Isabel Canha e Maria Serina, fundadoras do site Executiva.pt, escreveram a quatro mãos o livro ‘Segredos dos Melhores Profissionais’. O objetivo? Descobrir o que têm em comum, entre outros, Paula Rego, José Mourinho, Vhils, Marcelino Sambé, Elvira Fortunato ou Joaquim de Almeida, exemplos de inquestionável sucesso. Existe uma fórmula ou um ingrediente para o sucesso? Na senda de encontrar a resposta a esta questão, Isabel e Maria reuniram os testemunhos de 52 profissionais nas mais diversas áreas, de talento reconhecido, dentro e fora de Portugal. Ao dar voz a personalidades tão díspares, quiseram encontrar ferramentas para quem deseja superar-se a cada dia, realizar-se naquilo que faz e atingir resultados de excelência. Cientistas, músicos, gestores, humoristas, empreendedores, artistas, académicos, desportistas, jornalistas, escritores, bloggers e chefs de cozinha partilham as atitudes, mudanças e lições aprendidas que os ajudaram a construir as suas carreiras. Mas afinal, o que é o sucesso? “Uma das grandes lições que retiramos deste livro é que nenhuma destas pessoas procurou ou procurao sucesso enquanto objetivo último”, disseram-nos as autoras, numa entrevista em que se fala de motivação, inteligência emocional e resiliência.
Já muito se escreveu sobre o sucesso e o “segredo” para o alcançar. O que acreditam que distingue o vosso livro dos outros no mercado?
Maria Serina: “Segredos dos Melhores Profissionais” distingue-se de outros trabalhos nesta área por recolher o depoimento de 52 profissionais de exceção. São pessoas que se notabilizaram como cientistas, músicos, humoristas, artistas, académicos, desportistas, jornalistas, escritores, bloggers e chefs de cozinha que partilham, em testemunhos muito francos e feitos com muita generosidade, os comportamentos, hábitos e atitudes que os conduziram à posição que hoje ocupam, como lidam com o erro ou o fracasso, que pessoas ou mentores as inspiraram, que livros as marcaram.
A todos fizemos as mesmas seis perguntas:
- Que comportamentos, hábitos ou atitudes contribuíram para chegar à posição que hoje ocupa?
- Qual a mudança que teve mais impacto na sua vida?
- Como é que um fracasso o colocou no caminho do sucesso?
- Que mestres teve e que ensinamentos lhe deram?
- Qual o livro que mudou a sua vida?
- Que conselho daria a um jovem que queira fazer carreira na sua área?
Nas respostas a estas questões, os entrevistados revelam as atitudes, as mudanças e as lições aprendidas que os ajudaram a construir carreiras de sucesso. São ensinamentos válidos para qualquer pessoa, seja qual for a sua área de atividade, idade e a fase da vida profissional em que se encontra. No final, ficamos com uma ideia muito precisa do que distingue estas pessoas que todos admiramos.
Como foi o processo de escolha destes “melhores profissionais”. Quais os critérios que presidiram à seleção, imaginando que não terá sido nada fácil…
Isabel Canha: Começámos por escolher pessoas notáveis nas suas áreas. Para nós, os melhores profissionais são reconhecidos internacionalmente, como a pintora Paula Rego, o ator Joaquim de Almeida, o escritor José Rodrigues dos Santos ou o treinador de futebol José Mourinho. São pessoas que marcaram o seu âmbito de atuação por terem sido pioneiros nas suas áreas, como o pai do rock português (Rui Veloso), o primeiro português a escalar os Himalaias (João Garcia) ou a primeira mulher a liderar uma grande consultora em Portugal (Cristina Rodrigues). São pessoas muito competentes e reconhecidas pelos seus pares, como os cientistas Elvira Fortunato, Octávio Mateus, Maria Manuel Mota ou Maria do Carmo Fonseca, o premiado publicitário Hugo Veiga ou os chefs Avillez e Ljubomir, para citar apenas alguns nomes.
Na seleção procurámos ter pessoas de diferentes áreas. Desta forma, os seus conselhos e as experiências são mais variadas e têm maior aplicabilidade. Assim, é difícil alguém ler este livro e não se identificar com um destes testemunhos.
Quisemos, ainda, ter uma representação equilibrada de géneros (cerca de metade homens e metade mulheres), ter pessoas consagradas, mais seniores, como a coreógrafa Olga Roriz, e pessoas mais jovens, como o bailarino Marcelino Sambé. Procurámos sempre a diversidade. Por exemplo, entrevistar empreendedores como Daniela Braga cuja empresa, a DefinedCrowd. está entre as 30 tecnológicas que mais crescem, e empreendedores sociais como Isabel Jonet, do Banco Alimentar, ou Alexandra Machado, da Girl Move.
Foi fácil chegar a 52 pessoas. O mais difícil foi decidir parar, e deixar de fora alguns outros que também poderiam estar nesta lista. É sempre difícil escolher.
Se tivessem de escolher uma característica comum a todos os entrevistados, qual seria?
Maria Serina: Persistência. Para ter este nível de sucesso é preciso ter talento e inteligência, claro. Mas é fundamental trabalhar arduamente, desenvolver continuamente as suas capacidades, as suas competências e conhecimento na área que escolheram. Para isso há que manter a motivação intrínseca (ninguém nos dá motivação com uma varinha mágica) e é por isso que tem de se ter uma enorme paixão por aquilo que se faz, caso contrário, rapidamente se desistiria perante tamanhas dificuldades. Ser-se apaixonado pela profissão, pela área em que se trabalha, é outra característica que distingue estas pessoas.
Afirmam logo no início do livro que “quase toda a gente pode alcançar os mais altos níveis de desempenho em qualquer área, desde que tenha um treino adequado”. Não receiam estar a criar expetativas demasiado elevadas junto de quem lê este livro?
Isabel Canha: Acreditamos nisso, mas não somos nós quem o afirma. É a conclusão que se retira de vários estudos realizados ao longo de muitos anos, com profissionais de exceção. Por exemplo, durante mais de 30 anos Anders Ericsson estudou os melhores dos melhores. Por mais que investigasse atletas, músicos, jogadores de xadrez, médicos, vendedores, professores, pessoas que conseguiam reproduzir, pela mesma sequência, 82 números que tivessem acabado de ouvir, uma conclusão emergia sempre: mesmo que fossem muito dotados, não era o talento que explicava a sua performance. Era o trabalho, o treino.
Este investigador que esteve na origem das famosas 10 mil horas de treino de que fala Malcom Gladwell, afirma peremtório que “tirando desportos como o basquetebol ou o futebol, em que as características físicas como a altura e a dimensão física são vantagens, quase toda a gente pode alcançar os mais altos níveis de desempenho, em qualquer área, desde que tenha um treino adequado”.
“Escolhe um trabalho de que gostes e não terás de trabalhar um único dia da tua vida”, afirmava o filósofo e pensador chinês Confúcio. Mas há muitas pessoas que não gostam daquilo que fazem. O sucesso está condenado à partida neste caso? O que podem essas pessoas retirar deste livro, quando tantas vezes o seu objetivo é, antes de mais, subsistir e “pagar as contas”?
Maria Serina: Uma pessoa pode ser bem-sucedida, apesar de trabalhar numa área ou desempenhar uma profissão que não seja a da sua eleição. Podem intervir outras características, como a curiosidade intelectual, a vontade de aprender, ou o brio, que compensem a falta de paixão pela área. Mas uma coisa é certa: dificilmente se será o melhor dos melhores se não se gostar muito do que se faz. Não conhecemos uma só pessoa que atinja este patamar e confesse não gostar muito do que faz. Podem ter começado por não gostar muito, mas no caminho que foram percorrendo quase seguramente que se apaixonaram pelo que fazem.
Afirmam igualmente que a motivação intrínseca para se ser melhor e a vontade de vencer estão na base do sucesso. Mas não serão estas características inatas? Qual a vossa proposta para desenvolver o que não é inato?
Isabel Canha: Essas características podem ser inatas ou desenvolvidas pela educação, pelo contexto familiar e escolar ou até profissional. Enquanto mães, educadoras, e enquanto profissionais, tendo orientado alguns jovens que connosco têm trabalhado, temos essa experiência. Com mentoria adequada, é possível desenvolver a disciplina, e os métodos de organização e de trabalho.
Muitas vezes esquecemo-nos que o sucesso tem em si uma enorme carga de subjetividade e que a incompreensão disso mesmo pode ser muitas vezes causa de infelicidade e frustração. Na vossa opinião, o que define verdadeiramente o sucesso?
Maria Serina: A definição e sucesso é subjetiva, não é universal. Varia consoante as pessoas, as suas circunstâncias, os seus sonhos ou as suas ambições. O que para mim ou para a Isabel é sucesso pode não ser para outra pessoa. Para nós, sucesso é ser feliz e realizada na vida profissional e pessoal, sentir que o nosso trabalho tem um propósito.
Comummente identifica-se ter sucesso a ter poder, dinheiro, fama, estatuto social e profissional. Mas uma das grandes lições que retiramos deste livro é que nenhuma destas pessoas procurou ou procura o sucesso enquanto objetivo último. Nenhum destes profissionais decidiu um dia: vou ser rico, famoso e respeitado. Aliás, muitos recusam a ideia de que têm êxito. Alguns fazem mesmo questão de explicar isso na sua reposta. Outros devolviam-nos a pergunta: o que é, afinal, uma pessoa bem-sucedida? Para estes 52 profissionais o sucesso não é um objetivo, é o resultado.
A inteligência emocional é cada vez mais valorizada como uma ‘skill’ essencial ao sucesso na vida e na profissão. No caso da área profissional, em que moldes é que se revela mais benéfica?
Isabel Canha: Muitos autores e recrutadores defendem que o que marca a diferença entre o sucesso ou o fracasso são as competências soft, em que sobressai a inteligência emocional. Hoje, muitas pessoas têm uma licenciatura ou grau académico superior, têm formação avançada na área de especialidade. O que distingue entre dois profissionais igualmente competentes é a inteligência emocional. A capacidade de não desanimar perante as dificuldades, saber ler e lidar com as suas emoções e as de outras pessoas, a empatia, são cruciais em qualquer empresa, seja qual for o nível em que se encontre na hierarquia. Não é por acaso que muitas empresas sujeitam os seus quadros a testes de Quociente Emocional para medir a sua literacia emocional, com fins de recrutamento e identificação de talentos com vista a promoções e atribuição de projectos especiais.
Numa altura em que a nossa resiliência é testada diariamente, é ainda mais importante ler este livro?
Maria Serina: As histórias de vida, os seus ensinamentos, as experiências que partilham e os conselhos que deixam estes 52 entrevistados são uma enorme inspiração e orientação para atravessar tempos difíceis, como todos eles tiveram, em algum momento, de sueprar.
Curiosamente, este livro foi feito durante a pandemia. Começámos em março e foi editado em Novembro. Fomos muito ambiciosas nos objetivos que colocámos, mas conseguimos levá-lo a bom porto, graças ao apoio de um conjunto de cinco empresas (Adecco, Capgemini, Galp, McDonald’s e Transearch) que nos permitiram dedicar o tempo necessário a recolher os depoimentos de algumas das pessoas mais inspiradoras deste país, precisamente porque se revêm nestes princípios de valorizar os melhores e aprender com eles, de reconhecer o talento, o trabalho e o mérito de pessoas de diferentes áreas, e de ajudar a pequena editora que o trouxe à estampa, a Redcherry, a sobreviver durante este período conturbado.
Dos 52 testemunhos, qual foi aquele que mais as surpreendeu? E aquele que mais as inspirou?
Isabel Canha: Não conseguimos responder com um só testemunho, deixando de fora tantos, tantos, tantos depoimentos tão ricos e inspiradores. Não seria uma resposta justa. Em cada um deles encontramos sempre algo que nos inspira ou surpreende.