Nos tempos que correm, estudar, entrar no mercado de trabalho, conseguir estabilidade profissional e financeira são prioridades cada vez mais tidas em linha de conta antes de constituir uma família. É por este facto comum a opção pelo adiamento da maternidade.
De acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística, 31,5% dos nascimentos ocorre depois de a mulher ter 35 anos de idade (dados de 2016); e esta tendência tem vindo a acentuar-se. Vários estudos demonstram que as mulheres com mais idade são em geral mais instruídas, têm uma estrutura emocional mais forte, um melhor equilíbrio profissional e financeiro, e estão mais vocacionadas e disponíveis para amamentar.
Contudo, embora existam vantagens para quem decide ser mãe depois dos 40 anos, é preciso ter em conta a maior dificuldade em conceber e os riscos associados. Esta realidade, exige uma preparação prévia adequada para evitar ou minorar alguns problemas previsíveis.
Riscos na gravidez com a idade
Conforme a mulher vai envelhecendo, a quantidade e a qualidade dos óvulos vai diminuindo e torna a gravidez mais difícil. A probabilidade de engravidar espontaneamente aos 40 anos ronda os 5% a 10%. Acima dos 45 anos é praticamente impossível consegui-lo com os próprios óvulos ou sem ajuda para o fazer. A idade da mulher é também um fator que afeta o sucesso de todos os tratamentos de fertilidade, havendo certos riscos a ter em consideração:
- Maior taxa de aborto espontâneo (25% das gestações aos 40 anos e 54% aos 44 anos);
- Maior incidência de diabetes gestacional e hipertensão arterial (pré-eclâmpsia e eclâmpsia);
- Aumento da frequência de alterações cromossómicas fetais – a principal é o Síndrome de Down (probabilidade de 5% aos 40 anos e 10% aos 44 anos). Estas são também razões que explicam a maior dificuldade em engravidar e o aumento da taxa de aborto com a idade;
- Maior incidência de problemas na placenta e no parto;
- Maior incidência de baixo peso fetal e prematuridade – 15% dos partos;
- Maior incidência de nados mortos e problemas na saúde dos recém-nascidos.
Como preparar a gravidez e avaliar o risco
Qualquer mulher que pretenda engravidar deve consultar o seu médico assistente e expor o seu propósito. Com uma correta história clínica e alguns exames auxiliares de diagnóstico, é possível avaliar a condição física da mulher para a gestação, acautelar alguns riscos e até identificar fatores que possam constituir causas de subfertilidade ou infertilidade, justificando o encaminhamento para consultas especializadas. Desta forma, podem ser obviadas perdas de tempo que se venham a sobrepor à idade da mulher.
Passo a citar algumas considerações sobre a avaliação clínica referida, especialmente a ter em consideração na mulher que pretende engravidar depois dos 40 anos.
— É diferente ter 40 ou mais anos de idade, ser saudável e não ter excesso de peso, do que ser fumadora e ter doenças associadas como hipertensão arterial, doenças cardíacas, tiroide ou diabetes, e/ou doenças do sistema nervoso. Nesse sentido, é fundamental tomar medidas consequentes, adaptando estilos de vida (plano de exercício físico, evitar o stress e a ansiedade), dietas e/ou medicação adequada, para equilibrar devida e atempadamente toda a situação ou entidade clínica que venha a constituir uma dificuldade ou risco previsível para a gravidez.
— Exames auxiliares imprescindíveis complementares na avaliação clínica e da capacidade reprodutiva:
- Análises gerais de sangue, incluindo a identificação do grupo sanguíneo, virologia e doseamento da TSH, AMH, FSH e estradiol
- Ecografia ginecológica para avaliação do útero e dos ovários e deteção de anomalias do aparelho reprodutor – quistos, miomas, etc)
Se a história clínica o justificar, sugere-se ainda:
- O estudo da permeabilidade das trompas de Falópio, com recurso a uma Histerossalpingografia,
- Não esquecer o fator masculino, a relação entre a idade do pai e problemas genéticos e hereditários; pode ser importante conhecer a qualidade do esperma por via dum espermograma.
Nas mulheres acima dos 40 anos, passados 6 a 8 meses de vida sexual regular sem conseguir engravidar, sugere-se que recorram a unidades especializadas de infertilidade, para uma avaliação técnica mais cuidada e/ou a realização de tratamentos tais como fertilização in vitro (FIV).
Embora muitas destas mulheres não tenham problemas de fertilidade e venham a conseguir a gravidez espontânea mais tarde (porque a probabilidade de engravidar é previsivelmente baixa pelas razões que já citámos), todo o tempo passado pode constituir uma agravante na ajuda possível para conseguir a gestação versus nas condições/risco da própria gravidez.
Com a FIV, é feita uma estimulação considerável dos ovários, de forma a conseguir que vários óvulos nesse ciclo menstrual se desenvolvam e amadureçam (situação que sem esta medicação só seria possível com vários meses de ciclos ovulatórios). Esses óvulos são posteriormente colhidos através de uma aspiração controlada, e num laboratório especializado, e fertilizados com os espermatozoides normais.
O desenvolvimento dos embriões resultantes é então acompanhado em laboratórios especializados e selecionados os de melhor qualidade para transferir para o interior do útero. A cultura prolongada de embriões com recurso a alta tecnologia (Time-Lapse) e a embriologistas especializados é recomendada e altamente vantajosa na seleção de embriões e no consequente aumento da taxa e viabilidade da gravidez em mulheres acima dos 40 anos.
Quando não se obtêm resultados através destas técnicas com recurso a reprodução medicamente assistida, existe ainda a possibilidade de utilizar óvulos doados. A utilização de óvulos de dadoras aumenta significativamente a probabilidade de engravidar e diminui o risco de aborto espontâneo e de anomalias cromossómicas.
Conseguida a gravidez, destaca-se a importância de um bom acompanhamento especializado. Os grandes avanços verificados na medicina nos últimos anos, permitem diminuir os riscos e impactos associados à idade nas mães e fetos, com diagnósticos precoces e atitudes consequentes e atempadas.