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*artigo publicado originalmente na revista ACTIVA de março de 2018

Uma criança em lágrimas é levada para um canto, onde fica o equivalente em minutos à sua idade ‘a pensar no que fez’. O método é usado por pais e educadores, mas nem todos. “Nunca usei o ‘cantinho’ porque não me parecia que resolvesse nada. Pôr uma criança sentada a ‘pensar no que fez’ alguma vez faz com que ela resolva emendar-se?” Maria Marques, 43 anos, mãe do Manuel, 13, da Marta, 11, e do Martim, 5, é orientadora de ATLs e já teve a sua dose de birras.
“Em primeiro lugar, acho que temos de adequar o nosso comportamento a cada criança. Cada um vem com um ‘chip’ diferente, e nós, pais, reagimos muito a isso.”
E então, alternativas, vamos lá saber. “Dá muito menos trabalho prevenir uma birra do que lidar com ela. Por exemplo: no outro dia, eu sabia que o jantar ia ser peixe. Ora eu não me vou pôr a fazer um pratinho especial ao Martim porque o menino odeia peixe. Então, de manhã, contei-lhe uma grande história ‘Sabes que o Cristiano Ronaldo disse no outro dia que estava estoirado, com os músculos todos rotos, e sabes o que ele fez? Foi comer peixe e ficou logo menos cansado.’ E não é que funcionou?”
Mas também enfrenta os braços-de-ferro: “Se não quer comer, não come. É mais provável que eles não queiram comer se virem que nos chateiam, que têm poder sobre nós. Portanto, eu não lhes dou esse poder.”
Terceiro mandamento: ir com calma. “Às vezes tenho dificuldade nisto, porque sou hiperativa. Mas é como tudo: também se treina. Por exemplo, antes de ele ir tomar banho, aviso com 5 minutos de antecedência. E depois digo ‘Martim, banho’. Não agarro, não lhe toco, não o tiro do sofá.”

Dê o tom

Quarto mandamento: o tom. “Uma voz agressiva, ativa imediatamente o chip do ‘não faças o que ela quer’”, nota Maria Marques. “Por isso ligo o tom-autoridade, que é diferente do agressivo, não é uma ordem nem um pedido, é só dizer o que quero.”
Aliás, não gosta de ordens. “Explico tudo. Uma vez levei a minha filha à psicóloga e ela disse-me ‘Mas não tem de explicar tudo. Às vezes também pode ser só porque a mãe quer’. E às vezes digo isso. Mas não é o meu estilo. Acho que há miúdos que passam a vida a ouvir ordens e às tantas entram em curto-circuito.”
Mas claro que às vezes até com as mães mais preparadas as coisas se descontrolam. Aí… passa a ‘batata quente’: “O meu marido é muito bom em casos de stresse, porque leva tudo para a palhaçada. Vai ter com o birrento, rebola-o na cama, faz-lhe cócegas, grita ‘ahhhhh, está o Homem da Espuma na casa de banho, anda lá vê-lo’, pega-lhe às cavalitas, e já está o Martim às gargalhadas. O humor funciona muito bem. Eu stresso muito e às vezes passo-me. Claro que já lhes pedi desculpa, afinal é isso que eu quero que eles aprendam. Outras vezes, sou sincera: ‘Hoje a mãe está muito cansada, desculpem-me e tenham paciência’.”
Quinto mandamento: explicar o que se quer. “Nunca usei a expressão ‘portar bem ou mal’. Sou objetiva, digo o que espero deles: que não andem a correr, a gritar, que me peçam qualquer coisa antes de fazer, que não batam, não gritem, etc. Ainda hoje ouço miúdos a dizer ‘porto-me mal’ e eu digo ‘mas fazes o quê’, e eles, ‘não sei’.”

Defesa legítima

“Na minha opinião, quando os pais se passam são eles que precisam de ir para o banquinho”, ri a psicóloga Alexandra Barros. Desvaloriza a birra como fazendo parte do comportamento da criança: “Não só não são nada de anormal como são uma atitude bastante saudável: significam que a criança sabe defender-se e que vai saber defender–se no futuro. Fico muito mais preocupada com aquelas crianças de quem os pais dizem ‘nunca deu trabalho nenhum’. Porque uma birra é um sistema de autoproteção: uma criança que faz uma birra é uma criança resistente, assertiva, que sabe defender-se. Claro que depois cabe-nos a nós, adultos, determinar até que ponto é que nos vai dizer não. Importa é ensiná-la a controlar-se sem a tornar submissa.”
O problema é que muitas vezes os pais reagem a uma birra com outra birra. “Os pais estão cansados e frustrados, e quando sentem o seu poder posto em causa têm muita necessidade de se afirmarem. Mas fazem-no de forma desorganizada e dando poder à criança, numa altura em que ela está a ensaiar a sua própria agressividade e vai esticar-se até onde pode. A desorganização do adulto só aumenta a desorganização da criança, e depois queremos chamá-la à lógica numa altura em que ela já não é capaz de fazer isso, o que a enerva ainda mais.”

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Juanmonino

Relação à prova de birra


Como desativar o processo: “Às vezes, basta mudar a forma como falamos. Por exemplo, em vez de ordenar ‘Arruma as tuas coisas’ em tom ríspido, podemos dizer ‘Ajudas-me aqui a arrumar?” Se tudo se descontrolar, pode dizer ‘Estamos os dois zangados, por isso agora vamos acalmar-nos e depois tornamos a falar’. Isto não é ‘o banquinho’. Cada um vai respirar para seu lado. E é quando os dois já acalmaram que pode conversar sobre o que aconteceu.”
Coisas que ajudam: haver uma rotina estabelecida porque se torna mais fácil eles saberem o que têm de fazer e quando. Dar recompensas pode ajudar, mas não como ‘chantagem’. E mais do que a recompensa, o elogio. “Tendemos a desvalorizá-lo, mas experimente: é muito efetivo”, explica Alexandra Barros. “‘Estou tão contente contigo, estás tão mais calmo’. A valorização é muitíssimo importante, mas nós ainda temos imensa dificuldade em fazer isso.” Há crianças mais sensíveis, e quando recebem sempre feedback negativo é isso que interiorizam.”
E depois da birra o adulto deve perdoar. “Quando a criança pede desculpa, não deve dizer ‘estou zangada contigo’. A criança, o adulto e a sua relação de afeto devem sair inteiros da birra.”

Com os pais é pior


Andreia Vidal é educadora, coautora do livro ‘À descoberta do seu bebé’ e também é adepta da calma na tempestade, principalmente com a filha de 4 anos: “Se uma criança faz birra, começo sempre por baixar-me ao nível dela e desvalorizar a birra. Se retribuímos em intensidade de emoção, a birra escala. Se ela não se acalmar, digo ‘Vais um bocadinho para o teu quarto e depois de te acalmares nós conversamos’. Mas não lhe digo em tom de ordem, digo-lhe na voz mais doce que consigo. Ela fica lá a gritar uns tempos e depois volta. Se virem que não estamos muito preocupados com o que eles estão a fazer, desativam. Porque a birra é uma chantagem, alimenta-se da nossa atenção. Por isso é que eles a fazem em situações cruciais: o banho, a comida.”
O que costuma funcionar: a brincadeira. “Por exemplo, quando chego a casa, venho exausta, por isso não faço coisas que sei que vão desencadear um comportamento opositor. Levo pela brincadeira, digo ‘As princesas não têm o cabelo sujo. E a tua Barbie está ali a pedir para ir tomar banho. Vamos todas?’ Com a comida, a mesma coisa ‘Não comes as ervilhas? Vão ficar tristes!’”
Na escola, é raríssimo as crianças fazerem birras: “Eles veem a educadora como a autoridade e a nossa postura é mais firme.”
Porque é que os pais estão tão perdidos? “Porque hoje em dia parece que não se pode fazer nada. Não se pode levantar a voz, levantar a mão, as pessoas ficam ali sem saber o que fazer, e os miúdos aproveitam-se disso. A maioria das crianças levanta a mão aos pais, e eles deixam. Isto é inadmissível. Tem de se agarrar na mão e não admitir. Claro que eles choram. Mas tem de ser. E a pessoa passa-se, mas não deve martirizar-se por causa disso. Tenho a certeza de que os meus pais gritaram comigo, e eu não me lembro.”

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DEAN HINDMARCH

Amas, sim ou não?

Não concordo com uma ama”, defende a educadora Andreia Vidal. “Num infantário, toda a gente teve 5 anos de curso, onde aprenderam a fazer o seu trabalho, e as atividades não são só para passar o tempo, tudo tem uma intenção pedagógica, e nas amas isso não acontece. Claro que pode haver quem se esforce imenso, mas não estão a trabalhar as competências como num jardim de infância. Há um ambiente familiar, mas muitos espaços não estão adaptados às necessidades deles. Até aos 2 anos, se puderem ficar com os avós é melhor. Não sendo possível esta situação, acho que devem estar num sítio com pessoas que foram formadas para estarem com eles.”
Segundo a psicóloga Rita Castanheira Alves, autora do livro ‘A psicóloga dos miúdos’, cada caso é um caso. “Nem sempre uma avó ou ama têm vantagens em relação à creche nem vice-versa, depende de quem falamos, do contexto que falamos, da família, da criança. Não faz sentido decidir universalmente sem considerar o que cada família e criança precisam. Mas adiar a ida para o infantário muito após os 3 anos poderá dificultar a adaptação pela fase de desenvolvimento da criança, e poderá diminuir as oportunidades de estimulação social que a educação pré-escolar proporciona. No entanto, tudo depende dos contextos em que a criança está inserida.”

4 ideias para escolher uma ama

Se já decidiu por uma ama, estes passos podem ser uma ajuda.
1. Peça referências… A pais de outras crianças, por exemplo. Se souber ao que vai, melhor.


2. Observe a pessoa Mas não confie demasiado na intuição: nem tudo o que parece é. Ouça a maneira como ela fala de outras crianças.


3. Observe a casa dela. O espaço parece-lhe seguro? Limpo? Alegre?


4. Pergunte-lhe como reagiria em situações de stresse
Como lidaria com uma birra, por exemplo?

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