Situada numa urbanização que faz recordar os bairros londrinos em banda revestidos a tijolo-burro, a casa, com projecto dos anos 90, nasceu para ser igual a tantas outras. Foi a intervenção de Joana Bezerra, da Séssacional, que lhe marcou a diferença.
As moradias formam um corredor de figuras geométricas que se prolongam no terreno, outrora rural, restando ainda resquícios desses tempos, não muito distantes. A arquitectura, da autoria de Nuno Portela, vive, assim, da cor e do movimento uma vez que, ao longe, resulta em planos rebatidos, que se abrem quando deles nos aproximamos. Melhor dizendo: as portas e as janelas só são visíveis de frente.
No interior, a partir do hall de entrada, num piso intermédio entre os dois, superiores e inferior, facilmente nos apercebemos do funcionamento de todos os ambientes, graças ao lance de escadas. Em baixo, situa-se a sala multiusos com acesso directo para o jardim. Um piso acima fica a cozinha e o living, com sala de estar e de jantar. A zona dos quartos localiza-se no último andar.
Em cada patamar foi contemplado um espaço que funciona como hall de acesso às diferentes áreas descritas.
Num destes espaços, o que antecede o salão, com a escrivaninha de Antonio Citterio, visualizamos a cozinha à direita, as escadas de acesso aos quartos, à esquerda, e a casa de banho social. A sala multiusos, um piso abaixo, abre-se ao jardim, cujo recorte do relvado contrasta com a pedra, e onde desfilam curiosas peças de xadrez da autoria de Maria Campos.
Esta sala já existia e sofreu poucas alterações. Nela se distinguem obras invulgares em cerâmica, assinadas por José Carvalho, Alberto Vieira e Liliana Peregno. Ao lado, situam-se as zonas de arrumos, lavandaria e garagem.
O mobiliário está reduzido ao essencial. Apenas as peças de arte se acumulam, sempre evocando estados de espírito com significado especial. Falam não só de olhares, de maneiras de viver e de estar, como de sentimentos. Por isso, cada recanto transmite sensações distintas, levando-nos a pensar na própria forma de sermos e sentirmos. A maioria destas questões são colocadas por Joana Bezerra, que joga com a forma, cor e essência dos objectos por não conseguir afastar o mundo dos sentidos do da decoração.
Joana conseguiu ainda intervir em parte na arquitectura de interiores. Recuou a cozinha, que ficou mais reduzida. Colocou-lhe granito no pavimento, repetindo o mesmo material na entrada para uma ligação entre materiais uma vez que o restante pavimento foi revestido a afizélia. Todas as portas são em tola. Retirou o tijolo-burro do fogão de sala que fazia a ligação com a fachada, parte da qual ‘entra’ para os interiores. As escadas também sofreram uma alteração, porque se abriram por completo à entrada, enobrecidas pelo corrimão em aço inox Kritop, com um toque de design.
Desta forma, o todo da casa apercebe-se num só olhar. No hall de acesso aos quartos, no último piso, existia um grande painel de madeira e vidro que também foi retirado para acentuar a sensação de liberdade espacial e dar amplitude à casa. Além desta, outras alterações foram feitas. O próprio patamar foi diminuído em benefício da suíte do casal e do quarto vizinho. "Esse crescimento de área deu origem a uma zona de vestir à entrada da suíte", explica Joana, rematando: "Também fiz modificações nas casas de banho, nomeadamente na loiça sanitária. Usei a mesma pedra em todas. Os roupeiros da suíte são de origem, só ampliei a área de vestir. A escolha de cores recaiu nos gostos dos proprietários." É, aliás, nos quartos que a cor impera, e faz todo o sentido, por serem espaços privados e vividos consoante os seus utilizadores. Uma casa, no final de contas, versátil, onde se destaca não só a paixão de Joana Bezerra pela arte como uma fluidez muito convidativa.
Texto e produção Helena Osório
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