Hoje que se celebra a Restauração da Independência, que em 1640 pôs fim ao domínio espanhol no reino português, nada melhor do que entrarmos na máquina do tempo e viajarmos ao mundo do século XVII, onde estava tudo a acontecer.
Quem já conhece a Isabel Machado sabe que qualquer livro é uma boa aposta. Este ‘Luísa de Gusmão’ torna a provar isso. E é uma boa aposta porque Isabel Machado tenta sempre iluminar figuras da nossa História sobre as quais sabemos pouco, ou que estão injustamente esquecidas.
Em ‘O infante D.Pedro’ lembrou um regente absolutamente visionário e um dos homens mais extraordinários que Portugal já teve, mas que pouca gente hoje sabe quem é.
Em ‘Constança’ recordou a mulher de D.Pedro (sim, a que ele enganou com a Inês, que essa toda a gente conhece), sobre a qual sabemos muito pouco mas que, segundo parece, estava longe de ser uma princesa apagada, ignorante ou medrosa.
No extraordinário ‘Isabel I de Inglaterra e o seu espião português’, leva-nos à corte de Inglaterra no século XVI pela história – verídica – de um médico português na corte de uma das rainhas mais poderosas do mundo (não vos conto como é que acaba porque não gosto de spoilers).
Agora com ‘Luísa de Gusmão’ Isabel traz-nos uma mulher que nasceu espanhola mas que acabou por ficar ligada à independência de Portugal, através do casamento com D. João, duque de Bragança.
Mais conhecida pela frase ‘antes rainha uma hora que duquesa toda a vida’ (ou noutra versão, ‘mais vale morrer reinando que viver sevindo’) que lhe é atribuída pela cultura popular mas que até hoje ninguém sabe se foi mesmo dita ou não, ficou na História por ter convencido o marido a apoiar o movimento dos conjurados que, a 1 de Dezembro de 1640, derrubaram a dinastia espanhola dos Filipes e o aclamaram como rei D. João IV de Portugal. Não sabemos se a frase foi ou não realmente dita por D. Luísa, mas a verdade é que, sem ela, Portugal talvez nunca tivesse sido o país independente que hoje é.
Curiosamente, Luísa de Gusmão chegou ao casamento como uma espécie de embaixadora de Espanha, com a missão de manter Portugal subjugado a Madrid, para que a dinastia filipina continuasse no poder em toda a península. Mas quando o descontentamento começa a aumentar é sobre o marido, D. João, herdeiro do trono português, que as esperanças de uma revolta recaem. Fiel ao marido e, ao que consta, muito mais determinada, Luísa vai fazer valer toda a sua influência para recuperar a coroa para Portugal. É ela que encoraja o marido a levar a cabo a revolta, e quando D. João morre é ela quem fica regente do reino, e é aí que o seu papel se torna decisivo. Claro que acabou rotulada de ‘traidora’ (para os espanhóis, evidentemente) mas para Portugal foi uma das suas mais corajosas defensoras.
Este é um livro muito completo, que pede um leitor com tempo para dedicar a um dos episódios cruciais – e, estranhamente, mais ignorados – da História de Portugal.
Já agora, se quiserem fazer o trabalho de casa completo, comecem com a história de outra mulher forte e determinada, a duquesa Catarina de Bragança, avó deste D. João, que só não foi rainha de Portugal e evitou a Restauração porque era mulher, em ‘Filipe I de Portugal – o rei maldito’, de Isabel Stilwell.
Boas leituras e não se esqueçam de oferecer livros no natal.
‘Luísa de Gusmão’ – Isabel Machado, Ed. Manuscrito, E22,90