
vikialis
*artigo publicado originalmente em novembro de 2017
1. A solidão livre
“Porque é que havia de me sentir sozinho? Raras vezes na minha vida tive um sentimento de solidão. Divertimo-nos muito os dois, eu e eu.” António Lobo Antunes (escritor)
Todos somos atingidos pela solidão, porque a vida se encarrega disso: ou porque alguém morre, ou porque mudamos de país, ou porque nos separamos. A maioria das pessoas reage instintivamente à solidão: somos um animal gregário, feito para sobreviver com a proteção da tribo. Precisamos de alguém com quem falar. Com quem dividir alegrias e tristezas. Que acontece quando perdemos essa tribo? Muitas pessoas põem a própria vida e as suas capacidades sociais em causa. Mas outras veem a solidão como um reencontro consigo mesmas. Estar só não é uma marca de falhanço, mas uma forma de liberdade.
2. A solidão autoimposta
“A solidão desola-me. A companhia oprime-me.” Fernando Pessoa (poeta)
Há quem esteja só não porque o deseje mas porque não consegue libertar-se dela. É como se a solidão se fechasse à sua volta, tornando-se um escudo contra os desapontamentos da vida: um casamento que correu mal, uma relação falhada, amigos que não correspondem. A pessoa fecha-se na sua concha. Precisamos dos outros? Precisamos. Mas não tanto como precisamos do nosso escudo de proteção.
3. A solidão da diferença
“Se alguém é diferente, na maioria das vezes é um solitário.” Aldous Huxley (escritor)
Há quem tenha dificuldade em encontrar alguém parecido. O ditado popular diz que para cada panela há uma tampa, mas quando a panela não é redonda, mas feita de diferenças, onde está a tampa que lhe serve? Também há a ‘diferença’ por situações de violência, por exemplo. Uma pessoa que viva em situação de violência conjugal vive fechada nessa situação e em si mesma, vive num estado de solidão profundo. Uma depressão também pode diminuir a vontade de estar com os outros.
4. A solidão entre os outros
“’Onde estão as pessoas?’, perguntou o Principezinho. ‘Estamos tão sozinhos no deserto…’ ‘Também estamos sós entre as pessoas’, disse a cobra.” A. Saint-Exupéry (escritor)
Quantas vezes estamos rodeados de pessoas mas sentimo-nos sós? Essa é a solidão primordial, a que por vezes nos volta para nós próprios. Não é necessariamente má: pode ser apenas sinal de que precisamos de estar… sozinhos. Já a solidão profunda entre duas pessoas é sinal de que, provavelmente, estaríamos menos sós se estivéssemos verdadeiramente sozinhos.
5. A solidão criativa
”As pessoas que têm empregos criativos têm de estar sós para recarregar as baterias. Não se pode viver 24 horas na ribalta e continuar criativo. Para mim, a solidão é uma vitória.” Karl Lagerfeld (criador de moda)
Num mundo em que estamos rodeados de pessoas, ficar só é uma forma de não termos de estar constantemente do outro lado a olhar para nós. Estar só é conseguir conversar com a pessoa mais importante da nossa vida: nós.
6. A solidão do emigrante
“Não pertencer a nenhum lugar, nenhum tempo, nenhum amor. A origem perdida, o enraizamento impossível, a memória imergente, o presente em suspenso.” Julia Kristeva (filósofa)
A ‘nova emigração’ voltou a criar bolsas de solidão em Portugal: quem parte está sozinho num país onde não conhece ninguém. Quem fica tem os amigos de sempre, mas falta-lhe a pessoa que está longe. É possível fazer novos amigos? Claro que sim. Mas nunca estaremos totalmente na nossa zona de conforto.
7. A solidão de geração
“Com o tempo, vamos ficando sozinhos não apenas pelos que se foram: vamos ficando sozinhos uns dos outros.” Mário Quintana (poeta)
Em Portugal, 17% de pessoas vivem sós. O número de americanos sem amigos próximos triplicou desde 1985. Quantas destas pessoas escolheram de facto viver sós? Temos assistido a uma reabilitação da solidão, mas na maioria das vezes ela é imposta e não procurada. A solidão imposta é muitas vezes geracional: há idosos sozinhos, mas quantas vezes os adolescentes também não são abandonados pela família em frente da internet? A diferença é que o adolescente tem uma maior capacidade de ultrapassar a solidão. Conhece mais gente, tem mais mobilidade, tem mais esperança de vida. Nos mais velhos, a solidão pode pôr em causa a vida que tiveram. Os amigos começam a partir e há menos ânimo (e energia, e oportunidades) para fazer amigos novos. Mais do que nunca, importa ‘regar’ as amizades que ficaram.
8. A solidão nas Redes Sociais
“A solidão é agora tão difundida que se tornou paradoxalmente uma experiência partilhada.” Alvin Toffler (escritor)
A internet tornou a solidão viral: as pessoas sentem-se pior quando veem a vida perfeita dos outros, dizem os estudos. Ironicamente, usamo-la para aliviar a solidão. E funciona: no Facebook, podemos reencontrar amigos, fazer amigos novos, encontrar almas gémeas que de outra maneira teriam permanecido desconhecidas. O Facebook é uma arma poderosa contra a solidão. Por outro lado, pode ter o efeito contrário se substituirmos totalmente as amizades físicas pelas amizades online. Podemos ter 4000 amigos e não ter quem nos vá ver ao hospital se for preciso. Ou seja, é bom ter amigos online. Mas encontre-os também na vida ‘real’. Olhos nos olhos.