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E o que é que eu tenho a ver com isso?’ é a resposta que muitos pais ouvem quando partilham com os filhos histórias sobre a pouca sorte alheia. Que os mais novos hoje são pouco solidários foi o resultado de um estudo feito pelo Instituto de Ciências Sociais sobre as atitudes dos portugueses perante a desigualdade social, onde os jovens são o grupo que menos empatia mostra para com as dificuldades dos mais pobres. Demasiado preocupados com eles próprios ou educados para uma vida em que foram muito pouco habituados a pensar nos outros?

Bem, nem uma coisa nem outra, segundo a psicóloga Rita Xarepe. “A minha experiência não é essa. Pelo contrário, sinto que os jovens de hoje são muito solidários. Não sinto que estejam afastados dos outros, pelo contrário, acho-os muito sensíveis a pessoas com dificuldades.” Problema: às vezes, são os adultos que não dão exemplo nenhum de solidariedade.  “Tratamos mal os nossos velhos, somos insensíveis à necessidade dos outros… Vemos as notícias lá de África mas aquilo é longe e é fácil desligar. O pobre em África está longe, o nosso vizinho está perto e não fazemos nada por ele.”

‘Não tenho nada a ver com isso’

Se receber a tal resposta, isso não quer necessariamente dizer que tem um insensível em casa: “Temos que ver o que é que isso significa de facto”, nota Rita. Pode ser só uma provocação. Pode ser uma chamada de atenção (‘preocupas-te tanto com os pobrezinhos e a mim nem me ligas…’), pode ser uma acha na fogueira da discussão. “Também pode acontecer que os pais tenham uma ideia de perfeição, daquilo que, teoricamente, uma criança deve fazer, e depois nem estão a ver aquilo que as crianças de facto fazem.”

Mas a compaixão começa, acima de tudo, nos pais: “Há pouco tempo”, conta Rita Xarepe, “falei com uma menina que me dizia o seguinte: uma das coisas que mais gostava de fazer era ajudar os miúdos que tinham dificuldades, porque gostava de sentir que sabia as respostas. De onde te vem isso, perguntei. E ela respondeu: do meu pai. Ajuda-me, ouve-me, e deixa-me não estudar. Quando ele percebe que já estou cansada, diz: não tens de fazer isso agora, vamos fazer outra coisa. E isso faz-me sentir compreendida.”

Ou seja: a vontade de ajudar os outros vem de nos sentirmos nós próprios apoiados.” Compaixão não é só para os pobrezinhos de África”, explica Rita Xarepe. “Este pai está a dar à filha um exemplo de compaixão, e ela por sua vez vai passá-lo a outras pessoas.”  É assim que a solidariedade nasce. Em cadeia de ações. “Aprende-se muito mais facilmente assim do que com alguém a passar-te um sermão e a dizer ‘Temos de ser bonzinhos para os outros’, que lhes entra por um ouvido e sai pelo outro. Ou seja, só mudamos aquilo que sentimos, só aprendemos aquilo que passa por nós.”

Não obrigue a emprestar

Compaixão é precisamente aquilo que devemos ter com os mais pequenos: mas não. A maioria dos pais e mães entra em cenas de faca e alguidar para obrigar uma criança de 3 anos a emprestar o seu carrinho…

“Imagine o que sentiria se alguém lhe tirasse a sua filha e a entregasse a outra mãe”, propõe a ‘bíblia’ dos pais americanos ‘What to Expect: the toddler years’ (O que esperar: os terríveis dois anos). Os pais acham que uma criança que não empresta é um egoísta do pior, mas esquecem-se de uma coisa: a cabeça de uma criança, aos 3 anos, ainda não está preparada para emprestar nada, mas para manter. Até aos 3 anos, a criança vê as suas coisas como uma extensão dela própria. O carrinho ou a boneca não são coisas separadas dela: fazem parte dela. Ela é quem é por causa deles, e separar-se deles é, literalmente, arrancar-lhe um bocado. Por muito que lhe explique, ela ainda não tem as bases para perceber que, entregando a boneca, vai continuar a ser dona dela, visto que se separaram fisicamente.

Conclusão: “É importante não o obrigar a emprestar nada!”, explica o site www.positivediscipline. com. “As crianças desta idade são egocêntricas sim – e é suposto que o sejam. Uma criança tem de perceber a noção de meu, teu e nosso para ser capaz de partilhar: e isso só acontece lá pelos 7 anos. Ele NÃO está a ser egoísta! Está a aprender o que é que pertence a uns e a outros, mas isso leva tempo e não se consegue obrigando ninguém, o que só vai torná-los mais enervados e resultar numa briga inútil!”

Ou seja: nesta idade, não se deve obrigar a criança a emprestar nada. Pelo contrário, deve-se ajudá-la a esconder os brinquedos especiais antes de os amigos chegarem, explicando que  outros serão ‘comunitários’ – bola, legos, carrinhos, aqueles que não lhe sejam tão queridos. Entretanto, poderá fazer jogos em família de dar e tirar: eu empresto-te isto, tu devolves-me aquilo. Mas sem stresse. E não se preocupe: fazer uma fita aos 3 anos porque o melhor amigo lhe tirou o aviãozinho não significa que ele vai ser um egoísta insuportável…

Quem é capaz de defender um amigo?

Ora bem, avancemos na idade. Imagine que o seu filho de doze anos vê um colega a ser troçado por outros. Acha que vai ter coragem de o defender, fica à parte ou junta-se aos agressores? “Só conseguem ajudar os fracos os miúdos muito estruturados, com muita confiança”, nota Rita Xarepe. “Ninguém se põe ao lado dos fracos. Nenhum adulto o faz, porque poucos adultos são seguros de si, no entanto esperamos que as crianças o façam…”

Como é que se cria uma criança segura de si? “Sendo um pai seguro de si. Que não precisa que o seu filho seja o melhor do mundo para se sentir realizado enquanto pai.”

Ou seja, estamos a fazer tudo ao contrário daquilo que pensamos. Achamos que estamos a criar um ser humano seguro porque exigimos que seja o melhor, e estamos a preparar-lhe um futuro de ansiedades e frustrações… “Se se é um pai ansioso porque se precisa que o filho tenha muito boas notas ou marque imensos golos, se isso nos transtorna, se precisa que ele seja assim, está  a passar a mensagem errada: que ele só será amado se for como os outros querem”, alerta Rita Xarepe. “E depois crescemos a achar que exigir a perfeição aos outros é gostar deles, porque esse é o nosso modelo de amor…”

O que significa ser solidário

Andamos a criar uma geração de egoístas? Os pais andam a educar os filhos para pensarem neles em primeiro lugar? “Mas nós temos de pensar em nós em primeiro lugar”, nota Rita Xarepe. “Ser solidário não implica isso. Em primeiro lugar, tenho de ser solidária comigo própria. Só quando eu estou ‘cheia’ de mim, só quando tenho aquilo de que preciso, emocionalmente, é que estou em condições para, de forma saudável, ajudar os outros.”

O nosso modelo de solidariedade tradicional é alguém que põe os outros em primeiro lugar. Mas esse já não é o modelo de solidariedade do futuro. “Não acho que isso seja uma solidariedade saudável para ninguém”, explica a psicóloga. “Quando estou a fazer aquilo que é bom para mim, sou mais capaz de perceber o que é bom para os outros. Quando ponho os meus interesses em primeiro lugar não estou a ser egoísta, conheço os meus limites e sei até que ponto é que posso dar sem que isso me esgote. Se dou até ao esgotamento, vou exigir isso ao outro.”

Conclusão: podemos dar, mas com limites. E esses limites também podem ajudar. “Quando o outro percebe quais são os meus limites, pensa que, afinal, não há problema em dizer, ‘Não, não posso fazer isso’.” O nosso problema é que temos muita dificuldade em dizer ‘não posso, não consigo, não sei’, porque achamos que isso faz de nós fracos. “Uma mãe acha que, se disser isso, está a perder o seu poder e autoridade. E às vezes é tão mais didático dizer, ‘Eu não sei’. Porque as crianças percebem que não têm de saber tudo para serem amadas, que podem admitir os seus limites sem se sentirem umas falhadas, que os pais também não sabem tudo. Isso é ter noção da tua condição enquanto pessoa, e do respeito pelos teus limites.”

Guia da empatia

Primeiro mandamento, aconselha o site www.parentingscience.com: assegure-se de que as necessidades emocionais da criança estão satisfeitas. Ou seja: tenha uma criança feliz. Habitue-o a pôr-se no lugar dos outros: imagina que és aquela pessoa. Como te sentirias? (de preferência, fora de um contexto de culpa, que só teria o efeito contrário). Com uma criança mais pequena, pode jogar o jogo das caras: ‘Faz cara de zangado; agora de alegre; agora de triste…’

“Já pensou em como é difícil imaginar o poder da fome quando se acabou de almoçar? É aquilo a que os especialistas chamam ‘a barreira quente-frio da empatia’ e é universal”, afirma a psicóloga Gwen Dewar, no mesmo site. Ou seja: ninguém pode partir do princípio que sabe como os outros se sentem. Habitue as crianças a fazer perguntas em vez de assumirem logo que sabem tudo sobre a outra pessoa. “Estás triste? Porquê? Que posso fazer para te ajudar?”

E o mais importante: ajude-os a serem felizes. As pessoas mais felizes são mais capazes de ‘descodificar’ os sentimentos dos outros…

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