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Imagine que cada vez que se prepara para dar mais uma dentadinha numa deliciosa iguaria a sua mãe ou a sua tia buzinam ao ouvido: “Queres ser gorda, queres?” Respire fundo e faça mais um esforço. Visualize os seus pais a dizerem-lhe coisas como “A tua irmã arranjou aquele emprego e tu não passas da cepa torta.” Agora, imagine o que é passar grande parte da vida a ouvir mensagens semelhantes. O resultado mais provável é uma auto-estima que ande pelas ruas da amargura. Marta e Sofia (nomes fictícios), passaram por isso e contam-nos as suas histórias.

Marta não gosta da sua imagem. Dos pés à cabeça, há poucos cantos que escapem à inquisição desta estudante universitária de 24 anos: as pernas estão erradas, a barriga está errada, tal como o peso, a altura, o peito. Para não se martirizar com o assunto, aprendeu a brincar com isso. “Os meus amigos fartam-se de ralhar comigo. Nem dou por isso, porque me habituei a fazer piadas sobre o assunto. É uma maneira de o exorcizar.”

Não sabe muito bem quando começou a sentir-se assim, mas as comparações com a mãe, que lutava com um problema de excesso de peso, começaram cedo. “O meu pai costumava dizer-me, em pequena, para me irritar, que se eu não parasse de comer, ia ficar igual à minha mãe”. A adolescência não lhe deixou grandes saudades. “Até aos 15 anos, não tive muitos amigos. O facto de ser a melhor aluna da turma também não ajudava; ninguém gostava de mim.” O primeiro namorado, só depois dos 18. “Era possessivo e autoritário. Criticava tudo o que eu dizia, fazia, vestia. Mesmo assim, foi uma relação que se arrastou por quatro anos. Não suportava a ideia de o perder.”

À semelhança de Marta, a falta de auto-estima de Sofia, uma enfermeira de 35 anos, também passa por uma relação pouco pacífica com o seu corpo. “Nunca olhei para o espelho e disse para mim mesma: ‘Bolas, estou mesmo gira!’ O máximo que me saiu foi um ‘Hoje nem estás muito mal’.”


A mais introvertida e calada de três irmãs, Sofia acha que passou muitos anos na sombra da mais velha. “Ela era bonita, boa aluna, independente, tinha-se em muito boa conta. Ainda hoje tem. Conseguia sempre aquilo que queria”, recorda. As inevitáveis comparações com notas escolares, por parte dos pais e familiares, eram constantes. “Era com ela que a família ou amigos dos meus pais falavam, quando iam lá a casa. Sentia-me sempre esquecida, quase invisível”, recorda. Dessa época também se recorda da tia a dizer-lhe para ter cuidado com a comida porque “os homens não casam com gordas”. Talvez por isso tenha andado em luta cerrada contra a balança, durante uns anos. “Nem quando estive mais magra me sentia bonita. É realmente verdade aquilo que os psicólogos dizem, os gordos infelizes não passam a esbanjar felicidade quando perdem peso… a falta de auto-estima está lá sempre, gordos ou magros. Achamos sempre que nunca estamos bem, por muito que se perca peso.” Já começou a fazer as pazes com o corpo. Agora as inseguranças são de outra ordem. “Sou muito céptica em relação a mim. A minha primeira ideia é pensar que não vou conseguir concretizar um projecto, que vai tudo correr mal… e no final, quando tudo acaba bem, pergunto-me por que raio é me consumo com a minha falta de capacidade, quando até não sou assim tão má… pelo contrário (risos).”

“Podem passar uma vida inteira a boicotar-se a si mesmos”

Todas nós já nos rebelámos contra alguma parte do nosso corpo. Mas quem sofre de uma falta de auto-estima crónica tem problemas mais graves a resolver.


Geralmente, as pessoas com pouco amor-próprio têm um perfil comum. “Utilizam muitas frases negativas e, quando ligam o ‘complicómetro’, acham problemas em tudo. São mais ‘cinzentos’, fecham-se mais no seu casulo. Até a postura os denuncia: não põem os ombros para trás, não erguem a cabeça”, descreve Vera. Falta-lhes segurança e assertividade, ou seja, dizem pouco aquilo que sentem ou pensam com medo de serem criticados ou de falharem. Têm mais tendência para se sofrer de fobias, medos, ataques de pânico ou ansiedade generalizada. Podem passar uma vida inteira a boicotar-se a si mesmos. Vera tenta cortar esse mal pela raiz. “Há três frases proibidas no meu consultório: ‘não consigo’, ‘não sou capaz’ e ‘isso é muito complicado’ . Depois peço para terem atenção à quantidade de vezes que as utilizam e chegam à conclusão de que as dizem de cinco em cinco minutos. Reforçam negativamente a sua auto-estima e acabam mesmo por não ser capazes.”

A timidez não os caracteriza exclusivamente; podem até ser faladores e os cómicos de serviço. “O facto de falarem muito em público é uma máscara para esconderem a falta de segurança e de auto-estima. Isto acontece principalmente com os homens; eles usam a máscara do bonacheirão que se evidencia em público, mas que se assusta assim que se fala numa relação amorosa.”


Amar demais os outros sem gostar de si


“As pessoas que me procuram para tratar problemas de auto-estima costumam dizer-me que atraem as pessoas erradas”, conta Vera. “Elas próprias estão menos abertas a pessoas saudáveis porque sentem que, emocionalmente, não estão saudáveis. Pensam que não têm qualidades suficientes para os atraírem”, observa a psicóloga que também lhes consegue traçar um perfil de vida afectiva: “Caracterizam-se pelo desequilíbrio: ou são demasiado passivos ou até agressivos, uma situação que acontecem mais aos homens e que corresponde a um medo de perderem a parceira. As mulheres costumam ser mais passivas e até aceitam situações que vão contra os seus valores, para não perderem o parceiro. Mantêm-se em relações em que não estão satisfeitas porque acham que não conseguem melhor.”


A psicóloga e terapeuta familiar Robin Norwood descreveu estas situações no seu livro ‘Mulheres que amam demais’ (da Sinais de Fogo). Ela é uma das autoras que mais estudou a dependência emocional feminina e que lançou os grupos de ajuda para mulheres que estão neste tipo de relacionamentos obsessivos. “Amar demais não significa amar demasiados homens ou apaixonar-se com frequência. Significa terem uma obsessão por um homem e designá-la por amor, permitindo-lhe que ele controle as emoções e grande parte do seu comportamento delas”, descreve a autora, que fala ainda de uma característica comum a este tipo de mulher: “A sua auto-estima é perigosamente baixa e, no fundo, não acredita que merece ser feliz.” Também “evitam concentrar-se na responsabilidade que têm para consigo” e não são atraídas por “homens carinhosos, estáveis e de confiança, que mostrem estar interessados em si” por os acharem “muito aborrecidos”.



A ditadura da imagem não é a única culpada


De onde vem esta tendência negativa para nos autoflagelarmos e boicotarmos as nossas próprias vidas? Será consequência de uma sociedade onde só os mais belos e talentosos triunfam? Diz-se que a moda, a televisão e o cinema puseram a fasquia da beleza feminina demasiado alta, de modo a venderem mais. Fizeram prevalecer um padrão de beleza que não correspondia ao desejável – mulheres demasiado altas e magras – e que poucas podem alcançar.


Para Vera Teixeira, as razões para a baixa auto-estima são mais profundas que isto. “Vêm ao meu consultório mulheres muito atraentes com muito baixa auto-estima e outras, menos bonitas, que estão muito bem com elas próprias.” O problema, diz Vera, começa na infância, nos primeiros quatro anos e, infelizmente, por influência de quem nos devia dar mais força. “Geralmente, as pessoas com baixa auto-estima são filhas de pessoas com o mesmo problema. Os pais queriam ter ido mais longe e não foram. Passaram-lhes mensagens como ‘Eu já tinha dito que não eras capaz!’ ou ‘És sempre a mesma coisa!’. Também lhes incutem uma enorme pressão com expressões como ‘Tens de…’ ou com comparações constantes com os irmãos. Mais tarde, trazemos isto para a vida adulta e comparamo-nos constantemente com os outros.” As crianças deviam ser mais elogiadas quando conseguem uma pequena vitória, diz, e incentivadas com frases como ‘Esforça-te porque vais conseguir!’ ou ‘Eu sabia que eras capaz!’ “Isto é o que eu digo, hoje, a adultos”, diz a terapeuta.



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