Como é que se tornou feminista?
Sou formada em gestão de empresas, sempre trabalhei com marketing e sempre me interessei por feminismo. No Brasil, em Curitiba, comecei o Mamaworking, um projeto de co-working para mães, que foi um sucesso e onde me habituei a trabalhar com mulheres. Vim para Portugal por motivos de segurança: é um país muito melhor para criar filhos. Então uns anos depois de chegar a Portugal, comecei com a Marta Martins uma agenda cultural feminista mas já sabíamos que queríamos um projeto de educação para o feminismo: daí o nome escola. Porque já existem muitas escolas deste género pelo mundo todo. As associações e os coletivos costumam ter alguns projetos educativos mas acabam por se perder em todas as atividades e obrigações, por isso quisemos focar-nos mesmo nesta área.
Qual é o objetivo do Manamiga?
A ideia é esta: uma pessoa comum, que não está na militância, nem imagina que pode fazer uma formação deste tipo. Pensamos muito que para ser feminista é preciso ser ativista a sério, é preciso estar ligado a um partido ou a um movimento associativo que vai exigir empenho e participação. Reparámos que muitas pessoas gostariam de aprender mais mas não querem ser ‘ativistas’ tradicionais, ou não têm tempo para muito. Então criámos a Manamiga.
Para quem é?
Se eu quero entender o movimento importantíssimo que é a igualdade de género, se eu quero pensar um pouco mais sobre isso, esta escola é para mim. Às vezes as pessoas gostam de estudar estes assuntos porque simplesmente lhes interessa pessoalmente, outras vezes gostariam de saber mais por causa de alguém LGBT na família, ou porque estão a educar um menino, ou por uma variedade de outras razões, mas não querem fazer um mestrado ou algo assim escolar. A escola feminista não é uma escola tradicional, não é uma graduação em género, um mestrado em estudos da mulher. Temos cursos presenciais mas a maioria é online, até porque assim mais pessoas podem assistir.
Que temas propõem?
Os nossos temas são muito diversos. Por exemplo, tivemos uma história das mulheres mas que não foi dada de forma cronológica, que é chato, mas onde a autora escolheu quatro momentos chave, partindo da crianção do patriarcado nas tribos. Outra autora revisitou toda a teoria marxista partindo do princípio que o capitalismo só funciona com o trabalho não remunerado das mulheres. Temos cursos sobre pensadoras negras, linguagem neutra ou micromachismo. Portanto, tentamos simplificar e tornar estes temas interessantes.
O que é micromachismo?
É quando achamos que somos super-modernos e super à-frente, mas na verdade temos comportamentos machistas de que nem nos apercebmos. Por exemplo: quantas vezes eu tirei a louça da mão do meu marido? Na semana passada, tivemos um pedido tão interessante! Um pai contactou-nos porque queria dar um presente à mulher no Dia da Mãe, e a filha sugeriu um curso nosso. Então encontrámos um curso da Márcia Tiburi sobre Feminismo em comum, que é uma boa base porque dá uma visão geral do feminismo, e fizemos um voucher-presente.
Ainda temos uma educação pouco igualitária?
Tenho uma filha de 15 anos que no outro dia me contou que uma amiga dela faz em casa tarefas que o irmão não faz. As meninas ainda são muito orientadas no sentido de arranjarem um bom partido, casarem, terem estabilidade. Pensa-se ainda pouco no potencial delas, em carreiras diferentes como engenharia ou tecnologia. Até na escola, onde ainda se põe as meninas a saltar à corda e os meninos a jogar futebol.
O que é mais urgente mudar na vida das mulheres?
A mentalidade de todos. Quando todos começarmos a pensar que não é uma coisa contra outra mas que todos juntos faremos um mundo melhor, estaremos bem. Por exemplo, tenho muitos amigos que se separaram nos últimos anos. E todos os meus amigos homens me disseram que talvez ainda estivessem juntos se as tarefas e obrigações tivessem sido mais partilhadas. E não estou a dizer que a culpa é dos homens, estou a dizer que tudo deve ser obrigação de todos, homens e mulheres. E é no dia-a-dia que vemos que a igualdade de género seria melhor para todos. Quando alguém me diz ‘eu não sou machista’, mulher ou homem, eu penso: ‘esta ou este tem de fazer um curso connosco’ (risos)
Portugal é um país machista?
Ouço muito as mulheres portuguesas queixarem-se de que Portugal é machista, e é verdade que os números de violência doméstica não são bons, mas a verdade é que vejo mulheres insatisfeitas em todos os países. Claro que Portugal não é o Irão, mas na Europa, todas as mulheres acham que há muito para conquistar. Pode haver é pequenas diferenças culturais, por exemplo as espanholas manifestam-se mais, são mais rebeldes, mas as portuguesas também falam, e falam muito, só que falam entre amigas. Não vão para a rua, mas estão atentas. E a receptividade que a nossa escola tem tido também prova isso, a adesão tem sido fenomenal. Quem quiser aceder a todos os cursos, é só visitar o site manamiga.pt, mas nós também damos todas as informações que forem precisas.