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Ponto 1: Como toda a gente já reparou e até já está um bocado farta de reparar, hoje é Dia dos Namorados.
Ponto 2: Já me acusaram de nunca falar de livros ‘fáceis’. E eu pergunto, mas o que é um livro difícil? Encolhem os ombros e respondem aquela frase críptica ‘aquelas coisas que tu lês’.
Portanto, em homenagem ao querido São Valentim, que pelo menos nos anima a existência no mês mais curto e mais desconfortável do ano (principalmente se pensarmos nas contas da eletricidade), aqui vos deixo uma sugestão bem romântico-kitsch.
(É verdade que vos podia deixar uma sugestão romântica não-kitsch, mas não vou deixar passar esta oportunidade).
Tal como há ‘comfort food’, aquele tipo de comida que nos aquece num dia frio ou nos dá calorias rápidas quando precisamos de animar, também há ‘comfort books’ aqueles livros com que nos sentamos no sofá depois de um dia particularmente duro e que são uma viagem para longe de tudo o que nos chateia, maça ou atormenta.
Este é um desses livros.
(Curiosamente, fui pesquisar que livros eram considerados ‘Comfort books’: apareceu-me ‘Orgulho e preconceito’ em primeiro lugar, ‘Harry Potter e a pedra filosofal’ em segundo, ‘Mulherzinhas’ em terceiro, claro que isto na Goodreads. Não encontrei nenhum equivalente em português. Talvez qualquer dia escreva uma coisa sobre isto. E vocês, qual é o vosso livro de conforto?)
Até já há uma categoria especial: ‘Regency Romance’, ou seja, romances passados em Inglaterra entre os anos de 1795 e 1837 (chamados Regency, ou Regência, devido ao Regente do país, o príncipe George, que tomou as rédeas do país enquanto o pai, o rei George III, estava doente). A época tornou-se literariamente famosa primeiro devido a Jane Austen, e depois derivou quando algumas autoras modernas decidiram usá-la como cenário numa altura em que as mulheres tinham uma vida bastante limitada (mas vestidos bastante mais giros). Quanto mais regras, mais transgressão, como toda a gente sabe.
Esta autora que aqui vos trago, a americana Nicole Jordan, já escreveu muitíssimos romances históricos, fartou-se de ganhar prémios e vendeu milhões de livros. Mas apesar de adorar ler Jane Austen ou Victoria Holt, formou-se em engenharia civil e passou oito anos a trabalhar numa empresa de papel higiénico, até que, depois de um workshop de autoajuda, decidiu não adiar mais o seu sonho de escrever. A primeira história foi publicada em 1985, e a partir de então tornou-se uma das maiores bestsellers do mundo.
O tema anda sempre à volta do jogo matrimonial tal como existia na era Regency (claro que na era Regency as mulheres também morriam de parto – e de dores de dentes – a torto e a direito, não tinham direitos nenhuns, e era muito mais comum casarem com um marido que as maltratava do que se verem a braços com um conde charmoso, galanteador e uma bomba na cama. Mas pronto, fim de parêntesis feminista, já cá estamos outra vez.)
Ora bem, vamos ao ‘Desejo Absoluto’. O título em inglês é muito mais sugestivo: ‘Fever dreams’, ou o tipo de sonhos que se tem quando a temperatura do corpo está elevada (é o que o púdico Dr. Google explica). ‘Desejo absoluto’ diz tanto como o livro chamar-se Maria Antónia ou Manuel Maria, isto é, nada, mas pronto, também já sabemos ao que vamos. Aliás, uma grande parte do apelo destes ‘Regency Romance’ são as cenas de sexo, e praticamente vamos de umas para as outras quase sem acontecer nada de relevante na história.
História: é uma espécie de ‘Emma’ em ácidos e sem a parte inteligente (além de que a Nicole não escreve como a Jane Austen, mas pronto). Alex Ryder decide conquistar a ‘beldade espirituosa’ lady Eve, que não está para aí virada até precisar de proteção. Eficaz casamenteira, decide encontrar-lhe a ele uma noiva adequada, sem saber que é a única mulher que ele deseja.
Como toda a gente já leu esta história tirando aparentemente eles os dois, isto dá pano para muitas páginas.
Se é a Jane Austen: não é.
Se vale a pena ler: se teve um dia de cão e quer um bombom, definitivamente. Não é todos os dias que temos arcaboiço para nos atirarmos a um Lobo Antunes ou um Mia Couto.
Feliz Dia dos Namorados para vocês também.
‘Desejo absoluto’ – Nicole Jordan, Marcador, E16,11