Perder peso de forma equilibrada pode ser um caminho mais ou menos longo, mais ou menos tortuoso, mais ou menos difícil. As desistências são frequentes e os reveses também. Ainda assim, quem conclui de forma bem sucedida este processo, quer tenha chegado à meta realista estabelecida, quer tenha ficado pela perda de parte do peso inicialmente pensado como objetivo, tem um novo – e potencialmente maior – desafio: manter o peso perdido. A verdade pode ser desanimadora, a taxa de sucesso a longo prazo é muito baixa. A maioria das pessoas recupera a totalidade ou parte o peso perdido nos anos subsequentes à perda ponderal.
É necessário destacar a importância do trabalho de educação alimentar realizado com o paciente ainda durante a fase de tratamento. A educação alimentar deve ser um objectivo paralelo e com igual importância ao objectivo da perda ponderal. Sem os conhecimentos necessários sobre alimentação e nutrição e sem consciência da importância da ingestão calórica em função do gasto energético – comer tantas calorias quanto as que vai gastar -, o paciente não dispõe dos conhecimentos necessários que permitam uma autogestão eficaz do peso através das suas escolhas e comportamentos.
Partindo do pressuposto que o emagrecimento aconteceu de forma progressiva e equilibrada, com um plano alimentar adequado às necessidades e estilo de vida e que paralelamente foi realizado um trabalho activo de educação alimentar, manter o peso perdido pode mesmo assim significar um grande desafio.
A gestão do peso é um processo complexo que resulta da interacção de factores comportamentais e psicossociais, pelo que, abordagens simplistas devem ser postas de parte. Os chamados preditores da manutenção do peso perdido a longo prazo devem ser estudados e potencialmente convertidos em recomendações que sirvam de auxílio neste processo. Sem entrar em explicações demasiado técnicas e de difícil compreensão, as recomendações para a manutenção do peso perdido a longo prazo são várias e de diversa ordem.
A manutenção do peso é para a vida
É importante ter claro, sem mitos ou falsas ideias, que a repetição de um comportamento alimentar e de estilo de vida desadequado culminará num novo ganho de peso. Após a fase de tratamento ninguém fica “curado”, por esse motivo deve ser interiorizado que a gestão do peso é para a vida. Surge imediatamente a questão: A “dieta” tem que ser cumprida para sempre? Dependendo do que é entendido por dieta, sim, é necessário comer de forma equilibrada e responsável “para sempre”, apesar da flexibilização da dieta ser desejável e estar até associada a uma manutenção do peso mais eficaz. Permitir-se a alguns excessos e posteriormente aplicar mecanismos autorregulatórios, através de exercício físico e de uma restrição alimentar transitória, pode funcionar bem como estratégia de manutenção do peso. A alimentação consciente fazendo diariamente escolhas inteligentes e a aplicação dos conhecimentos adquiridos no processo de educação alimentar durante a fase de tratamento, são determinantes para a manutenção do peso perdido.
Adequação do aporte energético diário em função do gasto
A manutenção do peso depende diretamente da energia ingerida. Se ingerir mais calorias do que as que o seu organismo precisa – para o peso actual, altura, idade e actividade física – vai engordar. À data da alta, o nutricionista fornecer-lhe-á possivelmente um plano alimentar isoenergético para aquele momento de vida, isto é, um plano com um valor calórico adequado à manutenção do peso, e segundo a sua idade e actividade física no momento da alta. A longo prazo, este plano terá que ser actualizado em função da sua idade e maior ou menor exercício.
O plano alimentar isoenergético contém globalmente a energia a ingerir para manter o peso, logo tudo o que é comido extra plano vai desequilibrar a balança no sentido do ganho ponderal. É por esse motivo que por vezes é prescrito um plano alimentar ligeiramente inferior às necessidades, ou seja hipocalórico, mas não tão restritivo como o ou os planos iniciais destinados à perda de peso. Este ligeiro deficit calórico diário, permite uma maior liberdade e flexibilização da alimentação na manutenção de peso, sem um controlo tão apertado das calorias ingeridas e sem “parecer que continua de dieta”.
O controlo das porções a ingerir e do apetite, assim como o conhecimento do impacto calórico de alguns alimentos no balanço energético diário são essenciais à manutenção do peso a longo prazo.
A importância da actividade física
Se a ingestão calórica é crucial, o gasto energético também o é. Relembro que as necessidades energéticas variam em função do peso (que desejavelmente não vai ser alterado), da idade, da altura e da actividade física. Não é possível mudar a altura nem a idade, mas podemos alterar as necessidades energéticas através de maior ou menor actividade física. Assim, a longo prazo quem pratica desporto ou é activo de algum modo, tem maior probabilidade de manter o peso porque possui um gasto energético superior. Até na eventualidade de alguns excessos alimentares, os activos poderão compensar de forma decisiva a maior quantidade de energia ingerida através do gasto.
Entre outras vantagens, os praticantes de actividade física terão também uma maior quantidade de massa muscular, e por isso um gasto energético em repouso superior que ajudará de forma muito mais eficaz à manutenção do peso.
A quantidade de proteína
Um aporte proteico adequado (entre 1,2-1,6g/kg/dia), dependendo das necessidades em causa, parece ser essencial à manutenção do peso. Este macronutriente, além de possuir efeitos muito desejáveis nos mecanismos do apetite e da saciedade, está associado à melhoria da composição corporal pela preservação da massa isenta de gordura.
Controlo no aporte em gordura e hidratos de carbono
À semelhança do que acontece durante o período de tratamento, é essencial controlar as quantidades de gordura e de hidratos de carbono, principalmente açúcares. Diminuir substancialmente o consumo de açúcar, refrigerantes, bolachas, biscoitos e outros produtos de pastelaria e confeitaria, snacks, fast food e refeições pré-cozinhadas, produtos de charcutaria, entre outros, é impreterível na manutenção ponderal. O uso indiscriminado de azeite ou qualquer outra gordura por mais “saudável” que seja e o consumo de hidratos de carbono que não açúcares em excesso, também potenciam o ganho de peso.
Importância da ingestão de hortofrutícolas e de fibra.
Paralelamente ao controlo da ingestão de gordura e hidratos de carbono, a manutenção ponderal é facilitada pela elevada ingestão de fruta/legumes e de fibra em geral. Os hortofrutícolas são ricos em micronutrientes e pobres em energia relativamente aos alimentos descritos anteriormente. A quantidade de fibra neles contida, assim como a proveniente de cereais integrais, potencia a saciedade, diminui o índice glicémico, diminui a absorção de gordura, entre outras funções.
Mecanismos autorregulatórios
A auto-monitorização é um comportamento tão simples quanto uma pesagem quinzenal ou mensal. Este comportamento também pode existir ao nível da ingestão alimentar e das escolhas diárias quando há a consciência real do conteúdo nutricional e calórico dos alimentos, com uma consequente restrição ou flexibilização consoante o que é ingerido. A auto-monitorização também pode existir ao nível da actividade física, por exemplo através de aplicações de telemóvel com pedómetro e/ou com o cálculo aproximado do gasto energético em função da actividade. Esta contagem dos passos funciona bem como “lembrete” da actividade efetivamente realizada ou não diariamente e do seu impacto no gasto diário. Outro mecanismo autoregulatório desejável é a compensação de eventuais excessos alimentares com exercício físico e uma maior restrição calórica dos dias seguintes ou pelo contrário, uma maior restrição alimentar devido a uma diminuição da actividade física.
Competências de autoeficácia
A autoeficácia baseia-se na confiança pessoal na habilidade em conciliar os obstáculos de vida, os contratempos diários e as próprias emoções na manutenção do peso e igualmente nas expectativas de sucesso de todo o processo. A autoestima, a segurança pessoal, o positivismo, a autonomia e a capacidade de assumir e manter o controlo da própria vida parecem ser igualmente determinantes na manutenção do peso perdido. Não é por isso descabido, que na presença de dificuldades nesta área seja procurada ajuda psicológica na gestão de stress, motivação, etc.
Consulta de nutrição pós-alta
A experiência pessoal mostra que consultas de nutrição pós-alta com uma regularidade semestral ou anual para adequação do plano alimentar à idade, actividade física ou novas rotinas, funcionam igualmente de forma muito positiva na manutenção do peso a longo prazo. Sendo a obesidade uma doença crónica, é perfeitamente justificado um acompanhamento mais ou menos regular por parte do nutricionista. A relação de compromisso e confiança estabelecida com o profissional também inibe certos comportamentos propícios ao ganho de peso pela necessidade de mostrar bons resultados na consulta seguinte.
Na eventual incapacidade de controlar o peso após a alta, o regresso à consulta não só é desejável como praticamente essencial à manutenção do peso a longo prazo.