Viver numa casa com vista de mar e não convidar a natureza para o interior é, no mínimo, uma grande indelicadeza. A par com o crescimento da família, este foi um dos argumentos de peso que motivaram a remodelação da casa, com projecto da autoria do arquitecto Rodrigo Martins. Os proprietários tinham objectivos bem definidos quanto à reorganização do espaço.

As áreas sociais teriam de estar voltadas para o oceano, privilegiando o diálogo interior/exterior, e o piso superior, onde se situam as zonas privadas, teria de contemplar novas áreas, destinadas aos mais novos elementos da família.

Foram conservadas algumas características da construção original, tais como as escadas e a meia-parede de pedra da sala. A saída de fumos da antiga lareira foi também aproveitada, embora a fonte de calor tenha sido actualizada por outra de linhas modernas. Existia uma divisória entre a sala e a actual biblioteca, entretanto abolida em nome da amplitude.

As zonas de trabalho, de estar e de refeições em open-space permitem, em simultâneo, o decorrer de várias acções diferentes e a comunicação entre todos os intervenientes. Com este mesmo objectivo reduziu-se o número de portas interiores, as superfícies de betão, responsáveis pela divisão dos espaços, foram preteridas por meias-paredes, ou paredes interrompidas, e o piso foi nivelado na íntegra, deixando de existir os desníveis da construção original.

Assim se cumpriu um dos requisitos: espaço amplo comunicante. Para tirar partido da vista privilegiada recorreu-se a grandes portadas de vidro sem um único metro de pano a resguardar a privacidade do interior, variável que não é posta em causa tendo em conta a localização da casa. No Verão, emprega-se a expressão ‘vá para fora cá dentro’, como comenta a proprietária é que toda a frente de vidro corre sobre calhas, deixando de existir qualquer divisão entre interior e exterior. Por este motivo, elegeu-se para o pavimento a madeira de ipê, conhecida pela sua resistência e durabilidade.

O traço contemporâneo da arquitectura é realçado ainda com os tectos e pilares de betão à vista, com aparência industrial, e com decoração que prima pela economia de peças e pelos traços rectilíneos. Os interiores ficaram a cargo de Giano Gonçalves, cujo trabalho se desenvolveu tendo em conta algum mobiliário já existente na casa. ‘As peças teriam de respirar, pelo que se optou pelas de grande dimensão’, ressalva o decorador, autor da mesa de jantar revestida a espelho, que reflecte o lustre na sua superfície, e das cadeiras que a cercam, forradas a tecido que na sua composição tem uma fibra acrílica que lhe confere a aparência de pele.

Ainda na área destinada às refeições, um antigo armário de família serve hoje de louceiro, onde a proprietária alinha uma colecção de pratos de prata. A zona de estar é demarcada da anterior pelas costas do sofá cor de beringela, a quebrar a neutralidade dos restantes elementos. Junto ao assento XL destaca-se a mesa de centro com abertura, que permite variar a decoração, onde se pode colocar desde garrafas (ao estilo de bar) a plantas, ou outro qualquer ornamento.

De forma a aproveitar um nicho na sala dividido visualmente da restante área através do bloco onde encaixa a lareira estende-se uma estante a todo o comprimento da parede, feita à medida com calha onde corre uma escada de acesso à parte superior. Uma espécie de biblioteca/zona de trabalho, discretamente inserida no ambiente. Foi dada primazia à iluminação indirecta, colocada no tecto, numa reentrância conseguida através da conjugação entre a zona de betão e o tecto falso branco. Para recriar um cenário mais intimista, sobretudo à noite, foram embutidos no chão, junto aos pilares, focos de luz que, quando acesos, atribuem maior sumptuosidade. No piso superior há uma continuidade da linguagem adoptada para as zonas comuns.

Na suíte dos proprietários, por exemplo, uma parede interrompida, para além de estabelecer uma fronteira, serve de cabeceira da cama, com mesas-de-cabeceira integradas, moldada em inox e desenhada por Hernando Mejia, autor do puxador da porta de entrada e das esculturas em ferro expostas na sala de jantar. Entre peças de arte, grandes superfícies de vidro e madeira, à primeira vista, esta casa de família não denuncia a presença de crianças, porque não se encontram as marcas das brincadeiras e correrias. Deve-se o feito aos materiais utilizados e a algum método de gestão do quotidiano. Segundo a proprietária, e mãe, os materiais devem ser robustos, à prova dos mais novos, e de manutenção fácil, para não comprometer os tempos de lazer dos adultos.

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