Ele pode amá-la para sempre e o final ser de conto; deixá-la perdida nas páginas da sua História; ou, num vai e vem kármico, reencontrá-la uma e outra vez. Pode mesmo odiá-la, castigá-la, querer feri-la em paga das dores que ela lhe causou. Debalde – é a si mesmo que magoa mais.
As paixões que são um veneno no sangue não são um exclusivo masculino ( antes, a sua raridade torna-as especiais para ambos os sexos) mas as mulheres tendem a um sofrimento condensado. Uma vez choradas todas as lágrimas, dificilmente vêem no amor seguinte o rosto do primeiro. Não é que os homens que uma mulher ama tenham o mesmo valor de um vestido. Talvez para algumas – mas seres humanos maus há-os em ambos os sexos. O que acontece é que uma mulher vê o homem amado como o vestido preferido. Tenta por todos os meios tratá-lo com delicadeza, estimá-lo, conservá-lo. Se já não servir, tentará assim mesmo arranjá-lo para que sirva. Talvez procure até emagrecer só para voltar a caber nele, nem que tenham passado vinte anos. Mas quando vê que isso é impossível, passa ao vestido seguinte. Com resignada pena. A nossa dor é mais suave porque somos seres habituados, pela genética e pelo hábito de séculos, a sofrer, a esperar e a suportar os alicerces em silêncio. A posse, a pertença, não é tão urgente nem tão desesperada como é para eles.
O caso deles é outro. Aquela mulher é como o cometa Halley, mas quando finalmente aparece vira-lhes o mundo do avesso. Mancha tudo o que se segue. Contamina. Destrói tudo o que toca. E é o rosto dela que aparece no de cada mulher com quem se cruzam, de noite e de dia, consciente ou durante o sono, tornando tudo o resto insuportável. Tornando aquela mulher a matéria de que as lendas são feitas. Mas tenho para mim que por muito romântico que isso seja, por muito arrebatador que seja ser aquela mulher para alguém, é preferível que o homem em causa saiba o que fazer com isso. E muitas vezes, quando uma mulher amada se tornou aquela mulher, isso é mau sinal: que se amou mal, ou demasiado. Que o sofrimento se prolongou até tornar a relação inatingível e por isso, idealizada. Porque os romances mais belos são quase sempre trágicos. Bons para os livros. Entretenimento.