É a primeira mulher francesa a receber o Nobel da Literatura, sendo que, no mundo inteiro, apenas 18 mulheres conseguiram este feito. Uma discrepância gritante que ressalta aos olhos de uma autora que escreve sobre tudo o que viveu e que faz da palavra liberdade. A mesma que reivindicou no seu discurso de aceitação do galardão. “Compartilho o orgulho [deste prémio] com quem, de um modo ou de outro, deseja mais liberdade, igualdade e dignidade para todos os seres humanos, independentemente do seu sexo e género, da sua pele e cultura”, sublinhou Annie Ernaux.
Com um vestido Chanel, de linhas minimalistas, que lhe assentava na perfeição, mas que em nada ofuscava a sua mensagem, a escritora, de 82 anos, prosseguiu: “Dos meus antepassados, homens e mulheres esforçados nas tarefas que os fizeram morrer cedo, recebi a força e a raiva suficientes para ter o desejo e a ambição de construir um lugar na literatura, nesse conjunto de vozes múltiplas que me acompanharam e me permitiram o acesso a outros mundos e a outros pensamentos, incluindo o de me revoltar contra ela e o de querer modificá-la. Para inscrever a minha voz de mulher e de desertora social no que se apresenta sempre como um lugar de emancipação, a literatura”.
Através das palavras que transforma em livros, Annie Ernaux pretende “reparar a injustiça social ligada à classe atribuída pelo nascimento”. E, durante a cerimónia oficial, que aconteceu em Estocolmo, a autora ainda sublinhou: “Ao escrever num país democrático, continuo a questionar-me pelo lugar que as mulheres ocupam no âmbito literário. A sua legitimidade para produzir obras ainda não está conquistada. Há homens no mundo inteiro, e também nos círculos intelectuais ocidentais, para quem os livros escritos por mulheres simplesmente não existem, nunca os citam. O reconhecimento da minha obra pela Academia sueca é um sinal de esperança para todas as escritoras”.