1 – Para começar pelo princípio, o que significa um comportamento de abuso, o que é uma pessoa ‘tóxica’? E o que é uma boa relação?
Um comportamento abusivo é egoista, procura um benefício próprio sem se importar com as emoções ou os sentimentos dos outros, procura aproveitar-se das outras pessoas sem culpa. O que é uma pessoa tóxica? Para mim as pessoas tóxicas não existem. Todos temos aprendizagens e comportamentos tóxicos, mas ser tóxica não nos define. Todos temos as nossas vivências e crenças, mas isso nós nos torna isto ou aquilo, isso apenas nos ensinou a comportar-nos desta ou daquela maneira. Por isso acredito que não se é tóxico, tem-se um comportamento tóxico. Uma boa relação é uma relação onde há tranquilidade e onde as pessoas estão seguras do vínculo afetivo. Não digo que uma relação sã não tenha problemas, mas há também uma sensação de equipa, de união, de compaixão pelo outro. Há a tranquilidade de saber que, aconteça o que acontecer, a outra pessoa vai estar sempre ali para te apoiar.
2 – Dizemos muito que temos de aceitar a pessoa tal como é mas depois desatamos a exigir mudanças. Em que ficamos?
É verdade que temos de aceitar a pessoa tal como é. Mas quando falamos de relações, há 3 componentes: o outro, eu, e a relação, que é uma entidade diferente. E numa relação, temos de negociar e chegar a acordos. Por isso, aqueles que conseguem fazer essas pequenas mudanças, ou mais bem dito, esses pequenos ajustes, são os que têm relações de sucesso. ‘Percebo que sejas assim que te sintas assim, mas a mim isso faz-me mal. Não te peço que mudes a tua forma de ser, peço-te que mudes este comportamento ou esta forma de dizer as coisas.’
3 – Qual é a diferença entre uma zanga e um comportamento abusivo?
A ira é uma emoção. Podes estar zangado e continuar a respeitar a outra pessoa, uma emoção e um comportamento são coisas completamente diferentes. O comportamento abusivo surge muitas vezes quando a ira não é bem controlada, é verdade, mas são duas respostas diferentes. Podes estar zangada e respeitar o outro, podes estar zangada e magoá-lo.
4 – Geralmente, uma relação entre um ‘leão’ e uma ‘ovelha’ dá mau resultado, não dá? Quais são as estratégias para lidar com um ‘leão’?
Há muito desequilíbrio numa relação entre uma pessoa dominante e uma pessoa submissa. Ainda por cima, são dois perfis que tendem a atrair-se. Provavelmente vai sempre funcionar mal. Mas se quisermos que funcione, ponha limites claros ao seu ‘leão’, limites que não pode passar em nenhum momento. Quanto à ovelha, tem de se certificar que não se sacrifica demasiado pela relação.
5 – O efeito de montanha-russa emocional é um dos fenómenos mais típicos das relações tóxicas e dependentes. Como é que funciona?
De repente está tudo bem e a relação parece maravilhosa, e de repente há conflito e discussão e tudo vem abaixo. Este movimento de cima e baixo gera adição, quando estás em alta é uma bomba de dopamina e adrenalina e sentes-te feliz, e quando vens abaixo estas substâncias desaparecem e sentes-te triste e deprimida. Isto gera um reforço intermitente, que é muitíssimo viciante.
6 – Diz que temos medo de abandonar uma relação tóxica porque temos medo do abandono. Como é que aprendemos a tornar-nos emocionalmente independentes?
Independência emocional não existe. Ser emocionalmente independente é irreal e nem sequer seria benéfico para ninguém. Teria de viver em reclusão numa montanha e um ser humano é feito para se relacionar, para viver em tribo, para gerar vínculos interdependentes. Eu tenho de me relacionar, de me sentir amada e compreendida. Mas para gerar vínculos sãos, temos de nos trabalhar a nós mesmas para perder o medo do abandono, para nos sentirmos autosuficientes e queridas por nós mesmas.
7 – É sempre obrigatório deixar uma relação tóxica ou pode melhorar?
É muito difícil tornar saudável uma relação tóxica. Por isso o melhor a fazer é sair dela. Pode doer no momento, mas a longo prazo percebemos que foi o melhor que podíamos ter feito.