Abriu em Lisboa o primeiro franchising da marca Café Joyeux, fora de França. Este espaço que tem na inclusão de pessoas com perturbações cognitivas a sua razão de ser, nasceu na sequência do acordo de aliança celebrado entre a Fundação Émeraude Solidaire e a Associação VilacomVida. Filipa Pinto Coelho é a mulher por trás de todo este projeto. A mentora do projeto vive esta diferença de olhar diariamente porque ela própria tem um filho de 5 anos com dificuldades intelectuais e de desenvolvimento. É por isso uma apaixonada por esta causa e foi essa mesma entrega que passa na entrevista que deu à ACTIVA, em que reforça a importância de um contacto mais próximo, regular e positivo com a diferença

– Como surgiu este projeto em França?

A história dos Cafés Joyeux começou quando, numa viagem de barco, o fundador dos Cafés Joyeux, Yann Bucaille, foi abordado por um jovem com autismo, o Theo (hoje imagem no logotipo), que lhe disse: “Capitão, eu gostava muito de ter um trabalho e de me sentir útil. Tu que és empresário, podes arranjar-me um emprego?”. Perante a resposta negativa por parte de Yann Bucaille, o jovem ficou triste e esta tristeza incomodou o fundador dos Cafés Joyeux, levando-o a criar este projeto, juntamente com a sua esposa, Lydwinne Bucaille.

– E a oportunidade depois de o trazerem para Portugal através da Associação VilacomVida?

A Associação VilacomVida, IPSS nascida em 2016 com o objetivo de aproximar a sociedade da diferença, para desmistificar preconceitos e assim beneficiar a inclusão de pessoas com dificuldades intelectuais e do desenvolvimento (tais como trissomia 21 ou as perturbações do espectro do autismo), preparava-se para lançar um conceito de restauração inclusiva muito semelhante – o CafécomVida – que esteve aberto como projeto-piloto deste modelo durante 18 meses em Santos – de Outubro de 2018 a Março de 2020. Quando soubemos da abertura dos Cafés Joyeux em França – em vez de “reiventarmos a roda” – convidámos a marca a internacionalizar a sua presença e missão, começando por Lisboa, e por termos a mesma visão sobre esta necessidade de incluir a diferença naturalmente nas nossas vidas, ela imediatamente aceitou.

– Qual o objetivo dos Café Joyeux?

O Café Joyeux é a primeira família de cafés-restaurantes solidários e inclusivos que tem por missão trazer a diferença para o centro das nossas vidas e das nossas cidades, empregando – para então formar – jovens-adultos com dificuldades intelectuais e do desenvolvimento (DID). Para convidar cada vez mais pessoas a conhecerem a mais-valia na diferença, os cafés-restaurantes Joyeux propõem uma carta deliciosa, composta por pequenos-almoço, almoços e lanches, produzidos no local com produtos frescos e da estação, por uma equipa inclusiva e motivada composta por estes jovens e por tutores especializados na área da restauração, que têm por objetivo ajudar estes jovens a serem colaboradores autónomos e polivalentes no setor da restauração. Para favorecer esta autonomia, todos os processos, receitas, equipamento, comunicação, são pensados de forma inclusiva. Um aspeto muito inovador no neste conceito é: Contratar para Formar, ao invés de formar para, quem sabe, contratar. Ou seja, os jovens-adultos que estão aqui empregues, estão também em formação, mas recebem o seu salário e têm um contrato a tempo indeterminado. NO final do seu curso de formação – a escola Joyeux – os colaboradores é que decidem se pretendem continuar empregues connosco ou ir abordar outras experiências de trabalho no mercado, então já mais preparados e autónomos.

– Como encontraram fundos (dinheiro!) para o levar a cabo? Que apoios existiram a nível internacional e nacional?

Para abrir um café-restaurante Joyeux é feita uma angariação de fundos junto de particulares e empresas nacionais (alguns de raiz francesa com presença em Portugal, já que é uma vantagem conhecerem o sucesso do conceito em França), que são assim convidados a fazer parte integrante desta missão. Ao longo dos últimos 3 anos, a VilacomVida tem desenvolvido diversas iniciativas neste sentido – nomeadamente concertos solidários anuais, que reúnem um cartaz sempre muito interessante, já que conta com artistas portugueses incríveis que dão a voz pela causa – e também, já num novo formato que estreámos em Maio deste ano, um leilão solidário que também contou com artistas extraordinários. Para além disso, temos abordado diversas empresas, que se tornam parceiros muito determinantes para a missão e que hoje fazem caminho connosco, na perspetiva de contribuirem para a rápida sustentabilidade do projeto.

– Foi difícil encontrarem o espaço certo?

Não foi fácil mas tudo o que dá trabalho acaba por compensar. Este espaço tem de facto uma situação privilegiada – em frente à Assembleia da República – mas por isso tem também condições de aluguer exigentes. Cabe-nos agora provar que o modelo funciona e que será sustentável. A avaliar pelo número de clientes que temos recebido e feedback tão positivo, estamos muito animados.

– Quantas pessoas trabalham no café e como foram selecionadas?

Trabalha no café uma equipa inclusiva formada por 3 profisssionais da restauração, que são também tutores destes colaboradores, e 9 jovens-adultos com dificuldades intelectuais e do desenvolvimento. Foram selecionados de 3 formas distintas: a partir dos projetos de capacitação em contexto inclusivo que a VilacomVida já desenvolve para trabalhar a autonomia destes jovens-adultos, a partir da rede de parceiros sociais que trabalham neste setor e diretamente através de contactos das famílias que tiveram conhecimento do projeto, ou mesmo da parte dos próprios candidatos – como foi o caso do Sebastião, que hoje faz também parte da equipa.

– Qual a natureza das perturbações cognitivas de que estamos a falar?

Estamos a falar de dificuldades intelectuais e do desenvolvimento, tais como a trissomia 21, perturbações do espectro do autismo, ou casos de défice cognitivo que impactam o percurso escolar.

– Como está organizado o trabalho? Quais as suas tarefas?

Os colaboradores foram recrutados para serem formados em 4 áreas essenciais na restauração: serviço de mesa, serviço de cozinha, balcão (barista) e caixa. Começam pela área com a qual têm mais empatia e interesse e durante 6 meses sensivelmente – dependendo da sua capacidade – estão a ser formados nesta função. Ao final de 6 meses rodam para a função seguinte, e assim sucessivamente até ao final dos cerca de 2 anos. Os tutores ensinam, numa primeira fase, as tarefas de base e depois ficam na retaguarda, para assegurar que o ritmo, a qualidade, o serviço, o atendimento, são cumpridos com rigor e profissionalismo. Por exemplo, na cozinha já temos muita autonomia por parte de alguns dos colaboradores – que produzem já uma receita do início ao fim – na caixa já temos colaboradores autónomos também, no serviço a mesma coisa. Os jovens trabalham por turnos de 4 a 6 horas, mas já temos casos que pedem para aumentar a carga horária semanal, o que é um excelente sinal!

– Que tipo de contratos têm estes colaboradores?

Os jovens são admitidos, estão nos primeiros 3 meses ao abrigo de um contrato de formação em contexto de trabalho e deste seguem para um contrato a tempo indeterminado.

– Que tipo de oferta têm para quem vos visita?

Pequenos-almoços – o sumo de laranja natural, croissant ou baguette mista, – almoços que contam sempre com um prato quente – o best seller é a lasagna de salmão e espinafres – sempre duas ou 3 saladas variadas e uma ou duas quiches da especialidade – onde não poderia faltar a famosa quiche Lorraine francesa, claro ????. Temos também deliciosas sobremesas para os mais gulosos, como o cheesecake, sobremesas descostruídas em taça ou o brownie. Ao lanche, os chás, os croissants quentes, bolo caseiro à fatia e ainda muitas outras opções que estão a ser introduzidas aos poucos, para que haja tempo de aprendizagem suficiente para todos.

– Qual o destino dos lucros obtidos?

Os lucros obtidos destinam-se a abrir mais cafés-restaurantes Joyeux para assim empregar mais e mais pessoas incríveis com tanto para nos revelar.

– Estão a contratar mais colaboradores? Como podem ser feitas as candidaturas?

Iremos em breve iniciar novos processos de recrutamento para Cascais – que abrirá portas antes do final do primeiro semestre de 2022 – e para um cliente-empresa que estreará em breve o conceito corporate do Joyeux. Os interessados deverão enviar a sua candidatura para recrutamento@joyeux.pt.

– Quais são os objetivos de futuro?

Abrir cinco cafés-restaurantes Joyeux no espaço de cinco anos, adquirir assim a sustentabilidade do projeto e continuar o plano de expansão com os lucros obtidos com as vendas a partir desse momento.

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