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Todor Tsvetkov

*artigo publicado originalmente em janeiro de 2016

Sentimo-nos esquisitos quando tentamos fazer amigos em adultos. Sentimo-nos solitários, desesperados, carentes. Por isso, quando fazemos um pequeno esforço e a outra pessoa não corresponde, tornamos a enfiar a cabeça na areia.”
A jornalista americana Marla Paul escrevia uma coluna para o jornal ‘Chicago Tribune’ quando se apercebeu de que imensas mulheres estavam preocupadas com o desaparecimento de amigos ao longo do tempo, e que consideravam essa ‘diminuição’ uma falha pessoal e grave nas suas vidas.
Marla resolveu refletir sobre o assunto: afinal, como é que fazemos e mantemos amizades quando já não temos 15 anos? E por que é que, se sentimos tanto a falta dos amigos, os relegamos para um lugar tão miserável na hierarquia das nossas prioridades?
Daí resultou o livro ‘The Friendship Crisis’ (a crise da amizade) e algumas conclusões como: ter muitos amigos próximos é uma fantasia e não corresponde à realidade de muita gente. As mulheres precisam muito de amigos mas curiosamente não se esforçam por mantê-los. Ter um bebé é fatal para muitas amizades. E quando avançamos em idade e precisamos mais de amigos é precisamente quando achamos que já não temos ‘paciência’ para fazer amigos novos.
Boas notícias: tudo isso tem solução, e os amigos estão mesmo mais próximos do que julgamos.

As amizades estão muito dependentes das etapas da nossa vida. À medida que crescemos, tornamo-nos ao mesmo tempo mais exigentes e mais ocupados. Mudamos de casa e de família, o tempo não dá para tudo e é mais fácil adiar um café com uma amiga do que faltar à festa de natal do filho.
Mesmo antes dos filhos, o casamento é a primeira ‘fasquia’ da amizade: “Eu e o meu marido fomos os primeiros a namorar a sério”, conta Mariana B. “Por isso as saídas eram 80% a dois e os amigos acusavam-nos de ser ‘cortes’ porque estávamos sempre em par. Claro que às vezes fazíamos as noitadas de ‘mulheres’ ou ‘homens’, e cada um ia por si com os respetivos amigos. A maioria adorava, principalmente os que não tinham par e deixavam de se sentir ‘velas’ dos outros.”
Mesmo assim, começou a sentir que algumas amigas se afastavam por falta de par. O que é normal: quem gosta de se sentir pau de cabeleira? Mas Mariana sempre fez um esforço para as manter: “Combinava saídas com elas, ao cinema, um almoço, o que fosse. O mesmo fazia o João, um copo com os amigos solteiros. Acho que tacitamente escolhemos fazer ao outro o que gostávamos que nos fizessem a nós. Inclusive comentávamos que os amigos que não tinham um equilíbrio de ‘saídas a dois’ com saídas a ‘sós’ era porque algo não estava a funcionar.”

Balões de ‘oxigénio’

Para Mariana, o hábito de sair só com as amigas manteve-se em casada. “´Soa parvo, mas acho que qualquer mulher com amigas me percebe. Parecíamos as tabernas de aldeia, homens lá dentro, mulheres cá fora (risos). As amigas funcionavam como um balão de oxigénio das nossas relações: tão bom cortar na casaca do nosso mais que tudo! A quem nos iríamos queixar do raio do hábito de deixar a toalha molhada em cima da cama? À mãezinha dele?”
Às vezes também se encontra só com uma amiga, sozinhas as duas. “Sempre que gosto imenso de alguém insisto nisso, nem que sejam duas vezes ao ano: no aniversário dessa amizade e no natal.” E ciumeiras do marido, não havia? “Dentro dos níveis normais”, ri-se. “Mas nunca lhe disse, nem ele a mim, ‘não falas/sais com fulano ou sicrana, não gosto dele/dela’. Sempre respeitámos os amigos um do outro.”

Olá bebé, adeus amigas?

A fase clássica de afastamento de duas amigas aparece com o nascimento dos filhos. “Ter um bebé é muito ‘isolante’ porque se está demasiado preocupado a perceber como aquela criatura funciona e ninguém está a pensar em ter vida social”, nota Marla Paul. “Mas é importante não se desligar totalmente das suas amigas, porque vai precisar delas para manter a sanidade mental.”
A amiga sem filhos tem de ser mais flexível e perceber que, durante um certo tempo, tem de ser ela a dar mais do que recebe”, comenta Marla Paul. “Mas a recém-mãe também tem de perceber que, embora o bebé seja o centro da vida dela, nem toda a gente está interessada numa pessoa que de repente não fala noutra coisa.”
“Quando tivemos filhos, tivemos também a nossa primeira ‘baixa’ de amigos”, confirma Mariana. “Os amigos que estavam a tentar ter filhos e não conseguiam foram-se afastando. Nós compreendemos. Se fosse ao contrário, talvez tivéssemos feito o mesmo. Ainda os convidámos para algumas coisas em ‘grupo’, mas nunca vinham.” Mariana não desanimou e fez novas amizades. “Por causa do meu filho mais novo comecei um tipo de amizade com um grupo de mães da mesma sala de infantário, que ainda se mantém.”
Assume que é corajosa: já se atirou de cabeça, já se ‘declarou’ a pessoas que admirava no Facebook (e ficou amiga delas), e afirma que se esforça por respeitar o ritmo dos outros.
Mas esta não é a única ‘fase’ complicada: “Aos 40 e 50 muitas mulheres se divorciam e ainda acontece muitas vezes que são socialmente excluídas”, nota Marla Paul. Quando se é amigo dos dois, é complicado ‘equilibrar’ zangas e não ‘escolher equipas’. Como mantemos os dois amigos? E qual dos dois ‘herdamos em partilhas’?
“Para a mulher casada, é um desafio manter as amigas divorciadas. Para a divorciada, é um desafio fazer com que as amigas casadas se sintam tão confortáveis com ela como dantes.” E é importante, nestas ocasiões em que precisa mais das suas amigas, não se afastar delas. “Hoje em dia, já não caimos na asneira de perder uma amizade”, nota Mariana. “Com amigos divorciados, respeitamos que haja convívios num todo ou por partes.”

‘Amigar’ é ‘ser amigo’?

E como é que se mantém as amizades cara a cara num mundo em que até a amizade é cada vez mais virtual? E será a mesma coisa ‘amigar’ alguém no Facebook e ser amigo na ‘vida real’?
“A comunicação presencial parece uma coisa estranha porque é cada vez mais rara”, explica a psicóloga Cláudia Morais, no livro ‘O Amor e o Facebook’. “As pessoas que evitam abordar os assuntos cara a cara acabam por sentir que esta forma de diálogo pode até ser ameaçadora. A verdade é que se habituaram ao conforto do teclado, à possibilidade de acabar uma conversa abruptamente em qualquer momento. No consultório, apercebo-me da dificuldade que muitos adultos mostram em iniciar uma conversa cara a cara. É como se tivéssemos regredido em competências sociais básicas. As pessoas acabam por sentir-se genericamente mais tristes porque se veem arredadas do que a comunicação olhos nos olhos acarreta, a conexão emocional.”
Enfim, será mais agradável estar em casa a falar com alguém, mesmo que seja via ecrã, do que estar sozinha a olhar para a televisão. E a verdade é que o Facebook já foi o motor para juntar pessoas que de outra maneira nunca se teriam conhecido, e para alargar o nosso leque de amizades. Mas é importante dar o passo seguinte dos ‘olhos nos olhos’.
De qualquer maneira, se está longe dos seus amigos e este olhos nos olhos não é fácil, então manter o contacto à distância é melhor do que nada. “Uma amiga que vive longe não fica menos amiga por causa da distância”, nota Marla. “Mas ajuda se conseguirem estar juntas quando puderem.”
As pessoas continuam a dizer que é importantíssimo ter amigos, mas muitas vezes isso não passa de boas intenções. “Todas as pessoas dizem que é importante estar com os amigos, mas também dizem que nunca têm tempo para isso”, afirma William Rawlings, professor de Comunicação Interpessoal na Universidade de Ohio, no jornal ‘The Atlantic’ (www.theatlantic.com) “Mesmo pessoas que vivem perto umas das outras dizem que ‘têm de combinar’ qualquer coisa com os amigos, mas na realidade raramente o fazem.”

Os três tipos de amizade

Então vamos lá a ver, como é que ‘sustento’ uma amizade? Mantê-la apenas a respirar não dá assim tanto trabalho. Pôr um ‘like’ no Facebook ou mandar parabéns são exemplos disto. “Mas quando se passa ao nível acima da mera sobrevivência, a amizade começa a quebrar,” nota Emily Langan professora de comunicação no Wheaton College.
“Porque para nós, uma amizade significa muito mais do que uma presença online. As redes sociais tornaram possível manter muitas das nossas amizades literalmente ‘ligadas à máquina’, mas talvez mantenha algumas amizades que já deviam ter morrido.” Por que raio somos ‘amigas’ da Olívia Maria, que não vemos desde os 9 anos e com quem deixámos de ter o que quer que seja em comum? Segundo Langan, durante a vida acumulamos três tipos de amizades: activas (com quem estamos regularmente), adormecidas (não nos vemos há algum tempo mas ainda pensamos nelas como amigas) e comemorativas (foram importantes a uma dada altura, mas já não nos damos). O Facebook baralha este esquema, mantendo todos os amigos ao mesmo nível. E para subir de ‘nível’ temos mesmo de fazer um esforço.
De qualquer maneira, nem tudo é mau: no mundo dos adultos também nos tornámos mais flexíveis. Também aprendemos a perceber que cada um tem a sua vida, a perceber que aquela pessoa se calhar não pode estar connosco tanto quanto queríamos (e vice-versa) mas que continuamos a pensar nela com carinho. Fazemos escolhas: fora do Facebook não podemos mesmo ter 5 mil amigos.
E reaprendemos, também, a fazer amigos novos. “A chave para se ligar a outras pessoas é sair de si e interessar-se pelos outros”, aconselha o site www.helpguide.org. Problema: este interesse não pode ser fingido. “Se aquela pessoa não lhe interessa nada, não se culpe. Até porque ela vai perceber que não lhe interessa nada. Se isso lhe acontecer, não force a amizade.”
Portanto, faça amigos novos e tente manter (alguns) os velhos. Fazer um telefonema quando tem menos trabalho. Combinar um almoço. Combinar um pequeno almoço. Juntar as crianças. Mas se isto não acontecer tanto como queria, não se culpabilize demais. Ser adulto também é ter noção das nossas limitações. E perceber que, se calhar, não somos os amigos ideais. Mas somos os amigos possíveis.

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