Doutorada em Física, foi a primeira reitora mulher numa universidade pública portuguesa, a Universidade de Aveiro, e presidente da EUA (European University Association – Institutional Evaluation Programme) que representa e apoia instituições de ensino superior em 48 países.
“Nunca me senti em desvantagem por ser mulher. Mas nunca me senti pioneira. Acho que à custa de trabalho tudo se consegue. É óbvio que, por ser mulher, tive de trabalhar o dobro daquilo que teria de fazer se tivesse sido homem. Mas também tive muito apoio, em casa e na universidade. Candidatei-me a reitora porque houve colegas que me entusiasmaram e incentivaram para o fazer, porque não fazia parte dos meus planos.
Se tive medos? Tive: de não conseguir levar a nau a bom porto, de haver dificuldades inultrapassáveis, de falhar. Quando fui eleita para a EUA, aí o caso foi diferente, havia outros candidatos. A associação tinha 800 universidades e a minha principal dificuldade era entender as dificuldades dos sistemas superiores. Portugal, Espanha, França e Alemanha são comparáveis, mas para além destas fronteiras as universidades enfrentam dificuldades diferentes.
Ainda há muito a fazer nas nossas universidades, e as dificuldades radicam sempre nas mesmas questões: as carreiras, as diversas formas de autonomia, e o financiamento. Em Inglaterra, por exemplo, existe um sistema de empréstimos para os estudantes. Na minha opinião, esse não é o caminho para Portugal, porque estamos a comprometer as gerações vindouras. O que fazemos em Portugal é formar profissionais tão bons que se transformam numa das nossas principais exportações. Continuo a achar que Portugal tem capacidade de absorver os seus universitários, não terá é o mesmo retorno imediato.
Para mim, a educação é o único elemento capaz de transformar a vida de uma pessoa. Porque lhe dá capacidade de interpretar as situações, porque lhe ensina a antecipar mudanças e a lidar com elas. Mas faz parte de nós acreditarmos no seu poder. Enquanto houver necessidade de haver educação obrigatória, ainda não chegámos lá.
Houve muitíssimas conquistas importantes para as mulheres, mas a que me parece mais relevante foi a conquista do direito de voto, que começou com as suffragettes de Inglaterra. Antes disso, as mulheres não contavam porque não tinham o poder de eleger ninguém.
Porque é que ainda não vemos tantas mulheres como homens em cargos de decisão? Porque faltam duas coisas: insistência e tempo. Temos de continuar a tentar ativamente mudar o mundo mas não basta garantir uma percentagem de mulheres no Parlamento, por exemplo. As mulheres não são nem mais nem menos competentes que os homens só porque são mulheres. Tem mesmo de haver paridade: homens e mulheres têm de contribuir igualmente para o funcionamento da sociedade. A fazer as mesmas coisas? Se calhar não, porque nem todos queremos fazer as mesmas coisas. Mas a educação tem de motivar o desaparecimento das desigualdades. E temos de nos ajudar uns aos outros. Os homens apoiam-se naturalmente. As mulheres não fazem isto, nunca percebi bem porquê. A Madeleine Albright, secretária de Estado norte-americana, dizia que ‘o inferno deve ter um lugar especial para as mulheres que não ajudam outras mulheres’.
E depois tem de haver políticas de apoio à família. Mas essas políticas têm de ser pensadas. Por exemplo, em Inglaterra as mulheres que têm bebés podem ficar em casa até 3 anos. Mas isto só deve ser feito se a mulher quiser, não deve ser imposto. Tem de haver várias formas de dar às mulheres igualdade de oportunidades. Se calhar o melhor apoio não é ficar em casa, é dar às mulheres oportunidades para continuarem a trabalhar se assim o quiserem, criando uma rede de apoio. Por exemplo, em Aveiro temos uma rede de transportes péssima. E de certeza que isto acontece noutros pontos do país. Como é que os pais podem ir pôr as crianças à creche? E tudo isto são questões práticas em que não pensamos quando pensamos em igualdade de género. De que é que serve haver quotas para as mulheres se elas não têm com quem deixar os filhos?”