1.É difícil pôr uma criança a ler
Bem, este é só meio mito. De facto é difícil pôr uma criança a ler: se os pais não leem. Pais que leem têm filhos que leem? Bem, também não é garantido. Há pais que se esforçam imenso e os miúdos nada. Problema: às vezes quanto mais se faz, menos eles leem, porque sempre foi assim. A missão dos filhos é nunca fazerem aquilo que os pais querem que eles fazem. O truque é influenciar sem que eles deem por isso.
2.As crianças lêem menos do que antigamente
Não é verdade, as crianças actualmente lêem muito mais do que esse tão famoso ‘antigamente’ para onde estamos sempre a fugir. O que acontece é que têm muito mais solicitações, que requerem menos esforço do que ler, e atualmente espera-se de todos os miúdos que sejam leitores. Há sempre quem não goste e quem nunca vá ser um bom leitor. Mas há mais crianças a ler.
3.Os escritores escrevem livros demasiado difíceis para as crianças
O que acontece é que, se calhar, esses livros não são para a idade delas… Não são os escritores que têm de se adequar ao seu filho, é o seu filho que tem de escolher os escritores em função daquilo que vai sendo capaz de ler. Tente dar aos mais pequenos livros adequados à sua idade, porque se lhes der livros demasiado complicados, acabam por desistir. Peça opinião aos próprios miúdos sobre os livros que vão lendo. Importante: começar cedo a habituá-los a ler, porque aquilo que acontece muito é que os miúdos crescem para lá das suas capacidades leitoras, ou seja, frequentemente há crianças de 10 anos maduras para a idade mas que não comseguem ler nada mais elaborado que o ‘Capuchinho Vermelho’. Ora como é que vão gostar de ler se há um desfasamento tão grande entre aquilo que conseguem ler e aquilo que lhes interessa?
4. Basta escolher um livro que seja para a idade deles
Em primeiro lugar, isso depende muito das crianças. Há quem leia muito bem com 10 anos e quem não consiga juntar duas sílabas. Também há livros ‘com bonecos’ onde depois o texto é desadequado das imagens. Além disso, a oferta é tanta que muitos pais, compreensivelmente, desistem de fazer muita investigação. O que pode fazer: peça ajuda a quem tenha filhos da idade dos seus, por exemplo.
5. É quase impossível arrancá-los ao telemóvel
Cada pessoa tem a sua forma de relaxar. Há quem jogue, há quem leia, há quem mande smiles aos amigos, há quem faça bolos de chocolate e há quem veja a telenovela. Pode sempre determinar um prazo que ache razoável para estarem ao telemóvel, mas é contraproducente dizer: “Sai lá desse jogo e vai ler”. Uma boa altura para criar o vício da leitura é à hora de dormir, por exemplo, e aí quase todas as pessoas conseguem arranjar meia hora – pronto, dez minutos – para ler qualquer coisa.
6. Não há nada a fazer se eles não lêem
Há sempre qualquer coisa que se pode tentar. Se ele lê pouco, comece por dar-lhe livros que o façam rir, ou que tenham a ver com os interesses deles. Acima de tudo, mesmo que lhe apeteça muito, não insista. Não sei se já reparou por experiência própria que nenhum de nós lê aquilo que toda a a gente insiste connosco para ler. Se ele não pega mesmo em nada, pode ajudar começar a ler-lhe alto umas páginas antes de dormir, mesmo que ele já tenha 12 anos. Além disto, nunca obrigue a ler nada, nem ofereça recompensas para ler seja o que for, nem, escusado será dizer, castigue com umas horinhas a ler…
7. É preciso um pai leitor de Saramago para criar filhos leitores
Até um pai analfabeto pode criar filhos leitores. Claro que é mais provável que uma criança que cresça numa casa cheia de livros se torne leitora do que uma criança que cresça numa casa onde o único livro é o de receitas. Mas o que importa é o envolvimento dos pais. Se a criança vir a leitura como um acto valorizado, mais facilmente achará que ler aumenta o seu ‘prestígio’. ‘Acto valorizado’ não quer dizer grandes sermões sobre aquilo que os livros podem fazer por eles, caso em que farão tudo na vida menos chegar perto deles. Quer dizer ouvir os pais falarem de algum livro que gostaram de ler, ou ver livros na mesa de cabeceira deles. E leitura não quer dizer necessariamente Saramago, pode ser o jornal da região, um livro de receitas ou a sua revista preferida (sim, a ACTIVA): o que interessa é o entusiasmo pela leitura, porque a paixão é muito mais contagiante do que uma ordem. Claro que também há crianças que crescem em casas cheias de livros e não lhes ligam nenhuma, mas aí geralmente é por overdose e espírito de contradição (ou têm um irmão que se farta de ler e querem marcar a diferença sendo exatamente o oposto…)
8. Torná-los leitores é obrigação da escola
Ensiná-los a ler, talvez, mas se a criança só contacta com os livros na escola e só pega neles para fazer um trabalho de casa, provavelmente nunca conseguirá ver um livro como um prazer, e se um livro não for um prazer, nunca se tornará num hábito.
Guarde um cantinho em casa para ele ter a biblioteca dele e converse sobre aqueles que ele mais gostou de ler. Se tiver tempo de ler alguns deles será ainda melhor, porque saberá do que é que ele está a falar (mas isto é uma conversa descontraída, claro, não se vai pôr a exigir-lhe uma ficha de leitura nem a pedir-lhe que resuma a obra). Acima de tudo, nunca dizer: “Quando fores mais velho, vais-me agradecer por teres lido isto…” ou “Se lesses mais, terias melhores notas.”
9. Um livro deve ser educativo
Porquê? As pessoas também não têm de ser todas professoras… Há muitas coisas que um livro pode ser: educativo, divertido, para rir, para chorar, para pensar, para não pensar… Todos os tipos de livros devem fazer parte da experiência dele, como todos os tipos de comida devem fazer parte da alimentação. Aliás, se pensarmos bem, fartámo-nos de ler (e comer) porcarias e não nos fizeram mal nenhum… (enfim, achamos nós)
10. Um livro deve ser muito bem tratado
Cuidado com a cerimónia… Um livro deve ser uma pessoa de família, não uma visita.
Não exija que os livros dele estejam todos muito limpinhos. É melhor que tenham dedadas de chocolate ou de marmelada e estejam lidos, do que passarem impolutos – e sem nunca serem lidos – para a próxima geração.