Quando soube que tinha uma doença incurável e mortal, o
professor de sociologia Morris Schwartz disse para si próprio: ‘Vou
morrer ou vou viver? Vou retirar–me, como muitas pessoas
provavelmente fazem, e desistir do mundo, porque está a ser tão
terrível para mim agora, ou vou viver? Decidi que ia viver.’
Morrie, como era conhecido, foi um dos maiores embaixadores da luta
por uma vida digna até ao fim e escreveu estes pensamentos no livro
‘Morrie In His Own Words’ (‘Amar e Viver’, Pergaminho).

Para todos os que, como ele, têm uma doença incurável com uma
esperança de vida muito limitada existem os cuidados médicos
paliativos. Destinam-se a minimizar a dor e a dar mais qualidade de
vida. ‘Não falamos só de doentes de cancro nem de idosos: 20% dos
doentes têm menos de 65 anos e há também crianças’, avisa Isabel
Neto, médica e responsável da Unidade de Cuidados Continuados e
Paliativos do Hospital da Luz, em Lisboa, e vencedora do Prémio
Mulher ACTIVA, em 2004. Podem ser pessoas que sofrem de
insuficiência multiórgãos em estado avançado, diabetes, problemas
respiratórios e cardíacos graves, sequelas de acidente vascular
cerebral (AVC) avançadas e doenças neurológicas degenerativas, como
a esclerose lateral amiotrófica (progressiva atrofia,
enfraquecimento e paralisia muscular que conduz à morte) ou
Alzheimer.

Mas quem cuida destes doentes também precisa de apoio. Por
isso, foram criadas unidades de cuidados paliativos, que assistem
os pacientes em casa e dão informação, apoio emocional e social a
quem cuida destes doentes.

Prepare a sua mente e a sua vida

Como especialista em cuidados paliativos, Isabel Neto já lida há
13 anos com doença crónica terminal, mas também já cuidou de
familiares com doenças incuráveis. E sabe que, nestes casos, há
situações para as quais se deve estar preparada.

Funções como a fala ou a movimentação vão, em muitos casos,
deteriorar-se
e, possivelmente, perder-se. Simples acções
como levantar, deitar, lavar, comer e tomar a medicação passam a
estar totalmente dependentes da ajuda de alguém.

A prestação de cuidados pode durar vários anos.
Ter uma doença incurável e incapacitante não significa que se entre
logo em fase terminal.

O doente irá sentir-se triste por se achar um
peso.
‘É preciso passar-lhe a mensagem que deixar que o
levantem, deitem ou lhe dêem de comer é um acto de coragem grande
para alguém que sempre foi auto-suficiente’, diz a médica.

Os afectos e o humor vão sofrer alterações. ‘Podem
manifestar-se reacções de revolta e contra os cuidadores’, avisa
Isabel Neto. ‘As pessoas não são capazes de dizer ‘sinto-me tão
triste por te dar trabalho e não ser capaz de fazer isto sozinho’!
Ensinamos a família a ver isto como sinais de sofrimento e
estimulamos o doente a explicar a fonte de sofrimento. Às vezes, a
solução passa por chorar em conjunto com a família.’

A imaginação e o intelecto continuam a precisar de ser
estimulados.
Dar mais qualidade de vida a um doente não
passa apenas por alimentá-lo bem e não descurar os cuidados de
higiene. Lá dentro, há uma mente a trabalhar, memórias e saudades
das sensações antigas e daquilo que já não se pode fazer. ‘Há que
‘viajar’ com ele’, explica Isabel Neto. ‘Lembro-me de um rapaz de
20 anos com um cancro do cólon que fazia caça s ubmarina. Uma das
coisas que mais o fazia sofrer eram as saudades do mar.

Explorámos as sensações dessa prática, arranjámos imagens do
mar.’ Informe-se das soluções tecnológicas que permitam alguma
autonomia ao doente, como telefones ou computadores que lhes
possibilitem comunicar sem ajuda.

Não se esqueça de si

‘Não é possível dar do nosso copo de água se ele estiver vazio’,
lembra Isabel Neto. ‘É muito importante que não se confunda a
oportunidade de cuidarmos de nós com negligência com o doente, sob
pena de não conseguirem cuidar da pessoa de quem gostamos.’ E é,
geralmente, sobre a mulher, por tradição a cuidadora da família,
que recaem os maiores estigmas. Eis algumas estratégias de
autocuidados:

Pense nas três actividades que mais prazer lhe
dão.
‘Tentamos negociar com os cuidadores no sentido de
não abandonarem as actividades de lazer que tinham antes, que não
se desvinculem do contacto com o exterior, que façam coisas como ir
à ginástica, ao cinema, ao cabeleireiro, ler ou receber uma
massagem’, responde Fátima Ferreira, enfermeira e coordenadora da
equipa de cuidados continuados do Centro de Saúde de Odivelas.
‘Sugerimos o apoio de voluntários que possam ficar com o familiar
doente enquanto o cuidador trata de si.’

Saia de casa sem se sentir culpada. É natural que
a dor e a responsabilidade não a deixem na melhor das disposições
para cuidar de si e divertir-se. Mas é preciso que o faça sem
culpas. ‘Culturalmente, fica mal fazer qualquer coisa em benefício
próprio e deixar o familiar doente ao cuidado de outra pessoa’,
explica a enfermeira. ‘As pessoas dizem que não podem sair porque
têm medo que aconteça alguma coisa ao doente. Explicamos-lhes que o
que tiver de acontecer, vai acontecer, quer elas estejam lá ou
não.’

Repense as prioridades diárias. ‘As pessoas não
podem culpabilizar-se porque a casa não está tão arrumada ou porque
não fazem os mesmos cozinhados. Sobretudo as mulheres não podem
esperar continuar a render a cem por cento em todas as
actividades’, alerta Isabel Neto.

Valorize-se a si mesma. ‘É bom que exista o
reconhecimento dos outros, mas tem de ser a própria mulher a
admitir e a validar os seus esforços. Não é um herói quem dedica
setenta por cento do seu tempo a cuidar, durante anos, de alguém
que está a morrer?’, observa a médica.

Recorra a grupos de auto-ajuda. A partilha de
problemas e emoções com pessoas em situações semelhantes pode
ajudá-la a fugir ao isolamento e a aprender a cuidar melhor do seu
doente. Associações de doentes, como os de Alzheimer, têm grupos de
interajuda, com sessões periódicas, que pode e deve procurar.

A quem pedir ajuda?

Na maior parte dos casos, as famílias não podem dar-se ao luxo
de prescindir de um salário para que um dos elementos fique em casa
a tratar do doente. Em muitos casos, valem os vizinhos que cuidam
do doente quando a família sai para trabalhar. Muitas famílias
optam mesmo por deixar pacientes terminais em lares, mas a maior
parte destas instituições não têm estrutura ou pessoal
especializado para prestar cuidados paliativos. Isabel Neto
indica-nos algumas medidas que pode tomar para solicitar
assistência médica e social.

Informe-se junto do centro de saúde ou hospital da sua área
de residência.
Tente saber se estão organizadas equipas de
cuidados continuados , nos quais se integram os cuidados
paliativos. Actualmente, são sete as unidades criadas em Portugal.
A equipa de Cuidados Continuados do Centro de Saúde de Odivelas é a
única a funcionar 365 dias por ano, 24 horas por dia.

. Serviço de Medicina Paliativa do IPO do Porto

. Serviço de Medicina Paliativa do Hospital do Fundão

. Equipa de Cuidados Continuados do Centro de Saúde de
Odivelas

. Serviço de Medicina Interna e Cuidados Paliativos do IPO de
Coimbra

. Santa Casa da Misericórdia da Amadora

. Santa Casa da Misericórdia de Azeitão

. Equipa de Suporte do Hospital de S. João, Porto

O Centro de Saúde deve ter informação sobre as IPSS
(Instituições Particulares de Solidariedade Social) a actuar na
zona e que podem prestar apoio social.

Contacte uma associação (como a de doença de
Alzheimer) relacionada com a doença de que padece o seu familiar.
Algumas dispõem de serviços de voluntariado ao domicílio.

O luto é um processo natural

Quando o familiar e o doente têm a sorte de serem acompanhados
por uma equipa de cuidados paliativos, os técnicos começam a
trabalhar no apoio ao luto muito antes da morte, alerta a
enfermeira Fátima Ferreira. ‘Depois, fazemos visitas no primeiro,
terceiro, sexto e 12.º mês após o óbito, porque o doente faleceu
mas a família mantém-se.’

Dê tempo ao tempo. O luto é um período fisiológico
normal que dura cerca de um ano. ‘As pessoas não podem esperar
funcionar como se nada tivesse acontecido três meses depois da
morte de um ente querido de quem cuidaram’, adverte Isabel Neto. ‘O
enfermeiro tem competências para dar apoio emocional. Mas quando se
depara com situações onde esse apoio é insuficiente, direcciona o
familiar para o psicólogo da equipa’, explica Fátima Ferreira.

Lide com sentimentos de culpa. Não é raro nem
sinal de insensibilidade sentir um estranho alívio no momento da
morte da pessoa de quem cuidaram durante anos. ‘Tudo o que fizeram
tem um valor imenso e é normal sentirem–se cansados e desejarem
que a situação acabe. Isso não as torna más’, diz Isabel Neto. ‘São
verdadeiros heróis.’

Saiba mais!

Seleccionámos a melhor bibliografia e DVD’s que ensinam como
prestar cuidados paliativos e a lidar com sentimentos.

‘Ajudar a Cuidar’ . Dois DVD’s editados pela
Advita, narrados pela jornalista Cláudia Borges, divididos em dois
volumes: ‘Sentimentos do Prestador de Cuidados’ e ‘Apoio nas
Actividades Diárias’. €7 cada, em
www.advita.pt.

‘Como Cuidar dos Nossos’ . Manual prático editado
pela Amara, que ensina a prestar cuidados, controlar sintomas,
prever complicações e a lidar com sentimentos de luto. €8, em
www.amara-project.org/pt/publicacoes.htm.

‘Manual do Cuidador’ . Não é um manual exclusivo
de cuidados paliativos, mas foi feito para esclarecer dúvidas a
quem cuida de doentes de doença de Alzheimer. Na sede ou delegações
da Associação de Familiares e Amigos dos Doentes de Alzheimer, €5
para associados e €10 para não associados.

‘Amar e Viver’ . Antes de morrer, Morrie Schwartz
deixou esta obra com as suas reflexões lúcidas e positivas sobre a
morte e, sobretudo, sobre a vida, que se dirige directamente a quem
passa pelo mesmo. Da Pergaminho, por €9,90, em livrarias.

Contactos úteis

.Associação para o Desenvolvimento de Novas Iniciativas
para a Vida
(Advita): www.advita.pt; tel.: 21 316 32 75.

.Associação Nacional de Cuidados Paliativos
(ANCP): www.ancp.pt; tel.: 22 509 73 00.

Associação pela Dignidade na Vida e na Morte
(Amara): tel.: 91 616 29 11.

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