Em 1944, aos 22 anos, a futura escritora Agustina (ainda não) Bessa-Luís conheceu o marido segundo um método pouco usual para as raparigas do seu meio: um anúncio de jornal. “Jovem instruída deseja corresponder-se com pessoa inteligente e culta.” Recebeu 30 respostas, selecionou cinco, e havia de casar com um deles: Alberto Luís, então estudante de Direito em Coimbra. Ficariam juntos ‘para sempre’.
Foi esta história que inspirou a escritora Joana Bértholo a escrever ‘Augusta B. Ou as jovens instruídas 80 anos depois’ (Ed. Caminho). A premissa é simples: e se uma rapariga, no tempo em que os namoros foram substituídos por ‘matches’ e as conversas físicas por ‘chats’, no tempo do Tinder, do Bumble, Happn, Hinge, Grindr ou OkCupid, (ou, como diz a heroína, “aquele mundo que não era digno da Literatura”), dos encontros rápidos mas não menos sofridos e do tempo em que já ninguém põe anúncios nos jornais (pelo menos para arranjar namorado) decidir seguir o exemplo da jovem Agustina em tudo, até no anúncio?
O ‘e se…’ dá o mote para uma novela sobre o amor, passado e presente, e sobre, de facto, o que acontece quando uma rapariga decide entrar na máquina do tempo. Em cena entra Augusta, 22 anos, a mesma idade e quase o mesmo nome da escritora a quem vai seguir o exemplo, com uma diferença de uns abismais 80 anos entre as duas.
Agustina conheceu Alberto numa época de mulheres submissas e fronteiras rígidas. Augusta “namorava num tempo em que as fronteiras eram elusivas, os papéis difusos, os códigos flutuantes, as afectividades líquidas.” E se dantes era tudo mais simples, pois vamos então ‘simplificar’ e agir ao modo de Agustina. Com a ajuda da amiga e confidente Raquel, atiram-se à (difícil) tarefa de conhecer alguém por anúncio. Problema: 80 anos depois, isso não é simples. Mesmo nada simples.
Pronto, para não vos estar aqui a contar a história toda, deixo-vos o TPC de irem ler o resto, até porque se lê muito bem e é um prazer adicional, para quem é fã de Agustina, reencontrar também uma homenagem ao seu ‘tom’ e à sua escrita, além da sua circunstância.
Não vamos dar spoilers e dizer o que acontece mesmo, e se a nossa Augusta encontra ou não o seu Alberto, até porque, percebe-se depois, se calhar nem é isso que está aqui em causa. Porque, conclui-se, “Porventura nada do que realmente importa teria mudado.”