“Uma noite, ao jantar, o Rex, então com 4 anos, perguntou se não teria passado a vida inteira num sonho. Os filósofos colocam essa pergunta há eternidades. Mas nunca ninguém a tinha feito ao Rex.”
Premissa do livro: as crianças são filósofos de primeira água. Em ‘Como educar um filósofo’ (Ed. Lua de Papel) Scott Hershovitz, professor catedrático de Direito e Filosofia na Universidade de Michigan, parte das conversas com os seus dois filhos, Hank e Rex, para levantar questões como Será que Hank pode beber um refrigerante?’ ou ‘Rex tem direitos sobre os seus peluches?’
Que as crianças são filósofos em miniatura não surpreende nenhum pai ou mãe, e não é tão estranho como isso. Afinal, ponto 1 estão a descobrir o mundo, tudo é novo e portanto ainda não perderam o interesse e põem tudo em causa, e ponto 2, como são o elo mais fraco da sociedade também lhes interessa pôr em causa as regras de que se faz o seu mundo, muitas das quais abertamente injustas. E a maioria dos adultos ficaria desconcertada com muitas perguntas, simplesmente porque põem em causa o ‘nosso’ mundo e a forma como está organizado. Geralmente não pensamos muito, estamos habituados que as coisas sejam como são. As crianças ajudam-no a repensar o universo (e os peluches).
Dito isto, o autor encontrou uma forma que funciona de mostrar como podemos ver ‘filosofia’ em tudo. E este não é um livro (apenas) sobre filosofia, mas sobre a forma como explicamos o mundo às crianças. O autor fala sobre direitos, castigos, autoridade e vingança (‘Porque eu disse!’ será uma resposta legítima?) sobre palavras proibidas, sobre moral, sexo e género, sobre o ceticismo e a fada dos dentes, para acabar com ‘Deus existe?’
Ao contrário do que parece, é um livro interessantísismo até para quem não tem filhos nem é professor (nem filósofo), porque não é um livro nem de gracinhas infantis nem (só) sobre a educação. Scott Hershovitz parte das crianças e das suas por vezes espantosas perguntas (‘Porque é que os dias continuam a acontecer?’) para nos reunir a todos em volta de perguntas que sempre interessaram à Humanidade, e não apenas às suas crianças.
Além de muitas histórias divertidas, poéticas e inteligentes, ainda nos apresenta muitas teorias e autores de maneira igualmente imaginativa. No fim do livro, podemos ainda não ser filósofos, mas sentimos que ficámos, de alguma maneira, mais atentos ao mundo que nos rodeia. Se a filosofia for, nas palavras de Rex ‘A arte de pensar’, então o livro terá cumprido o seu objetivo. Fazer-nos pensar.
‘Como educar um filósofo: as grandes perguntas dos mais pequenos’, Scott Hershovitz, Lua de Papel , E20,23