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Joao Lima

“Podemos falar ao sol?” O dia está quente. Conversamos em cima de um muro. Por trás há uma antiga casa agrícola, com terrenos plantados, rosas e couves. Ainda tentei pôr-lhe uma couve nos braços para a fotografia, mas chegámos à conclusão que, por muito boa vontade que se tivesse, nada liga uma couve a Luís Franco-Bastos (“Descubra quem ele gostava de mandar às couves”, ainda sugeriu entre risos) e voltámos ao estúdio de rádio.
Uma antiga quinta é onde estão instalados os novos estúdios da Rádio Renascença, onde também funciona a Mega FM. É aqui que Luís Franco-Bastos apresenta a rubrica ‘Só Que Não’. Para alguém que ainda não chegou aos 30, já tem um longo currículo como humorista, que inclui uma prestação nos Globos de Ouro que pôs o país inteiro a rir.
Há alguns anos, ninguém lhe reconhecia o nome. Depois os seus vídeos no YouTube a imitar vozes de personalidades tornaram-se virais, e hoje enche Coliseus sozinho.
Mas o seu humor não se reduz a dotes de imitador. Diz que continua paranóico com a eficácia de uma piada, mas também que haverá sempre gente que não se vai rir.

A contagem das suas ‘vozes’ ainda vai nas 40?
Não, já aumentou. Essas 40 eram as vozes nacionais que eu fazia regularmente, depois ainda há outras que eu fiz só para mostrar que as posso fazer. Montei um vídeo com 13 personagens do Star Wars e outro com 20 personagens do cinema, o que já dá quase 70 vozes. Mas a resposta 40 continua a ser a mais correta, porque são as que costumo fazer. As outras são extras.

Como é que decide quem vai imitar a seguir? É intuitivo ou alguém ‘encomenda’?
Há uma parte muito intuitiva, e depois, a partir do momento em que me tornei profissional, passei a reunir figuras que fossem relevantes e reconhecíveis. Por exemplo, seria importante ter um primeiro-ministro (que ainda não tenho), e durante as eleições eu já estou de olho nos possíveis vencedores.
Mas escolho as vozes com base naquilo que acho que posso fazer com elas. É mais interessante escolher uma pessoa com uma vida ou personalidade que dê pano para mangas, ou seja, que me dê material para os espetáculos de stand-up. Há pessoas com vozes fáceis de apanhar, mas depois as vidas delas e o que elas fazem não tem qualquer interesse.

E como é que se faz, estuda-se a pessoa pelo YouTube?
Sim. Vejo vídeos e estudo a pessoa a partir daí, sendo que não tenho a possibilidade de a convidar para viver comigo durante uns tempos para a estudar de perto.

Treina ao espelho?
Não, treino muito no carro e no banho. Há quem cante no duche, eu imito. Já houve quem se assustasse, sim. Namoradas que de repente começavam a ouvir vozes. Isso não era agradável, mas depois habituavam-se.

As vozes mais características são as mais fáceis?
Sim. O inglês macarrónico do Mourinho é bastante reconhecível, a voz grave e o sotaque brasileiro e o riso do Luisão do Benfica, a sopinha-de-massa do Jonas, são exemplos de vozes fáceis, mas também me diverte fazer as menos previsíveis, como o Bruno Nogueira, que é das vozes que as pessoas mais gostam.

Uma voz que tivesse sido mais difícil…
O Eduardo Barroso. Passou a ser das minhas preferidas. Achava-o espalhafatoso e interessante mas difícil de apanhar. Depois insistiram comigo e acabei por conseguir. Às vezes não tenho fé suficiente em mim, e levo muito tempo a lá chegar.

Já fez mulheres?
A Marge Simpson e a Manuela Ferreira Leite. Não sei se contam.

E já alguém se ofendeu?
Muita gente, de certeza. Os próprios nunca se queixaram, mas já recebi muitas queixas e comentários nas redes sociais. Mas a minha fasquia não se estabelece com pessoas sem sentido de humor. A partir do momento em que um humorista diz uma piada, há três tipos de reações: as pessoas que se riem, as pessoas indiferentes e as pessoas que se ofendem, e os ofendidos também fazem parte do resultado. Por exemplo, o objetivo do pintor é fazer um quadro. Vai sujar a roupa, as mãos, as paredes, e esse não é o objetivo dele, mas são coisas que têm de acontecer. Como as pessoas que se riem têm sido sempre infinitamente superiores às outras, isso não me preocupa.

Diz que começou a imitar pessoas em criança, quando via os programas do Herman…
Sim, na altura era o passatempo universal, e eu era mesmo muito pequeno quando comecei a perceber o poder que era fazer rir as pessoas. Também comecei a perceber como o riso dos outros era viciante.

Os portugueses têm sentido de humor?
Têm. Acho que já evoluímos muito para lá da anedota, temos hoje muitos humoristas e muito bons e com muito público. Claro que haverá sempre quem não perceba uma piada, mas isso há em todo o lado.

Começou nas Produções Fictícias…
Tirei um workshop lá e depois ganhei os ‘Cómicos de Garagem’, que era um concurso de rádio para humoristas. E tirei Ciências da Comunicação. Felizmente que não me tornei jornalista.

É uma pessoa atenta?
Podia ser mais, mas toda a gente podia ser mais, porque este mundo é tão rico que a máxima observação nunca é suficiente. Com o passar do tempo, acho que me tenho tornado mais atento, porque no meio artístico não nos podemos deixar dormir.

Têm isso em comum, os jornalistas e os humoristas? O poder de observação?
Sim, basicamente fazemos o mesmo que os jornalistas fazem, mas em bom. (risos) Nós somos a versão fixe de vocês.

Se eu não tiver graça, é possível treinar?
Duvido. Acho que quem já tiver graça natural, o treino é muito importante. Mas há poucas coisas mais deprimentes do que ver alguém sem talento esforçar-se numa coisa para a qual não nasceu.

Como é que se treina? Tem alguma cobaia?
Os meus amigos. Mas tem de ser de forma subtil, tenho de apresentar a piada de modo a que eles não se apercebam de que estão a ser cobaias, senão não funciona.

Um dos momentos mais difíceis da sua vida foi quando a sua mãe morreu no dia de estreia do seu espetáculo ‘Roubo de Identidade’, há 2 anos. Como é que conseguiu ir para a frente com a apresentação?
Com o piloto automático. Para começar, os humoristas têm uma capacidade de distanciamento do mundo que as outras pessoas não têm. Há sempre uma parte de nós que está de fora a observar como se aquilo não fosse connosco. Mesmo que sejamos nós a sofrer, há uma parte que está de fora a achar graça. É como quando se vai na ponte e há um acidente e nós ficamos a olhar. Isso ajudou-me no momento a ter a frieza de pensar ‘aconteceu uma tragédia, mas não fazer o espetáculo seria mais uma semi-tragédia’, porque era um espetáculo importante, muita gente tinha comprado bilhete, uma equipa inteira tinha trabalhado naquilo, e portanto percebi que se eu o fizesse, estaria a minimizar os estragos.

Passou-lhe pela cabeça não o fazer?
Não, nunca. Além de tudo, vi o espetáculo como uma homenagem a alguém que sempre foi a minha maior fã. E portanto durante uma hora e meia congelei tudo o que estava na minha cabeça, e depois então voltei a ligar-me.

O sentido de humor ajuda ou desajuda no dia a dia?
Ajuda. Em tudo. O humor é a única maneira de viver que concebo como sendo saudável e feliz.

E é uma arma de conquista?
Claro que sim. De várias maneiras. Até no sentido material, porque eu pago as minhas contas com humor. Mas no sentido humano claro que sim, que é uma conquista.

Porque é que há menos mulheres na comédia?
O primeiro dos fatores é que os homens mais facilmente se dão ao ridículo do que as mulheres, têm menos receio e menos pudor de fazer figura de imbecil. Tens que te expor de maneira diferente. E depois, acho que ainda não há muitas mulheres a fazer humor pela mesma razão que não há muitas mulheres a fazer nada que ainda não esteja muito desenvolvido, porque por razões sociais os homens vão sempre à frente. O humor está muito mais desenvolvido, mas ainda é um embrião comparado com o que poderia ser. Há stand-up em Portugal há 20 anos, nos Estados Unidos há 80. Portanto, acho que a partir de agora vão começar a aparecer mais mulheres.

Os novos humoristas são todos diferentes, mas há alguma coisa que os una como geração?
É uma boa pergunta, mas é difícil de responder. O que eu posso dizer é que existe uma parte dessa geração que quer muito fazer humor sem medo, como o Rui Sinel de Cordes e o Salvador Martinha. É o mais importante. Ainda há muita gente, mesmo no meio artístico, que tem receio de fazer humor sem medo, porque tem receio que o público não distinga o humor daquilo que se diz literalmente. Em Portugal existe uma grande parcela de pessoas que leva tudo à letra, e as redes sociais vieram dar voz e poder a pessoas ‘literais’ a quem passa muita coisa ao lado. Por exemplo, eu sou benfiquista. Se eu faço uma piada sobre o meu clube, há muita gente que acha que eu odeio o Benfica, quando até tenho uma águia tatuada no braço. E, portanto, acho que faz falta alguém que faça humor para quem o tem, e não para os outros. Faz falta humoristas que pensem ‘tenho de fazer o que tenho de fazer’.

Alguma vez pediu desculpa de alguma coisa?
Não, nunca. Um humorista que pede desculpa por uma piada que fez está a desonrar a sua profissão e todos os seus colegas. O humor é uma forma de liberdade. Podemos pedir desculpa se formos incorretos com alguém, mas não pela piada em si.

O que é que o seu cão, Balotelli, lhe ensinou?
Que os cães são mesmo, em todos os sentidos, o melhor amigo do Homem. Não é um mito nem um cliché, é mesmo verdade.

A que humorista gostava de roubar a identidade?
Louis C K. É a minha maior referência.

O que é que faz quando não está a trabalhar?
Como bastante. Adoro McDonald’s, embora coma poucas vezes. Sei que soa mal, mas seria a minha última refeição antes de morrer. Mas também gosto de sushi e comida portuguesa, como arroz de pato. Esse é o meu problema, gosto de tudo. E depois gosto muito de conhecer bons restaurantes, e também cozinho em casa, mesmo só para mim. A minha especialidade é linguini nero com camarões e alho, que é mais do que muita gente sabe fazer. Quando não estou a comer, ouço música e vejo muitas séries.

Qual é o seu plano B? O que é que faria se não fosse humorista?
Não faço ideia. Por acaso essa foi a minha frase final no espetáculo do Coliseu: o meu plano A é fazer rir, e graças ao meu público não tenho nenhum plano B.

A Papel Químico
Nasceu a 28 de novembro de 1988 e cresceu a imitar o Diácono Remédios e a idolatrar Herman José. Com apenas 19 anos, vindo
da escola das Produções Fictícias, ganhou o concurso de rádio ‘Cómicos de Garagem’. Licenciado em Ciências da Comunicação pela Universidade Nova de Lisboa, muitos dos seus vídeos tornaram-se virais, como aquele em que imita 35 pessoas em 5 minutos. Depois de uma rubrica radiofónica diária na Antena 3 passou para a Mega FM com ‘Só Que Não’, às terças e quintas-feiras, depois das 18h30. Fez espetáculos de stand-up a solo, como ‘Papel Químico’, ‘Roubo de Identidade’ e ‘A Voz da Razão’. Adora o Porto, Paris, ‘Seinfeld’ e o ‘Clube dos Poetas Mortos’, e continua a apoiar o clube do seu coração: o Benfica.

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