-nos de olhos fechados a imaginar-nos velhos. Houve pessoas que não conseguiram fazer esse exercício. Temos imensa dificuldade em colocar-nos no lugar do outro. E é isso que eu acho que está a falhar hoje em dia, seja pelo nosso avô seja por um desconhecido: o respeito pelo outro.” O que se agrava quando o ‘outro’ tem mais idade. “Vivemos na cultura da juventude, ninguém quer ser velho. Evita-se a própria palavra ‘velho’, como se fosse um insulto, quando devia ser uma palavra que qualifica.”

As pessoas vivem cada vez mais? “Mas continuam com muito poucos apoios. Cada vez temos mais tempo com eles, sim, mas não o aproveitamos. Há dúvidas e problemas que se colocam agora muito mais. O que é que faço com eles? Como é que lhe dou mais qualidade de vida para que não se sintam desamparados?” É cada vez mais comum que as pessoas não possam ter os pais em casa. “Mas não é razão para que eles se sintam abandonados”, nota Alexandra. “Temos é de deixar de ser tão críticos. Há muita pressão social em relação à forma como os mais velhos são tratados. Não podemos criticar, porque não sabemos quais são os limites das pessoas. Temos de retirar esta pressão extenuante que recai sobre os filhos.”

Não esteja com eles por obrigação
Por vezes, não é confortável estar com os mais velhos. “Ficam carentes, chamam-nos a atenção para coisas sobre as quais não queremos pensar”, explica Alexandra. “Logo, evitamos estar com eles.” De que é que depende uma boa ou má relação com os pais? “Da história que cada família construiu ao longo dos anos”, lembra. “É esta história de vida que vai criar uma terceira idade com maior ou menor qualidade. Conflitos familiares, as experiências por que passaram, as coisas que se disseram ou não disseram, toda a parte emocional desagua ali, quando os filhos têm de mostrar que são atentos e o pais têm de mostrar se merecem.” É essa história passada que leva a que estar com os pais seja visto como um prazer ou uma obrigação: porque é na velhice, que os mais velhos colhem os frutos da relação que ao longo da vida estabeleceram com os filhos. É difícil estar com outra pessoa por obrigação. E quando só há obrigação, esses encontros tornam-se mais escassos.

Eduque os seus seniores

Quando se fala de tempo com os pais, temos obviamente de distinguir entre seniores capazes e seniores dependentes. “Nos dependentes, temos de pensar em mil pormenores” lembra Alexandra, “e o desgaste físico e emocional é brutal: temos que fazer o luto de uma pessoa que ainda está viva.”

Mas mesmo quando as pessoas estão em instituições, não têm de estar abandonadas. Por que não levar as crianças a visitá-las? “Uma das minhas avós tem Alzheimer, está completamente dependente, e o meu filho de dois anos é a única pessoa que a consegue retirar daquela apatia”, conta Alexandra. Se as pessoas conseguem andar, por que não levá-las a dar um pequeno passeio? Trazer-lhes bolinhos, pequenos presentes, fotos dos netos?

E os seniores mais aptos? “Às vezes, também não apreciam o que têm, não olham para a vida com gratidão, passam o tempo a lamentar-se, não tornam fácil a vida dos outros”, nota Alexandra. “As pessoas perdem algumas capacidades e ficam na defensiva, e os filhos e netos é que têm de ajudar. E depois é o ‘tens de vir comigo’, nem sequer é o ‘podias.'”

Filhos e netos precisam de impor limites, com muito tacto, e saber o que vão ouvir: ‘Nunca tens tempo para mim!’

“Também temos de educar os pais!”, lembra. “Dizer-lhes, por exemplo, ‘não posso estar consigo nesse dia, mas posso no dia seguinte’.” Nem tudo passa por estar com eles: por que não ajudá-los a reinventar uma vida própria? A partir dos 65 anos, as pessoas investem nelas (quando podem, claro, o que em Portugal não é dizer muito): “É a idade em que, se tiverem meios para isso, podem fazer o que lhes apetecer, e cabe-nos também a nós ajudá-las a reencontrar a sua vida dentro desta nova liberdade. Por exemplo, eu dizia aos meus avós, metam-se no carro e vão conhecer terras e hotéis novos.” Ou seja, dê-lhes atenção, sim, mas dê-lhes também um empurrãozinho para que não dependam tanto da atenção dos filhos.

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