– Adormecer nos semáforos – Os homens dizem que bastam dois segundos de luz vermelha para atirar qualquer mulher para uma longa meditação sobre o jantar, o que dizer ao chefe, as notas dos miúdos, e o sentido da vida. Enquanto os machos estão ali sem despegar o olho do sinal e de pé no acelerador à espera que a coisa caia para arrancar em meio milésimo de segundo mais depressa que o macho do lado, as mulheres não se importam nada que as outras automobilistas arranquem antes delas, precisam que lhes apitem, depois esfregam os olhos, depois pensam: ‘meu Deus, já sete horas’, depois olham pelo retrovisor para ver a cara do malcriado que lhes apitou, depois procuram o travão de mão, depois pensam que a mudança não está onde costuma estar, depois escorregam-lhes os óculos escuros, e quando se preparam para sair do sítio já o sinal voltou a cair… Mas o que isto significa basicamente é que as mulheres têm imensa coisa em que pensar e não precisam de provar que são fantásticas ao volante para manterem a auto-estima intacta, como eles.
– Ir à feira – Claro que também podíamos ir a qualquer hipermercado e estava lá tudo, mas no hipermercado não temos o prazer de meter a mão num monte de t-shirts, discutir o preço, achar que estamos a fazer grandes compras, encontrar coisas como afiadores de facas, biquinis brasileiros, e quadros eróticos chineses (que nos fazem imensa falta e com os quais escolheríamos ser enterradas, se inda houvesse enterros de jeito como tinham os chefes viquingues). Além de que no hipermercado ninguém nos grita: ‘ó freguesa, venha ver que é tudo roubado de fresco’.
– Ter malas grandes onde não encontramos nada – Uma coisa que nenhum homem percebe é a necessidade feminina de andar com a casa atrás enquanto eles só precisam do cartão de crédito e das chaves. Claro que depois quando lhes dói a cabeça faz-lhe jeito um comprimido, quando precisam de um lenço de papel pedem à mulher, quando têm fome é a mãe que traz o lanche, e quando querem assentar qualquer coisa gritam: “alguém tem uma caneta e um papel?’ e esse alguém nunca é um homem. A moda até pode ditar malas do tamanho de uma salsicha, o problema é que numa salsicha só cabe o telemóvel, portanto continuamos a carregar o saco do Pai Natal e a passar dez minutos em frente à porta de casa à procura das chaves e a pensar por que é que ainda não se inventaram as malas com forro verde-fosforescente onde fosse mais fácil dar com o telemóvel e a carteira. Entretanto dizemos sempre: nunca encontro nada nesta mala, vou deitar a mala fora. Escusado será dizer que a culpa é sempre da mala.
– Passar uma hora no banho – É verdade que agora toda a gente nos incita a poupar água, mas também é verdade que há poucas tristezas que um banho não cure. É no banho que pensamos na vida, que não pensamos na vida, que espalhamos uma máscara de pepino e ‘apagamos’. A população feminina está solidária com o Arquimedes, que, se estão lembradas, estava no banho quando gritou eureka, não estava ao computador. Não sabemos se estava também com uma máscara desincrustrante de pepino, mas não é difícil imaginá-lo com um patinho de borracha.
– Ver um filme só porque entra o Tom Cruise – É verdade que ele nos últimos anos tem feito umas figuras tristes a saltar em sofás e a acreditar que o fim do mundo vem aí arraçado de nave espacial, mas até isso já lhe perdoámos. Foi só por ele que aguentámos as cinquenta e quatro ‘Missões Impossíveis’, e na maior parte das vezes chegámos ao fim sem perceber patavina da história. Parece que não havia história, disseram-nos depois, mas mesmo que houvesse não estávamos nem aí, desde que pudessemos passar duas horas recostadas a olhar para o Tom. Foi também esta a razão por que gramámos três eternos ‘Senhores dos Anéis’, desta vez por causa do, como é que ele se chamava, o príncipe das barbas e do olhito azul. Toda a gente achou que o ‘Tróia’ era muito comprido. Achámos curto. Francamente, três horas a olhar para o Brad Pitt são três minutos. Mas ninguém nos percebe, a não ser outra mulher.
– Escolher uma saladinha… e petiscar do prato dele as batatas fritas – Parece um contrasenso mas de facto não é: petiscar do prato de outra pessoa garante que por muito que nos apeteça não podemos pegar no prato, pô-lo à nossa frente e devorar tudo alarvemente até à última batatinha, mesmo que na prática muitas vezes seja isso que acontece. Há quem coma todas as batatas do prato do vizinho como quem não quer a coisa, e no fim do roubo faça um ar muito espantado e diga: “ai faço sempre isto, as minhas mãos têm vida própria, é que eu nem me apercebo” e o pobre vizinho não pode fugir com o prato para outra mesa nem dizer: Faz o favor de arredar as patas das minhas batatinhas, ou Olhe que eu mordo! Lema feminino: as batas que se roubam não entram na balança das calorias. É infantil, pois é, mas pelo menos sempre se vive na ilusão.
– Fazer contabilidade calórica – Ora se duas azeitonas são 18 calorias e uma maçã são para aí 65, isso dá, deixa cá ver, 70? 80? Ora se comi 80 e depois na aula de step gastei, digamos, 400, ora se um queque tem outras quatrocentas, isso quer dizer que posso comer só um queque? É uma coisa meio esquizóide e uma maneira estranha de gastar preciosos minutos de vida, mas quem nunca tiver contado uma caloria que atire a primeira azeitona. Além disso, de tivessemos músculo só de pestanejar, como eles, e se perdêssemos 8000 calorias só a mudar de canal, também nos poderíamos dar ao luxo de comer três salames seguidos empurrados com meia garrafa de bagaço mais quatro croissants mistos, e depois dizer com um ar surpreendido: “uma coisa que eu não percebo é por que é que vocês mulheres são tão obcecadas com as calorias”…
– Masoquismo estético – Em vez de ficarmos ao espelho a dizer “Mas que mulher linda!” passamos horas a falar daquilo que nos torna um clone do ‘Incredible Hulk’: das ancas que sairam às da avó Júlia, e da celulite que todas as mulheres têm mas que há quem não tenha que nós já vimos, e dos braços que não dão para usar alcinhas e dos pés que não dão para mostrar os dedos. E nem sequer fazemos isto para que nos digam: “Tás parva, não tens um grama de celulite.” O pior que nos podem fazer é dizer-nos: “Tás parva, não tens um grama de celulite.” Queremos é que nos digam: “Tens razão, é tão chato ter celulite, na próxima encarnação quero chamar-me Zé Manel.”
– Ter Barbies no armário – E então? Qual é o mal? Há quem tenha esqueletos, nós temos bonecas. Ou caixas de música que já não tocam ou têm a bailarina partida. Ou aquele urso que o Diogo nos ofereceu quando tinhamos 12 anos e que diz: “Crazy for you.” Isto não significa que ficámos encalhadas nos 12 anos (esperemos…), significa apenas que as mulheres não têm de renegar a sua infância para se tornarem adultas, como os homens.
– Cuscar – “Tu sabes que a Rita se separou?”, “A sério? Mas aquilo parecia tão sólido…”, “Pois olha, acho que encontrou um gajo numa viagem de trabalho e foi amor à primeira vista”, “Atão e o Manel?”, “Tá de rastos, coitado”, “Coitado não, ele também não lhe ligava nenhuma, agora vai gramar com os miúdos aos fins de semana para ver o que é bom para a tosse.” E etc. Nunca pensamos nos estudos que dizem que a bisbilhotice serve vários fins sociais como manter a unidade da tribo ou evitar que vamos às goelas do chefe dizendo mal dele. Cuscar acaba por ser mais uma forma de falar da nossa vida do que da vida dos outros, uma forma de discutir os problemas que nos atormentam em vez de metermos tudo para dentro e fingirmos que não existem.
– Mandar emails solidários – Ou os apelos da pessoa que tem um filho com uma doença rara, ou a mãe no hospital com um tipo de sangue raro, ou para adoptar cãezinhos (“Atenção: estes três lindos meninos apareceram abandonados em Alverca, têm quatro filas de caninos e já destruiram três carros, quatro mesas e um camião-cisterna mas são muito meigos e precisam de um lar e de muito mimo”). Também há as adeptas do ‘lixo internético’ como os testes brasileiros a perguntar se preferimos branco ou a azul e o Rio ou S. Paulo, ou aquelas cadeias de bruxas que não podemos quebrar sob pena de se abatar uma qualquer fatalidade sobre as nossas cabeças ou os anjinhos pendurados nas nuvens a mandar estrelinhas pelo ecran abaixo. No fundo no fundo sabemos muito bem que a net não regula a nossa vida dessa maneira, mas pelo sim pelo não lá vai a cadeia para mais 30 amigos e se o nosso desejo não se realizar em cinco minutos a culpa não é nossa.
– Aprender qualquer coisa inútil – Só para depois nos podermos gabar de que sabemos islandês, ou sevilhanas, ou paraquedismo. Claro que na maioria das vezes acabamos por desistir do curso à segunda aula, quando vemos que aquilo afinal dá trabalho (o nosso sonho era que nos abrissem a ‘drive’ do cérebro e enfiassem lá para dentro o ‘download’ das sevilhanas, mas parece que esse dia ainda vem longe) e que não compensa o suor só para depois nos gabarmos a quem provavelmente nem vai ligar nenhuma.
– Ir ao ginásio vestida de cor de rosa – As verdadeiras adeptas costumam ir maltrapilhas, com umas calças usadas e lavadas mais de quinhentas vezes e uns ténis de sola quase careca de que já nem se vê a cor, mas há uma nova geração de desportistas-chiques que levam o top a combinar com as calças e os ténis da cor do elástico e a garrafa de água da cor dos ténis, que são daqueles com molas transparentes no calcanhar. Enfim, se nos faz felizes e nos ajuda a não ficar em casa todas as noites a ver a telenovela, por que não?
– Ligar à mãe três vezes por dia – Na maior parte das vezes nem queremos nada de importante, é só para saber onde é que ela anda, e ainda acabamos por nos chatear porque depois é ela quem quer saber se sempre vamos jantar com o Vasco e nós achamos que ela não tem nada com isso, mas duas horas depois estamos a ligar-lhe outra vez, só por hábito. Enfim, pode tornar-se sufocante mas é pior andarmos a fumar um maço por dia