5 palavras de ordem para sobreviver na selva

"Durante dois anos a professora da minha filha fez-me acreditar que a Luísa era burra porque não conseguia aprender a ler e a escrever como as outras crianças." Margarida, 33 anos, aceitou a avaliação – "ela é minha filha e gosto dela de qualquer forma" – mas quando Luísa ficou para trás, no segundo ano do primeiro ciclo, e conheceu uma professora nova, a situação mudou. "Perder o ano foi o melhor que lhe aconteceu, porque foi esta professora que nos alertou para o facto dela ser disléxica."


O que sucedeu com Margarida não é uma história única: entre 5 a 10 por cento das crianças sofrem de dislexia e muitas são aquelas rotuladas de ‘pouco inteligentes’ nos primeiros anos de escola. Mas o problema é de uma ordem completamente distinta: "a aquisição da leitura e da escrita é constituída por estratégias complexas, que a maior parte das crianças domina, desde que exista o grau de maturidade neuropsicológica suficiente, num ambiente pedagógico favorável; pode, no entanto, tornar-se numa competência difícil de alcançar para crianças que, embora totalmente normativas nas outras áreas de desenvolvimento, apresentam problemas específicos de leitura e escrita. Encontramo-nos neste caso perante a dislexia", explica a psicóloga e especialista na área Vitória Ortega.

Não é uma questão de inteligência

É o nosso hemisfério esquerdo do cérebro que se ‘especializou’ no processamento linguístico. Ora, o que se passa, no caso dos disléxicos, é que este apresenta uma taxa de processamento inferior. Inicialmente, pensava-se que o problema era determinado por uma perturbação neurológica provocada por um traumatismo.

Mas há medida que a investigação se intensificou, comprovou-se que, na maior parte dos casos, não havia associação com qualquer tipo de trauma e que este tipo de perturbação aparecia em crianças com inteligência normal, por vezes até superior, sem problemas físicos, neurológicos, emocionais ou sociais, que não provinham de meios sócio-económicos-culturais desfavorecidos e que frequentavam processos de ensino apropriados. "Isso permitiu ao especialistas distinguir entre uma dislexia adquirida por traumatismo de uma dislexia evolutiva (ou de desenvolvimento), que se deve a um défice de maturação neuronal do hemisfério esquerdo. No primeiro caso, o sujeito, que sabe ler e escrever correctamente, não consegue, após a lesão ou trauma, continuar a ler e a escrever sem erros. No segundo, o sujeito manifesta, desde o início da aprendizagem, problemas na aquisição da leitura e da escrita."

Não uma, mas várias dislexias


As crianças disléxicas não têm dificuldades no processamento verbal geral, ou seja, utilizam e compreendem a linguagem. "O problema reside na codificação fonológica, ou seja, quando têm de transformar letras ou palavras num código verbal. Quando lêem, recordam essencialmente as cadeias de palavras, letra a letra, sem conseguir lembrar-se dos termos exactos ou dos seus significados."
No caso da dislexia estão identificados vários subgrupos, com um padrão específico de problemas, que é essencial conhecer para adaptar a reeducação aos casos concretos. "Com base nesta informação, diz-se que não há dislexia, mas sim disléxicos", salienta a especialista.


Estes são os subtipos de dislexia identificados:

*Disfonética ou auditiva: as crianças disfonéticas apresentam dificuldade de integração/associação letra-som, sendo o erro mais frequente a substituição semântica, com alteração de uma palavra por outra de sentido semelhante. Por exemplo pasta por mala .

* Diseidética ou visual: deficiência primária na percepção de palavras concretas. Os erros na leitura são fonéticos, com substituição de uma palavra ou fonema por outra de sonoridade idêntica. Por exemplo apartar ou apertar.

* Aléxica ou visuoauditiva: no fundo, é a coexistência dos dois tipos anteriores, o que conduz a uma quase total incapacidade para a leitura. As crianças com alexia tem dificuldade tanto na análise fonética das palavras como na percepção de letras e de palavras completas.

*Audiolinguistica: define-se pelo atraso na linguagem, perturbações articulatórias (dislalias), por dificuldades em nomear objectos (anomia) e erros na leitura e escrita, devido aos problemas na correspondência grafema-fonema.

*Visuoespacial: define-se pelas dificuldades de orientação direita-esquerda e de reconhecimento de objectos familiares pelo tacto (agnosia digital), além da fraca qualidade da letra (disgrafia) e dos erros graves de leitura e escrita, que mostram falhas na codificação da informação visual, invertendo letras e palavras ou fazendo escrita em espelho (por exemplo, p em vez de q , b em vez de d).

Esteja atenta aos sinais

"A detecção precoce é importante para a redução do seu impacto, o que torna importante conhecer indicadores primários, que se podem verificar a dois níveis: na fala e na Linguagem e na Psicimotricidade. Para ambos, a faixa etária de manifestação situa-se entre os 4/ 6 anos."

Na fala e na Linguagem estes são os sinais mais comuns:

*Dislalia ou problemas articulatórios ao pronunciar certas palavras;

*Confusão entre fonemas;

*Omissões de sílabas;

*Vocabulário pobre;

*Falta de expressão;

*Compreensão verbal deficiente.

No caso da Psicomotricidade destaque para:

*Atraso na estruturação e conhecimento do esquema corporal;

*Dificuldades senso-perceptivas que provocam confusão entre cores, formas, tamanhos e posições;

*Dificuldades motoras na execução de exercícios manuais e de grafismos (disgrafia);

*Tendência para a escrita em espelho.

Na escola, os sinais são observáveis essencialmente na leitura lenta, com constantes erros e incorrecções, podendo saltar linhas; nos erros ortográficos (disortografia); nas lacunas acentuadas na construção frásica; na qualidade da caligrafia bastante deficiente; nos erros por dificuldades na descodificação grafema-fonema. Mas a dislexia revela-se também na Matemática, pela dificuldade de manusear símbolos numéricos, na História, pelos problemas em captar as sequências de tempo, na Geografia, pela dificuldade de estabelecer coordenadas, e na Geometria, pela limitação no estabelecimento de relações espaciais.

Como actuar

"A primeira coisa que fiz foi procurar um técnico na área, que começou a reunir semanalmente com a Luísa e a dar-lhe estratégias para superar o problema. A dislexia é demasiado séria para prescindirmos de quem sabe", lembra Margarida.


De facto, existem diversas técnicas de intervenção na dislexia, que partem da avaliação completa dos possíveis erros, e défices, desenvolvendo programas individualizados. "É possível superar (não curar) a dislexia, com o acompanhamento e suporte necessário. Conheço juízes, matemáticos, engenheiros, biólogos, entre outros, que são disléxicos. Podemos referir entre as várias estratégicas a educação multisensorial e psicomotora, o treino perceptivo-motor, o desenvolvimento psicolinguístico e o treino da leitura e escrita", explica a psicóloga Vitória Ortega, que lança também um alerta: "seria da maior importância que as escolas que formam professores de Ensino Básico incluíssem no seu currículo estes indicadores, para um possível reconhecimento da perturbação na faixa etária em que esta se revela com maior incidência."

Atenção aos falsos diagnósticos!

São muito comuns os erros de diagnóstico. Trata-se de um processo sumamente complexo, dada a quantidade de factores que se torna necessário controlar para assegurar rigor e precisão. Os técnicos não especializados podem incorrer em erro, atribuindo a outras perturbações os sintomas e comportamentos em evidência.


"O diagnóstico incorrecto ou inexistente é uma condenação. A condenação muitas vezes pode conduzir à marginalidade, por qualificarem a criança com incapaz cognitivamente. Isto pode levar ao desinteresse e rebeldia, destruindo uma vida que poderia desenvolver-se em harmonia e realização."


Currículo alternativo: sim ou não?


No caso da dislexia, a solução não passa, na maioria dos casos, por um currículo escolar alternativo: "uma criança disléxica precisará de trabalhar muito mais, isso sim, sendo importante fazer com que se sinta igual aos outros para evitar os graves problemas de auto-estima que se manifestam quase inevitavelmente nestes casos. O mais importante é, no momento das avaliações, ter em conta as dificuldades específicas das crianças disléxicas, estando inclusivamente regulado por decreto-Lei as várias opções, que contemplam testes orais, mais tempo para resolver os testes, testes em discurso directo e a possibilidade de serem lidas à criança as perguntas do teste", reforça Vitória Ortega.

Contactos
*APDIS: Associação Portuguesa de Dislexia: R. Gil Vicente 138, Porto; tel: 225 573 420; contacto@apdis.com
*Portal da Dislexia: www.dislexia-pt.com
*FALTA O DA VITÓRIA

Doença da famosos?
Muitas personalidades, reconhecidas nas mais diversas áreas, são ou foram disléxicas: ora espreite lá estes nomes…
*Agatha Christie
*Albert Einstein
*Antony Hopkins
*Beethoven
*Bill Gates
*Franklin D. Roosevelt?Fred Astaire
*Galileo
*Harrison Ford
*Jack Nicholson
*John Lennon
*Julio Verne
*Leonardo da Vinci
*Mozart
*Pablo Picasso
*Steven Spielberg
*Tom Cruise
*Van Gogh
*Walt Disney
*Winston Churchill,

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