Vamos começar pelo básico: o que é uma relação saudável?
Todas as relações têm uma dinâmica de poder envolvida. Numa relação saudável, o poder alterna. Por exemplo, eu decido a escola em que os miúdos andam e o outro decide onde vamos passar férias. Isto é um exemplo como outro qualquer, e estas zonas de influência alternam. O poder está lá sempre. Mas quando está equilibrado, não é agressivo e não existe uma dinâmica de humilhação, subjugação, autoridade excessiva, perda de liberdade, controlo.
Como é que eu sei se estou numa relação tóxica?
Quando me perguntam ‘como é que eu sei se estou numa relação tóxica’, a resposta é: se faz essa pergunta, provavelmente está. Uma relação tóxica é acima de tudo uma relação em que não há empatia. Uma das partes está ali para instrumentalizar a presença, o afeto e as competências do outro em seu proveito, mas não para lhes corresponder. São pessoas narcisistas, de um narcisismo que não é o ego normal de todos nós. Há muito controlo sobre a outra pessoa, e acima de tudo muita crítica: ‘nunca fazes nada de jeito, não percebes nada do que está a acontecer’, etc.
Qual é o padrão da vítima?
O mais habitual é estar uma mulher no papel da vítima (também pode ser um homem, mas esta não é a situação habitual) e são geralmente mulheres inteligentes, com boas carreiras, com uma boa situação económica, bonitas, interessantes, cultas, mas constantemente desvalorizadas na relação.
Porque é que uma mulher assim se deixa apanhar nestas situações?
Porque podem ter-se tornado emocionalmente dependentes daquela pessoa. Atenção, que não estou a falar de nenhum tipo de culpa. Quem impõe uma relação tóxica é hábil e sedutor, e portanto pode ser difícil escapar a esta rede que é montada à volta da vítima. Ao princípio tudo parece um conto de fadas: é a minha alma gémea, somos iguais, temos os mesmos interesses. Ora isto é forjado e depois vira-se contra nós. A pessoa sente-se privilegiada por ter aquele homem na sua vida, e se de vez em quando ele a humilha, lhe chama parva, a ameaça ou anda com outras mulheres, ela acha que a culpa é dela. Esta comunicação é intermitente: ora somos a melhor pessoa do mundo ou a pior, até que a pessoa fica com dúvidas sobre o seu julgamento e acha que ela é que não está a corresponder como devia. Este enredo de culpa mantém a pessoa na relação, sempre à espera que melhore.
Uma relação destas pode melhorar?
Só se houver um comportamento tóxico isolado. Se for um padrão, dificilmente. Então a outra pessoa tem de sair. O problema é que temos muito medo de ficar sozinhas, e aquela pessoa já lhe disse vezes sem conta ‘nunca ninguém vai gostar de ti como eu’, ‘nunca mais vais encontrar ninguém’, ‘não te aguentas sozinha’…
Além disto, geralmente as pessoas ficaram muito isoladas, dos amigos, da família, da sua rede afetiva de segurança, que tem de voltar a ser estabelecida.
Como é que defino os meus limites?
Os limites não se definem na relação, têm de estar decididos à partida. Quando isto não acontece, atraímos terroristas emocionais que nos destroem a identidade. Mas é possível perceber que estamos numa relação tóxica e desenvolver competências que nos fortalecem e regeneram.
Como é uma pessoa tóxica?
São pessoas geralmente muito sedutoras, inteligentes, bem sucedidas porque facilmente passam por cima dos outros, e os outros deixam-se levar por este discurso que passa facilmente uma sensação de grande intimidade. Os tóxicos são viciantes e eficientes. E as mulheres estão sedentas de carinho. O que têm de perceber é que não estão sozinhas e não são as únicas. Muito longe disso. Não se podem envergonhar de uma situação de que não têm culpa e que não vão conseguir resolver ficando na relação.